Ator, dramaturgo e músico: Vinicius Calderoni e a versatilidade nas artes
O paulistano tem em seu currículo o texto da peça 'Elza', se aventurou como ator em 'Os Arqueólogos' e está à frente da banda 5 a Seco
O método de trabalho de Vinicius Calderoni, entre outras coisas responsável pela dramaturgia do musical Elza, é comparável ao de um chef de cozinha em constante experimentação. As peças de sua autoria, como Não Nem Nada (2014) e Ãrrã (2015), além do espetáculo sobre a cantora Elza Soares, não exigem uma sequência rigorosa das cenas. A ordem pode ser embaralhada sem comprometer a narrativa ou o mergulho do espectador. “Eu reúno os ingredientes, deixo os temperos ao alcance da mão, mas, se alterar a forma de aplicá-los, pode até melhorar o sabor do prato”, sintetiza o paulistano de 33 anos, que ainda é ator, diretor, roteirista de cinema e se multiplica como cantor, compositor e instrumentista da banda 5 a Seco, um coletivo de MPB e indie rock.
A receita aberta a novos estímulos, porém, também pode desandar. O ano de 2017 foi barra para Calderoni por causa de um excesso de tarefas abraçadas sem um foco prévio. “Sabe aquelas horas que você pode pifar a qualquer momento?”, indaga. Uma crise de ansiedade retardou a finalização de sua peça anterior, Chorume, problemas renais exigiram uma rígida dieta e a rotina de gravações da novela Deus Salve o Rei, produzida pela Rede Globo no Rio de Janeiro, colaborou para despertar um inédito medo de avião. “Surgiu um temor de nunca conseguir ficar com os pés no chão.”
Por pouco Elza, em cartaz até o dia 18 no Sesc Pinheiros, não escapou de suas mãos. A intenção era fazer de 2018 um ano sabático no teatro. “Mas não dava para fugir dessa briga, e reencontrei a alegria de escrever”, conta o dramaturgo, que iniciou as pesquisas em janeiro e concluiu o texto em maio, ainda no Rio, na reta final da novela. “Percebi a sensibilidade dele ao falar da Elza não só como grande artista, mas também como uma figura política, assim que recebi os primeiros esboços da peça. Era isso que estávamos procurando”, afirma a diretora do espetáculo, Duda Maia.
Criado no Morumbi, Calderoni, filho único de um casal de psicanalistas, aproveitou muito bem os estímulos recebidos da família. “Ser artista nunca foi um drama de consciência”, define. Vai ao teatro, assiste a filmes, ouve música e joga futebol, torcendo pelo Palmeiras, desde que se conhece por gente. Na adolescência, começou a compor letras de canções e a estudar violão. Já tocava pandeiro e percussão. Em 2007, lançou seu disco de estreia, Tranchã, incentivado pelo violonista Ulisses Rocha, e, dois anos depois, formou a banda 5 a Seco. O quinteto gravou três álbuns, alcança 500 000 ouvintes mensais no Spotify e realiza uma média de 25 shows por ano. Os últimos, na semana passada, foram em Lisboa, Porto e Madri. “No Brasil, tocamos para plateias de 500 a 1 000 pessoas há cinco anos, mas esta foi nossa primeira vez fora do país”, conta.
Foi durante a faculdade de cinema, na Faap, que ele conheceu o diretor Rafael Gomes, na época já formado, seu melhor amigo e parceiro criativo desde 2010. É Gomes quem comanda a encenação de Os Arqueólogos, peça de Calderoni que estreou em 2016 e é interpretada pelo autor e por Guilherme Magon, que voltou ao cartaz, às terças-feiras, no Instituto Cultural Capobianco. “O Vini é uma grande antena, tão torrencial quanto uma cachoeira, por isso não cabe em uma única atividade e se espalha por tudo, sempre associado a fortes aliados”, define Gomes. Um roteiro para a cineasta Julia Rezende e um monólogo para o ator Gregorio Duvivier figuram entre os próximos projetos. Em meio a todas essas atividades, Calderoni ainda é o feliz namorado da editora Mell Brites e cuida da cachorrinha Clementina, adotada em Minas Gerais durante uma turnê da banda. “Eu adoro cachorros até demais, como tudo de que gosto na minha vida, é tudo demais”, resume o artista múltiplo, incapaz de fazer uma coisa só.