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Cat Power: “O poder das mulheres foi constantemente tirado de nós”

Confira a entrevista com a cantora americana, que se apresenta em São Paulo no C6 Fest, em maio, com show em homenagem a Bob Dylan

Por Tomás Novaes
Atualizado em 22 abr 2024, 13h04 - Publicado em 18 abr 2024, 19h08
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Chan Marshall, ou Cat Power: show no Brasil em tributo a Bob Dylan (Inez & Vinoodh/Divulgação)
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O C6 Fest acontece em São Paulo nos dias 17, 18 e 19 de maio, e a Vejinha conversou com uma das estrelas da programação: a cantora americana Cat Power.

A artista, nome artístico de Chan Marshall, retorna ao Brasil com um show especial em homenagem a Bob Dylan. Neste seu projeto mais recente, lançado em disco em 2023, ela apresenta o repertório integral do marcante Royal Albert Hall 1966 Concert, do compositor americano.

O show original — que, apesar do nome pelo qual ficou conhecido, aconteceu em Manchester e não na casa de shows londrina — se tornou icônico pois sua primeira metade é acústica, com o ídolo folk acompanhado somente de seu violão e sua gaita, e a segunda metade é elétrica, com a entrada da banda.

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A capa do disco ‘Cat Power Sings Dylan: The 1966 Royal Albert Hall Concert’ (2023): gravado ao vivo em Londres, em 2022 (Reprodução/Reprodução)

A troca do violão pela guitarra levou alguém na plateia a chamar Dylan de ‘Judas’ durante o show, momento que ficou eternizado na sua carreira.

A última vez que Chan esteve no Brasil foi em 2022, no Popload Festival. Sua apresentação no C6 acontece no domingo (19/5) de evento, no Parque Ibirapuera, e os ingressos já estão disponíveis.

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Como a música de Bob Dylan influenciou sua maneira de escrever e cantar?

Ele criou o meu trabalho, e me apresentou à música. E me mostrou, quando eu era jovem, que podia ficar sozinha com um violão. Era só ele, um violão e uma gaita. E me ensinou que o que mais importava era o que ele dizia, a sua escrita. Essas coisas foram o que mais me inspiraram, como artista.

Você teve um encontro com Dylan no ano passado, e assistiu a um show dele. Vocês conversaram sobre sua homenagem?

De jeito nenhum! (risos).

Mas foi uma noite especial?

Foi. Eu tive experiências místicas em todas as vezes que o vi na minha vida, e essa noite não foi diferente. Havia algo transformador acontecendo. Não sei se ele estava conjurando, se estava ciente disso, ou se estava sendo transmitido por ele. Mas, dessa vez, houve várias vezes que eu fiquei curiosa se não era gravado, porque eu conseguia entender muito claramente, elegantemente e intencionalmente cada palavra. Talvez seja por causa  desses tempos loucos de hoje, alguma energia cheia de força estava passando por ele. Eu nunca o vi assim antes. E a afinação perfeita, tudo. Parecia uma espécie de cerimônia. Eu já o vi tantas vezes, mas isso foi super comovente.

Versões são uma parte importante da sua discografia, e acho que, assim como Bob Dylan, você tem uma rara habilidade de colocar sua assinatura nessas músicas escritas por outras pessoas. Como você aborda um cover para criar uma versão original?

Normalmente, não sou um grande fã de covers. Eu já disse isso antes, o problema comigo é que não sou uma instrumentista. Quando toco piano ou no violão, nunca sei dizer que p*rra de acorde estou tocando. Então, sempre que eu quis cantar ou tocar um cover, foi por um motivo apenas: eu queria ouvir aquela música. Talvez eu não tivesse um toca-discos ou esses serviços de streaming naquele momento, e eu só queria cantar uma música que eu amo.

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Quando você está no palco, cantando o Royal Albert Hall Concert, você sente no coração que aquelas músicas foram escritas por você?

