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Uma volta com Toninho, o síndico da Galeria do Rock

Durante um passeio pelo prédio, Antonio de Souza Neto aponta novas tendências e afirma que o rock ainda está em primeiro plano

Por Mayra Maldjian
Atualizado em 16 Maio 2024, 18h14 - Publicado em 23 fev 2013, 17h09
Galeria do Rock
Galeria do Rock (Adriano Conter/)
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Antonio de Souza Neto, 59, o Toninho, anda apressado pelos corredores do número 439 da avenida São João, no centro de São Paulo, enquanto cumprimenta os conhecidos, mostra lojas recém-chegadas e as tendências culturais de um dos maiores pontos turísticos da cidade, que celebra 50 anos no dia 31 de outubro.

Inaugurado em 1963, o prédio de sete andares recebeu o nome de Shopping Center Grandes Galerias, título substituído pelo apelido Galeria do Rock nas décadas seguintes, quando lojas de discos dominaram o local. Mas, segundo Toninho, a antiga administração não gostava nada dessa alcunha e o espaço, degradado, precisava de uma revitalização. Então, há 20 anos, largou sua loja de fotografia para assumir essa tarefa. “A Galeria estava abandonada, quase fechando. Nós acreditamos na história do rock’n’roll e entramos para evitar isso”, conta enquanto sobe a escada rolante, por onde passam 25 mil pessoas em dias de semana e 36 mil aos sábados e domingos.

Ao chegar no mezanino, muda de assunto. “Tem muita gente que fala que as lojas de CDs morreram, mas olha aquela ali, abriu há pouquíssimo tempo.” Especializada em hardrock e heavy metal, a Volumen Brutal foi inaugurada por Marco Antonio dos Santos, 44, mais conhecido como Joe, e Ricardo Iglesias, 46, em 15 de setembro do ano passado.

“Nós dois frequentamos a Galeria desde 1986”, conta Joe, que decidiu abrir com o amigo seu próprio negócio depois de quase treze anos vendendo discos em outro espaço no mesmo endereço. “Eu estou vendo que a maioria das lojas de CD daqui anda fechando. E pela minha experiência, eu sei que dá para manter uma porque o público de rock é fiel a vida toda.”

De acordo com Toninho, atualmente há 80 lojas dedicadas à música no espaço, 50% a menos do que na segunda metade da década de 1990, quando havia 160 pontos com esse perfil. Com essa queda, diretamente ligada à relação entre os jovens e a internet nos anos 2000, expandiram-se, então, os setores de roupas, acessórios e tatuagens. São, no total, 450 lojas, sendo que oito estão em reforma.

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“O pessoal mais novo vai mais pelo visual do que pela parte da coleção, de ter um vinil, um CD, um DVD. A ideia deles é baixar as músicas pela internet e gastar o dinheiro que têm com roupas”, avalia Iglesias, que abandonou a vida de funcionário de banco após 25 anos para se dedicar integralmente ao rock.

“Aqui chegou a ter 84 lojas de discos, hoje são 39”, soma Luiz Calanca, proprietário da também aniversariante Baratos Afins, misto de selo e loja que completa 35 anos em maio. “É uma coisa natural elas terem fechado. Eu acho que o problema é que só há uma fábrica produzindo discos, o que limita o catálogo, os discos estão muito caros, não tem toca-discos baratos no mercado para as pessoas comprarem vinil, a internet acabou matando o glamour do CD. É difícil reverter a coisa assim, sem o apoio do governo, sem a indústria contribuir. Mas aqui ainda é um grande aglomerado, ainda somos importantes”, analisa Calanca, que lançou 176 álbuns por seu selo.

A Beatz, especializada em rap nacional, estilo em alta no Brasil, abriu uma segunda loja no subsolo (espaço dedicado ao movimento) há cerca de um ano e meio. “O público do hip-hop é também muito fiel, assim como os metaleiros”, comenta o DJ Vito, 28, que comanda a loja. Segundo ele, os CDs que mais saem são de Criolo, Emicida, Kamau, Ogi, Shaw, Terceira Safra e Rael. “Alguns clientes chegam aqui em busca de novidade, porque já confiam no nosso conhecimento.”

