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Artistas plásticos e ilustradores fazem tatuagens de ‘grife’

Filas podem chegar a três anos por desenhos de até 30 000 reais 

Por Ana Carolina Soares
Atualizado em 1 jun 2017, 15h57 - Publicado em 17 set 2016, 00h00
Victor Montaghini - tatuagem
Victor Montaghini - tatuagem (Leo Martins/)
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No sábado passado, 10, o advogado Thiago Precaro entrou em um estúdio de tatuagem da capital para eternizar a imagem de um abraço em seu ombro esquerdo. Seria uma cena banal e corriqueira, não fossem alguns “detalhes”. O primeiro: ele teve de encarar uma fila com mais de 7 000 pessoas e esperou quase três anos para ser atendido. O segundo: desembolsou 4 000 reais, cerca de cinco vezes mais do que a média do mercado, por um desenho de 30 centímetros. Além do elástico prazo de antecedência e da soma envolvida, os trâmites para agendar a sessão ocorreram sob uma sombra de mistério. Todo o contato com o profissional foi feito por e-mail e, até que o negócio fosse confirmado, o telefone e o endereço dele permaneceram em segredo.

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No dia marcado, os dois almoçaram juntos, conversaram por quatro horas sobre a ilustração e depois encararam mais quatro horas de trabalho para aplicá-la na pele. “Não é uma tatuagem. Tenho um quadro no meu braço”, explica Precaro sobre o longo processo. Depois do serviço, ele ainda foi orientado a não assinalar o local do encontro nas redes sociais.

Essa é a realidade da clientela do artista plástico Victor Montaghini, o tatuador paulistano mais concorrido do momento. Dono de um estilo contemporâneo, ele foge dos tradicionais dragões e estampa um traço único, que se tornou hit entre diretores de arte, publicitários e frequentadores de museus e galerias. Sua exclusividade fica evidente na agenda: Montaghini só recebe uma pessoa por dia. “Gosto de me dedicar 100% ao trabalho, sem nenhum tipo de interrupção”, diz.

Victor Montaghini - tatuagem
Victor Montaghini – tatuagem ()

O estúdio ocupa 180 metros quadrados do andar térreo de um prédio comercial de uma área nobre da Zona Sul (o especialista pede que o nome do bairro seja mantido em sigilo). Mesmo que alguém entre lá por acaso, provavelmente nem vai entender que ele se dedica à tatuagem. O lugar parece mais uma galeria de arte, com trinta telas de até 1,80 metro de altura distribuídas pelas paredes. Todas são de autoria do próprio dono do espaço e custam, em média, 30 000 reais (pelo trabalho na pele o artista chega a cobrar até 20 000 reais).

Aluno da Escola Panamericana de Artes em 2000, Montaghini começou como ilustrador freelancer. Naquela época, ganhou de amigos um kit de agulhas. Usou o irmão caçula como cobaia e desenhou no braço dele um palhaço, sua primeira experiência na área. No ano seguinte, recebeu um convite para trabalhar em um estúdio em Amposta, na Espanha. Em 2006, mudou-se para Buenos Aires, e deu expediente por quatro anos na American Tattoo, um dos pontos mais renomados da capital argentina, onde aprimorou sua técnica.

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Voltou para São Paulo em 2010 e chegou a atuar no badalado Tattoo You, no Itaim, antes de abrir o próprio negócio, em 2014. Hoje, até ministra palestras sobre empreendedorismo, por pelo menos 8 000 reais. “Acabou aquela noção de que artista é pobre e vagabundo”, diz.

Montaghini é o nome de destaque de um movimento recente no mercado da tatuagem na capital, formado por um pessoal ligado ao universo da arte, como pintores, designers, ilustradores e arquitetos, que se tornaram expoentes do ramo. Eles são poucos, no máximo vinte, mas considerados grifes.Todos cobram no mínimo 1 000 reais por uma sessão de uma hora e meia, mantêm longas filas de espera, de meses, produzem apenas ilustrações autorais — nada de estrelinhas, símbolos do infinito e ideogramas japoneses — e se dão o luxo de receber apenas um cliente por dia.

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É uma realidade bem diferente daquela dos mais de 5 000 estúdios da região metropolitana, onde cada profissional cobra cerca de 250 reais por um desenho simples (uma flor na nuca, por exemplo) e atende cinco pessoas em sequência. “Valem a pena o preço e a espera para carregar na pele uma obra só sua”, avalia o empresário Gerald Blake Lee, cofundador da empresa aérea Azul e CEO da Modern Logistics, que estampa um buda de Montaghini na perna direita.

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As celebridades rendem-se aos novos traços dos artistas. Um dos mais procurados pelos famosos é Marcelo Mordenti, com trinta anos de carreira e formação em desenho industrial pelo Mackenzie. Por seu estúdio de 400 metros quadrados, em Santos, já passaram o cantor Marcelo D2 e o ator Paulo Vilhena. Jornalistas internacionais especializados o apontam como um dos quinze melhores do mundo por causa de seus traços realistas, com profundidade (o “3D”, no jargão).

Mordenti cobra até 27 000 reais por trabalho, no mínimo 3 200 reais por tela e promove três workshops anuais sobre suas técnicas (turmas de vinte alunos que pagam 18 000 reais cada um). “Mas sou meio desencanado com dinheiro, não gosto de ostentar”, afirma. Em 2011, seu caçula (hoje com 10 anos) sofreu uma tentativa de sequestro. O trauma o levou a também adotar precauções. “Atendi com portas trancadas durante um ano, e só recentemente voltei a pôr o logotipo na fachada”, revela.

Outro a apostar em um ambiente discreto é o artista plástico argentino Rodrigo Peña, que recebe seus clientes em um sobrado sem nenhuma identificação na Vila Mariana. “É por questão de segurança e também para não ser incomodado por curiosos”, conta. Neste mês, ele bloqueou a agenda para organizar o Underworld Tattoo Music Fest, um congresso que vai reunir 250 dos profissionais mais renomados do planeta no Urban Stage, em Santana, de 14 a 16 de outubro.

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Peña abre horários para receber fregueses somente a cada três meses, intercalando as tattoos entre eventos e viagens pelo mundo. Quando põe a mão na agulha, cobra pelo menos 2 500 por um serviço, realizado principalmente em artistas, advogados e publicitários.

Além da fama, vários desses tatuadores de grife são conhecidos por adotar um traço ou estilo bem próprio, que não costuma variar ao longo de seus trabalhos. É o caso do ilustrador Rodrigo Tas, formado em design gráfico pela faculdade Oswaldo Cruz. Ele chegou a atuar como professor universitário por seis anos, época em que ganhava 6 000 reais por mês. Em 2010, incentivado por um amigo, começou a tatuar com a técnica de aquarela. Tornou-se referência na área, largou as aulas e hoje fatura mais de 30 000 reais mensais.

Outra estrela em ascensão é a arquiteta Adriana Marto. Ela vem se destacando com desenhos delicados, na técnica do pontilhismo, há três anos. Recebe no máximo três clientes por semana em seu apartamento nos Jardins, para sessões de 500 reais a hora. Um de seus clientes recentes foi o youtuber PC Siqueira, que fez três desenhos: um hexagrama em cada um dos polegares e o crânio de sua cadela de estimação no braço esquerdo. “Comecei na tatuagem como passatempo e agora a atividade já se tornou uma das minhas principais fontes de renda”, diz Adriana, que também realiza trabalhos de ilustração para empresas como o Banco Itaú.

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