Há uma transferência de propriedade pessoal quando você faz algo com a sua alma. Quando ouvi o cover de Nina Simone de Wild is the Wind, de David Bowie, fiquei sem palavras. Fui transformada para sempre. E quando ouço Billie Holiday cantar uma música de (George) Gershwin, fico eternamente comovida. É como quando você vê um filme do Tarantino, e há certos ângulos, cores, estilos de atuação, algo que homenageia outros filmes. Muitas pessoas o odeiam por isso, mas eu amo! E a música sempre foi passada de geração em geração. As pessoas ainda tocam Chopin e Beethoven. A ideia de que uma mesma música pode ser traduzida por um artista diferente sempre alimentará e gerará novos artistas. E essa é a beleza da arte, estar sempre crescendo e alimentando a humanidade como uma grande tradutora.

“A ideia de que uma mesma música pode ser traduzida por um artista diferente sempre alimentará e gerará novos artistas”

Quero saber a sua visão sobre as letras de Dylan sobre as mulheres, em duas músicas em particular. Just Like a Woman, que está no repertório do show, e To Ramona, que sei que tem uma importância na sua vida. Como você se sente em relação a essas canções?

Eu adoro cantar Just Like a Woman, como uma mulher que tem sido consistentemente levada a contornar obstáculos colocados à minha frente, projetados em mim, a cada passo do meu caminho. Cantando essa música eu posso me apropriar dela da maneira que eu quiser. A vida toda nos disseram que somos o sexo mais fraco. Então eu gosto de cantar ‘You break just like a litte girl (Você chora igual a uma garotinha)’, porque é uma projeção sobre uma narrativa feminina. Nós somos duronas, pacientes, compassivas e curativas. O poder das mulheres foi constantemente tirado de nós, repetidas vezes. Então gosto de cantar isso e me sentir um pouco indecente.

E sobre To Ramona?

Essa música entrou na minha vida quando eu realmente precisava. Foi como se me oferecessem um lugar para a minha adolescente interior derramar suas lágrimas e ouvir que as dores que te causam tristeza vão passar. Nunca ouvi outra música na minha vida que me fizesse sentir tão segura, suave e protegida. É a canção mais honrosa que ele já escreveu, na minha opinião. Ele está atribuindo força a uma mulher, e é disso que sempre precisamos, de homens que nos apoiassem, que não nos dissessem que somos loucas, que tivessem paciência, que nos ouvissem, que não nos contradizessem. É uma música elegantemente protetora com as mulheres, é linda.

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Você tem algum artista ou banda brasileira favorita?

Caetano Veloso, que provavelmente é a escolha óbvia. E amo a Gal (Costa).

No dia do seu show no festival, também terá nomes como Noah Cyrus, Pavement, Daniel Caesar, David Morales, Paris Texas, Squid e Young Fathers. Você gostaria de assistir a algum desses shows?

Eu adoraria ver meus amigos do Pavement. A primeira e última vez que os vi foi em 1996, no Lollapalooza. Vai ser muito divertido. Gostaria de ver Daniel Caesar e estou curiosa sobre a Noah Cyrus. Estou animada. Já faz muito tempo que não toco em um festival, e eu não tinha certeza se conseguiria fazer essa turnê, por isso lancei o disco. O show no Royal Albert Hall era para ser o último do disco Covers (2022), como uma homenagem. Mas as pessoas no Instagram começaram a pedir para tocar em Taiwan, Argentina, Canadá, Tel Aviv… Fiquei muito grata.

Parque Ibirapuera. Avenida Pedro Álvares Cabral, s/nº, ☎ 5574-5045. Sex (17), sáb. (18) e dom. (19). R$ 560,00 a R$ 1 440,00. c6fest.com.br.

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O line-up do C6 Fest, por dia: festival acontece nos dias 17, 18 e 19 de maio (Instagram/Reprodução)
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