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Alberto Goldman: conheça mais sobre o novo governador do estado

Goldman acorda sem despertador às 5h30, joga basquete três vezes por semana, é apaixonado por piano, odeia o Twitter e deixa jujubas sobre a mesa do gabinete

Por Mariana Barros
Atualizado em 5 dez 2016, 10h19 - Publicado em 1 abr 2010, 11h01

As composições clássicas ao piano dão o tom da personalidade do homem que as toca. Sentado em frente ao instrumento, posicionado no canto da sala de seu apartamento de 320 metros quadrados em Higienópolis, Alberto Goldman, 72 anos, oferece à pequena plateia três opções de degustação de um erudito cardápio. Pergunta se alguém quer ouvir Liszt, referindo-se ao húngaro Franz Liszt (1811-1886), virtuose e compositor cujo nome estampa ao menos duas brochuras de partituras acumuladas ao lado do piano. Sem dar tempo para a resposta, lança então ao diminuto público algo mais “popular”: Frédéric Chopin (1810-1849), com quem compartilha a origem polonesa. Em seguida, sugere o alemão Ludwig van Beethoven (1770-1827), autor das nove sinfonias mais famosas da história da música. Mas acaba é tocando, sem ajuda da partitura, o Prelúdio Nº 1, de Johann Sebastian Bach (1685-1750).

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Goldman, de fato, preza as tradições. Mas é do tipo que sabe conciliá-las com o desenrolar dos acontecimentos. Em quarenta anos de vida pública, foi da clandestinidade da militância comunista, durante o regime militar, ao posto de principal dirigente do mais importante estado da federação. Ele passa a ocupar a cadeira à qual José Serra teve de renunciar para poder lançar-se candidato à Presidência pelo PSDB nas eleições de outubro. Pelos próximos nove meses, o novo governador terá de se empenhar na execução de seu número-solo para fazer cumprir o que o partido orquestrou dentro do cenário da política nacional.

A tarefa inclui a continuidade do programa já em curso e o trabalho nos bastidores em prol das candidaturas de Serra à Presidência e de Geraldo Alckmin ao Palácio dos Bandeirantes, apesar de repetir aos quatro ventos que “quem já foi governador não deveria voltar”. A missão não é a primeira do gênero na trajetória de Goldman. Bom articulador, ele sempre atuou nas coxias dos partidos pelos quais passou e das gestões que integrou para garantir que o espetáculo corresse bem aos olhos do público. O primeiro deles deu-se ainda na década de 50, quando cursava engenharia na Escola Politécnica da USP. Sua participação em debates e congressos estudantis fez com que em pouco tempo se tornasse uma forte liderança entre os universitários. Conforme ganhava estatura, definia também sua inclinação política, esquerdista, como seus pais e boa parte dos estudantes politizados da época. Não demorou para que militasse no Partido Comunista Brasileiro (PCB). Paralelamente, dedicava-se a seu escritório de engenharia, de onde tirava o sustento de sua família — a primeira mulher, Sara, e os filhos Cláudio, Marcelo e André. Foi o jornalista Moacir Longo o responsável por seu ingresso no mundo político. Durante o regime militar, entrou para o MDB e ganhou sua primeira eleição para deputado estadual. “Não tínhamos nomes para lançar à Assembleia, e disse que teria de ser ele”, lembra Longo. “Goldman respondeu que eu estava louco.” Dias depois, porém, comunicava sua decisão de tentar se eleger para o primeiro dos oito mandatos legislativos que exerceria.

Por causa de sua carreira política, morou quase vinte anos em Brasília, para onde não pretende voltar. Chegou à capital federal dias depois de sua segunda mulher, Deuzeni, com quem é casado há trinta anos, ter dado à luz a primogênita do casal, Paula. Anos depois, tiveram o caçula, Flávio. O então deputado passava apenas os fins de semana em São Paulo, numa rotina que o impedia de participar do crescimento dos filhos. “Quando entrou para a política, nossa vida virou de cabeça para baixo”, diz Cláudio, músico de 48 anos. “Ele estava sempre tenso, mesmo em casa.” Deuzeni, que como primeira-dama vai assumir a presidência do Fundo Social de Solidariedade, sempre foi tão ativa quanto o marido. Após cursar alguns anos de psicologia e comunicação, fez direito na PUC. Atuou como advogada e posteriormente como decoradora. Cada canto do apartamento onde vivem — o mesmo desde que se casaram — foi planejado por ela. O xodó é o lustre da sala de almoço, de copos-deleite de Murano.

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Goldman voltou a morar na cidade em 2007, já como vice de José Serra. A rotina familiar teve novamente de ser adaptada. A faxineira, por exemplo, aprendeu a se desdobrar para dar conta da limpeza sem atrapalhá-lo ao piano ou ao computador. Atualmente, ele faz questão de almoçar em casa todos os dias. Chega ao Palácio dos Bandeirantes, por volta das 15 horas, vestindo calça jeans e camisa, mas tem sempre terno e gravata à mão caso precise usá-los. Seu dia começa quando ainda está escuro: acorda por volta das 5h30, sem despertador. Abre o correio eletrônico para verificar os e-mails enviados por Serra durante a madrugada — notívago, o agora ex-governador costuma despachar até as 4 ou 5 horas da manhã. “É a administração 24 horas. Quando Serra vai dormir, estou acordando”, afirma Goldman. Três vezes por semana, ele joga basquete. Dirige-se à quadra subindo os degraus da academia de dois em dois. Com a bola em punho, lança mão de sua especialidade: o arremesso de fora da linha de 6 metros. “Se você quer envelhecer jogando, faça cesta de 3 pontos. Você evita o contato físico e corre menos”, aconselha o colega de time Carlos Ney, 84 anos, que ele considera seu mestre.

