Virada tem shows vazios, chuva e acusação de tentativa de censura
Documento do Ministério Público pedia aos artistas para não fazerem manifestações políticas durante as apresentações
Com a descentralização das atrações, poucos nomes capazes de atrair multidões e o tempo frio e chuvoso, a 13ª edição da Virada Cultural, a primeira sob a gestão do prefeito João Doria Jr., teve vários shows com baixa frequência de público.
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No centro, o formato adotado pela prefeitura foi dos tablados, estruturas menores que palcos. Resultado: a plateia se dividiu e a sensação era de um deserto de pessoas. A qualidade do som foi outro problema. Como os tablados ficavam próximos uns dos outros, havia interferência entre as músicas.
No tablado da República, quem sofreu com a falta de estrutura foram os próprios artistas. Alguns dos convidados eram veteranos com dificuldades de locomoção, caso dos integrantes do Azymuth, uma das mais respeitadas bandas de música instrumental do país, e também de Carlos Dafé, Tony Tornado e Paulo Diniz. Todos tiveram de encarar uma escada para subir ao palco, na falta de uma rampa de acesso.
A estratégia de adotar palcos mais afastados do centro, como no Autódromo de Interlagos e na Chácara do Jockey, de fato conseguiu evitar as apresentações lotadas que marcaram edições passadas da Virada. Mesmo nomes fortes da música nacional, porém, amargaram shows para públicos muito minguados. Nando Reis, por exemplo, se apresentou junto da Orquestra Brasileira de Música Jamaicana para não mais do que 150 pessoas.
Entre as baixas desta edição, houve o cancelamento da apresentação de Mano Brown no Grajaú, no domingo (21). O motivo? O palco não estava pronto na última sexta, dia que seria a feita a passagem de som, segundo a produção do artista. A prefeitura admitiu o contratempo e colocou a culpa na chuva, que atrasou a montagem. No lugar de Mano Brown foi escalado Edi Rock.
Outro problema foi relatado pelos DJs da festa Talco Bell, que tocariam no sábado à noite no Coreto da Bolsa de Valores, na Praça Antonio Prado. Quando chegaram no espaço, a estrutura não tinha sido montada. Segundo a prefeitura, houve uma falha técnica.
CONTRA MANIFESTAÇÕES POLÍTICAS
Um documento entregue pela Secretaria Municipal de Cultura aos artistas também causou polêmica. Na cópia do texto assinado pela promotora Karina Mori, do Ministério Público do Estado, estava ressaltado que deveria “haver equilíbrio entre a liberdade de expressão (do artista) e o princípio da impessoalidade que rege todos os contratos da Administração Pública”. De acordo com o secretário municipal de cultura, André Sturm, a prefeitura não tem nada a ver com esse documento. “Só distribuímos por ordem do Ministério Público”, afirmou.
De acordo com a promotora Karyna Mori, a iniciativa do Ministério Público aconteceu após a abertura de um inquérito civil sobre a Virada Cultural de 2016. Na edição em questão, a frase “Temer Jamais” esteve nos telões de shows como o do rapper Criolo e suscitou reclamações dos vereadores do PMDB. “Este é um evento feito pela prefeitura, não é propaganda”, afirmou Karyna. “Não há problema em o artista manifestar sua opinião no palco, mas distribuir camisetas e usar projeções, como ocorreu no ano passado, não cabe num evento feito com dinheiro público”, completou.
A iniciativa de distribuição do documento foi bastante criticada por alguns produtores e artistas, que classificaram a iniciativa como uma tentativa de censura. “Ninguém foi proibido de nada, nem impedido”, defendeu Sturm. “Não houve nenhum tipo de cerceamento.” O efeito do documento do Ministério Público, na prática, foi nulo.
Daniela Mercury, que se apresentou no palco Anhembi, na Zona Norte, com quase uma hora de atraso e pouco público para o espaço (a organização do evento ainda não forneceu números oficiais), foi uma das artistas que se manifestou sobre a situação política do país durante a Virada. Enquanto entoava a canção ‘Tempo Perdido’, de Legião Urbana, pediu a saída do presidente Michel Temer com a frase “Renúncia já”.