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“O skate cresceu muito por aqui”, comenta seu Toninho ao avistar a OXI Skateboard, que abriu uma segunda loja focada somente no longboard. “Por ser maior, é o skate mais fácil de se andar”, explica o proprietário do ponto, Alexandre Hotoshi, 42. “O skate no Brasil estourou na década de 1980 e os praticantes da época estão na faixa etária de 40 a 50 anos, então hoje para andar com o filho de cinco anos facilita”, afirma.

Felipe Rossi, 26, sócio da Pyro’s Skateshop, uma das primeiras a chegar à galeria também aposta nesse tipo de produto. Mas, segundo ele, a concorrência ficou maior, porque muitas lojas de moda street passaram a vender peças de skate também. A clientela fiel, porém, garante o pão de cada dia.

Galeria do Rock

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A mudança no perfil da nova geração frequentadora da galeria e a pluralidade dos negócios parecem não incomodar o síndico. Ele garante que lá ainda se respira vanguarda e que o rock sempre foi e sempre será a diretriz do local. O hip-hop, segundo ele, é também bem-vindo, “mas só no subsolo, para não desvirtuar. Essa divisão é natural”.

Um de seus grandes sonhos, por exemplo, é inaugurar o Museu do Rock, um projeto finalizado em 2009 que ainda não saiu do papel por falta de patrocínio. “Já foi no Madame Tussauds, em Londres? É mais ou menos aquilo”, conta, apontando  para bonecos de Elvis Presley e de Raul Seixas guardados em uma sala escondida no penúltimo andar, onde há também fotografias emolduradas de shows que ocorreram na Galeria do Rock ao longo de seus 50 anos.

Fã de Led Zeppelin e Rage Against the Machine, Toninho está bastante empolgado com a parceria do festival Lollapalooza, que vai promover, uma vez por mês, shows gratuitos de rock independente para celebrar o cinquentenário da galeria. Os primeiros ocorreram no dia do aniversário da cidade de São Paulo, 25 de janeiro, com apresentações das bandas Tokyo Savannah, República, RevoltzSP e name the band. Ainda este ano, o Google deve lançar um Street View para que o público possa explorar a Galeria do Rock com imagens em 360 graus.

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Jornalista de formação, o síndico conta com a ajuda de seus dois filhos, Glauber, 29, e Marcone, 25, para cuidar dos eventos culturais e da divulgação da Galeria do Rock, principalmente no site e nas redes sociais, “que estão bombando”, gaba-se. “São mais de cinquenta milhões de views por mês.”

O síndico também promove uma reunião quinzenal com o conselho da galeria, formado por seis lojistas eleitos a cada dois anos. “Para discutir questões da galeria, quais caminhos seguir, é um trabalho coletivo”, explica.

A administração de Toninho, que tem fama de durão pelos corredores, divide opiniões. Em agosto do ano passado, a Die Hard, uma das lojas de disco de rock mais tradicionais do endereço, publicou um manifesto em seu blog reclamando das “iniciativas culturais” promovidas pela equipe, que “têm deteriorado e corroído uma imagem criada com muito trabalho”, apoiada por muitos colegas lojistas. “Isto nada tem a ver com a limpeza, segurança e outros assuntos que até que estão se saindo muito bem”, pontua.

Mas o síndico parece não se importar com as críticas. Com orgulho, a todo momento exalta a importância história e cultural da galeria, que o levou, inclusive, a palestrar em seminários internacionais. O primeiro deles em Portugal, em 2010, e outro em Paris, em março de 2012. “É um trabalho muito importante que tem sido feito há vinte anos, fomos inspiração para uma novela [“Tempos Modernos”, da Globo], faculdades de todo o Brasil querem estudar a galeria, somos referência para o mundo todo.”

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