Goldman não quer se mudar para a residência oficial, no palácio. A decisão deixou a Casa Militar de cabelo em pé, e os oficiais, responsáveis pela segurança do governo, têm quebrado a cabeça para montar um esquema que funcione além das grades do Bandeirantes.

“Ele sempre foi turrão. Mas a idade o tornou mais maleável”, conta o amigo de infância e colega no Colégio Bandeirantes Mario Luiz Frochtengarten. Os pais de ambos emigraram juntos da Polônia para o Brasil e criaram os meninos no bairro do Bom Retiro. A casa de Goldman ficava na Rua da Graça, onde hoje funciona o Bistrô da Sara, tradicional restaurante da região. Apesar das raízes judaicas, Goldman não segue a religião, assim como seus filhos. A exceção é Marcelo, que recentemente se voltou ao judaísmo. Regente, é um dos filhos que herdaram o apreço do pai pela música. O multi-instrumentista Flávio toca de cítara a saxofone. Paula é cineasta, e André, arquiteto, também gosta de violão. Cláudio, o mais velho, compõe canções populares e já encarnou covers de Gal Costa e Elton John.

Serra e Goldman se aproximaram quando o primeiro era ministro da Saúde do governo FHC e o segundo, deputado federal, estudioso da lei de patentes. Eles têm afinidades políticas e muitas diferenças de estilo. Enquanto o palmeirense Serra pode chegar até três horas depois do horário marcado para determinado compromisso, o corintiano Goldman dá bronca nos assessores que se atrasam mais de cinco minutos. Em relação ao tabaco, Serra foi o responsável por banir o cigarro do estado. Goldman, que já fumou cigarro e cachimbo, não dispensa um charuto. Amigos provocam-no dizendo que seu primeiro ato à frente do governo será revogar a restrição.

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Egresso do PMDB, sucessor do MDB, Goldman entrou para o tucanato no fim dos anos 90. Segundo ele, há uma ala no partido que nunca deixou de vê-lo como aliado de Orestes Quércia, de quem foi secretário no governo estadual. “Mas é bobagem”, afirma. “Ficamos afastados por doze anos e só nos aproximamos nos últimos três meses, para falar sobre a eleição.” Instantes depois da declaração, sua secretária entra na sala para comunicar que Quércia o aguardava para uma reunião, em companhia de Aloysio Nunes Ferreira, secretário da Casa Civil e também originário do PMDB. “O Goldman foi fundamental para costurar o entendimento entre nossos dois partidos em São Paulo”, diz Quércia.

Nos próximos nove meses, o novo governador tem a chance de se tornar mais conhecido do eleitorado. Com isso, pode se cacifar e ser eventualmente o candidato tucano à sucessão de Gilberto Kassab (DEM) na prefeitura paulistana, em 2012. Para isso, porém, é preciso que deixe de lado seu gosto pelos bastidores para solar para a plateia. “Em 1º de janeiro estarei livre para fazer o que eu acho que devo fazer”, desconversa.

DA POLI AO PALÁCIO

A trajetória de Alberto Goldman, que começou na política como militante estudantil e foi deputado, secretário estadual, ministro:

1956 – Ingressa na Escola Politécnica da USP. Durante a faculdade, faz seu primeiro contato com a política. Torna-se líder estudantil e alinha-se com o pensamento esquerdista.

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1969 – Após alguns anos de militância clandestina no Partido Comunista Brasileiro (PCB), filia-se ao Movimento Democrático Brasileiro (MDB), legenda de oposição ao regime militar.

1971 – Assume seu primeiro mandato como deputado estadual. Seria eleito mais uma vez deputado estadual e seis vezes deputado federal.

1975 – Após a morte do jornalista Vladimir Herzog nos porões do II Exército, participa de uma reunião com o então presidente, Ernesto Geisel. Alerta para o perigo da intensificação da violência e da iminência de um “golpe dentro do golpe”.

1987 – É chamado pelo governador Orestes Quércia para exercer o cargo de secretário estadual de Coordenação de Programas. No ano seguinte, comanda a Pasta da Administração.

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1992 – Por catorze meses, ocupa o Ministério dos Transportes do governo Itamar Franco.

1997 – Descontente com os rumos do PMDB — e com a negação de sua candidatura à prefeitura paulistana um ano antes —, filia-se ao PSDB. “Sempre mantivemos uma boa relação. Ele foi fundamental para a costura entre peemedebistas e tucanos”, diz Quércia.

2006 – É eleito vice-governador na chapa de José Serra.

2007 – Assume também a Secretaria de Desenvolvimento, na qual fica até janeiro de 2009.

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