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“Minha felicidade está conectada com a felicidade da próxima geração”

O filósofo Roman Krznaric fala sobre o sentido da vida a longo prazo

Por Roman Krznaric
30 out 2020, 06h00
 (Boonchai WedmaKawand/Getty Images)
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PARADOXO TEMPORAL – há uma grande crise a ser enfrentada aqui e agora, a covid-19. No meio de uma ameaça tão imediata, justamente por causa da crise, há pessoas que estão tentando pensar de um jeito transformador, a longo prazo. Há rebeldes do tempo que podem nos ensinar a sair da tirania do agora.

SIGNIFICADO REPENSADO – o que dá sentido a um ser humano? Penso que as nossas necessidades formam um triângulo. Precisamos de comida e segurança básica, mas também precisamos de relacionamentos e de liberdade. Quando se trata de relacionamentos, podemos pensar nas pessoas do nosso convívio, mas muitas culturas pensam também sobre relacionamentos através do tempo. Como tomar decisões pensando daqui sete gerações, em pessoas que talvez a gente nunca venha a conhecer?

NETOS DOS NOSSOS FILHOS – sei que essa ideia parece muito diferente da nossa cultura ultraindividualista e capitalista, mas muitos de nós conhecemos pelo menos cinco gerações. Conhecemos nossos avós e, se tivermos filhos, poderemos conhecer nossos netos. Isso começa a nos conectar. Nos faz pensar que a minha felicidade também está conectada com a próxima geração e a geração seguinte.

IMAGINAÇÃO A FAVOR – eu me importo com a minha filha, por exemplo. Eu posso imaginar (isso é uma coisa na qual os humanos são ótimos, melhor do que qualquer outra espécie) como será quando ela tiver 90 anos. Posso imaginar sua festa de aniversário e olhar para o mundo fora da janela: o que está acontecendo? Dependendo de quem eu sou, talvez seja um mundo em chamas, talvez seja um mundo lindo, uma utopia renovável. Isso dá sentido à minha vida, porque, se eu me importo com ela agora, eu preciso me importar com ela no futuro.

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REBELDIA INTENCIONAL – como nós colocamos isso em prática? Eis a grande questão. Mas eu tenho esperanças. Temos muitas pessoas pensando no futuro a longo prazo. Eles ainda estão espalhados, na arte, na ciência, algumas vozes na política… Nessa rebelião do tempo, fala-se em design do futuro. estive num ted talks e o Papa estava falando de solidariedade e justiça intergeracional. O Papa! Isso é muito novo.

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LEGADO FUNDAMENTAL – O fato de que todos nós morremos nos faz pensar em como vamos ser lembrados. Precisamos mudar uma visão estreita e egoica, de querer ser lembrado por um monumento que receba o nosso nome, para algo mais universal. A ideia de legado é fundamental para os seres humanos. Outra forma de pensar nisso é se questionar: estou sendo um bom ancestral?

ESCOLHAS COTIDIANAS – tudo começa com a narrativa que nós contamos sobre nós mesmos. No fim do dia, posso pensar: como vou ser lembrado? Quando compro um avocado que vem de avião do Peru e eu moro na Inglaterra, considerando toda a emissão de carbono, eu estou sendo um bom ancestral? Qual benefício a minha empresa vai deixar para o mundo quando eu não estiver mais aqui? Essas novas perguntas ajudam a redefinir o que é normal.

PODER DA LINGUAGEM – eu me lembro que há dez anos eu estava falando muito de empatia, mas ninguém estava realmente ouvindo ainda. Não era convidado para falar na TV ou no rádio, agora isso mudou. Empatia virou um conceito popular — claro, isso significa que ele pode ser manipulado ou esvaziado, mas ainda assim é bom de alguma forma. A linguagem é importante. Agora, estou tentando deixar um vocabulário para pensamento a longo prazo. Eu sou um bom ancestral? Eis uma forma pessoal de fazer reflexões de longo prazo em um mundo imediatista.

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Roman Krznaric
O filósofo Roman Krznaric (Kate Raworth/Veja SP)

O filósofo Roman Krznaric é cofundador da The School Of Life, autor de O Poder da Empatia e do inédito O Bom Ancestral, com previsão de lançamento aqui em 2021. Na quinta (5), conduz uma conversa na The School Of Life Brasil sobre como estimular o pensamento a longo prazo.

Publicado em VEJA SÃO PAULO de 4 de novembro de 2020, edição nº 2711. 

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