Munidos de panelas e colheres de pau, chefs que defendem as bandeiras da Itália e da França têm um hobby em comum: provocar uns aos outros. Amigos de longa data, Hamilton Mellão e Yann Corderon não fogem à regra. Quando se encontram ao redor de uma mesa, logo começam a discutir qual país tem a melhor culinária. Por exemplo, onde se pode provar carne crua preparada de maneira mais apetitosa? Filho de uma italiana da região de Abruzzo, Mellão argumenta a favor do carpaccio, feito de lâminas de filé-mignon condimentado com uma mistura picante de maionese, mostarda e molho inglês. Nascido na Normandia e criado no Vale do Loire, Corderon sai em defesa do steak tartar, o bife picadinho e repleto de temperos. De diálogos como esse nasceu o livro ‘Bistrô & Trattoria — Cozinhas da Alma’ (Editora Melhoramentos, 200 páginas, 89 reais), cujo lançamento está marcado para segunda (8).
Ao lado da jornalista Nilu Lebert, mulher de Mellão, a dupla dedicou-se a pesquisar a história de sugestões típicas de bistrôs e trattorias. O projeto teve início há apenas seis meses, numa viagem a uma chácara em São Roque, a 65 quilômetros da capital, onde fica a biblioteca de Mellão. “Voltamos trazendo mais de 120 livros nas malas e muitas ideias na cabeça”, conta Nilu. O passo seguinte foi decidir quais receitas recheariam os capítulos. “Queríamos quebrar algumas lendas da gastronomia”, diz Mellão, defensor da tese de que a pizza existe desde o antigo Egito e não teria surgido em Nápoles, a origem mais difundida. No total, foram selecionados setenta pratos similares nos dois países.
Na seção de aperitivos, aparecem as pedidas francesas ratatouille, tartine de queijo de cabra com tomate-cereja e croque monsieur ao lado das italianas caponata, crostini de feijão-branco ao alecrim e pandorato. Além do modo de preparo das sugestões, são apresentadas curiosidades acerca da procedência dos ingredientes. Entre as entradas, há a salada niçoise, de atum em lata e anchova, e a insalata ditonna alla sarda, de atum fresco. Polentas, massas, frutos do mar, aves, miúdos, carnes e sobremesas também têm vez.
Em São Paulo, uma parcela significativa dos restaurantes se divide entre franceses e italianos. Dos 570 listados pela edição ‘Comer & Beber’ de VEJA SÃO PAULO, mais de 180 se dedicam a essas especialidades, incluídas as pizzarias. Os chefs enaltecem o espírito cosmopolita da cidade, mas fazem restrições ao uso das palavras ‘bistrô’ e ‘trattoria’. “Por aqui, adotam o termo francês como sinônimo de restaurante pequeno”, afirma Corderon. “Na verdade, trata-se de um endereço familiar de atendimento informal e caloroso.” Da mesma forma, Mellão aponta um equívoco de vocabulário. “Em São Paulo, confunde-se trattoria com cantina. Esse é um estilo de estabelecimento de receitas regionais e ambiente simples na Itália, enquanto cantina define casas ítalo-paulistanas, que servem muitos pratos inventados aqui mesmo”, diz ele.
UM CLÁSSICO EM DUAS VERSÕES
A caponata alla siciliana
Ingredientes:
• 4 berinjelas médias
• 2 cebolas médias
• ½ xícara (chá) de azeite
• 4 tomates sem semente cortados em tiras
• 2 talos de salsão cortados em cubos
• 15 alcaparras lavadas
• 1 colher (sopa) de pinhole
• 1 colher (sopa) de uva-passa branca
• 10 azeitonas pretas sem caroço
• 2 xícaras (chá) de óleo de milho
• ½ xícara (chá) de vinagre de vinho tinto
• 1 colher (sopa) de açúcar
• Sal e pimenta-do-reino
Modo de preparar:
Lave as berinjelas e corte-as em cubos. Deixe sobre uma peneira por 30 minutos para
escorrer. Corte as cebolas em meia-lua e refogue no azeite em fogo baixo. Quando a cebola estiver dourada, acrescente o tomate, o salsão, a alcaparra, o pinhole, a uva-passa e a azeitona. Mexa bem e, quando o tomate estiver cozido, tire a panela do fogo. Reserve. Enxugue os cubos de berinjela e frite-os aos poucos no óleo de milho quente. Quando dourarem, coloque-os sobre papel absorvente para retirar a gordura. Incorpore-os à preparação reservada, adicione o vinagre e o açúcar e deixe cozinhar em fogo bem baixo por 10 minutos ou até que o vinagre evapore. Tempere com sal e pimenta-do-reino. Sirva frio, como antepasto, ou quente, como guarnição.
A ratatouille francesa
Ingredientes:
• 1 pimentão vermelho
• 1 pimentão amarelo
• 3 berinjelas pequenas
• 2 abobrinhas italianas
• 4 tomates maduros e firmes
• 1 cebola média
• 3 dentes de alho
• 3 colheres (sopa) de azeite
• 5 ramos de tomilho (usar só as folhas)
• 1 colher (café) de ervas de Provence
• 150 g de azeitonas pretas e verdes
• 1 maço pequeno de salsa picada
• Sal e pimenta-do-reino
• 1 cabeça de alho cortada ao meio e assada
Modo de preparar:
Corte todos os pimentões, a berinjela, a abobrinha italiana e o tomate em bastões. Corte a cebola em meia-lua e amasse os dentes de alho com casca. Refogue a cebola e o alho no azeite e acrescente aos poucos os legumes, respeitando o tempo de cozimento de cada um: primeiro os pimentões, depois a berinjela, a abobrinha e o tomate. Acrescente o tomilho, as ervas, as azeitonas e a salsa picada. Tempere com sal e pimenta-do-reino e sirva decorado com o alho assado.