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Sebo Desculpe a Poeira, em Pinheiros, completa dez anos

Montado pelo jornalista Ricardo Lombardi, espaço guarda preciosidades editoriais e livros populares com curadoria minuciosa

Por Laura Pereira Lima
Atualizado em 21 jun 2024, 16h55 - Publicado em 20 jun 2024, 17h00
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Ricardo Lombardi: de jornalista a dono de sebo (Roberto Setton/Veja SP)
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Quem caminha pela Rua Sebastião Velho mal suspeita estar nas redondezas do efervescente bairro de Pinheiros. Quase parada no tempo, a via de paralelepípedo conserva prédios tombados dos anos 1950 e poucos estabelecimentos comerciais. O sentimento de nostalgia aumenta ao passar pelo imóvel de número 28. Instalado numa pequena garagem, o sebo Desculpe a Poeira guarda preciosidades do passado e comemora dez anos de existência em 2024. A celebração está marcada para o dia 28 de julho, com direito a DJ, bebidinhas na calçada, amigos, clientes e vizinhos.

Lá dentro, o jazz suave preenche o espaço de 18 metros quadrados, que recebe apenas seis pessoas ao mesmo tempo. Apesar de pequeno, comporta um número surpreendente de obras. São mais de 4 000 livros, guardados em prateleiras de madeira ou empilhados no chão. O extenso catálogo está cuidadosamente armazenado na mente de Ricardo Lombardi, dono do sebo, que se orgulha de saber de cor todos os títulos à venda.

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Fachada do número 28 da Rua Sebastião Velho (Roberto Setton/Divulgação)

Além de uma variedade de obras de ficção, recentes e antigas, o acervo oferece livros de moda, teatro, arquitetura, quadrinhos e esportes, e também raridades, como um exemplar de fotografias de Claudia Andujar, vendido por 13 000 reais. Duas paredes do sebo são dedicadas aos “achados”, documentos, fotos, cartas e cédulas de dinheiro encontrados dentro dos livros usados. Uma receita de massa de pizza e um ingresso do Museo Civico di Como são algumas das lembranças preservadas no sebo.

Os livros de jornalismo ocupam quase uma prateleira inteira. Antes de abrir o sebo, Lombardi trabalhou por mais de vinte anos como jornalista. Começou como arquivista no Estadão, depois foi para o Jornal da Tarde, nas áreas de variedades e turismo, e na Bravo. Em 2014, ele dava expediente como diretor do Yahoo Notícias quando decidiu mudar de carreira. “Meus filhos eram pequenos e queria ter mais tempo livre”, conta. O sebo foi uma forma de conciliar a carreira jornalística e a paixão pela literatura e transformá-las em um negócio. Começou a montá-lo com obras de seu acervo pessoal, enquanto ainda trabalhava em redação, mas depois pediu demissão para se dedicar exclusivamente à livraria. “O que eu tento fazer é dar uma primeira editada, e isso é uma coisa que eu trouxe do jornalismo. A organização dos livros é uma decisão editorial”, explica Lombardi.

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Coleção de documentos encontrados dentro dos livros (Roberto Setton/Divulgação)

Ele revela que, na maior parte das vezes, se desfaz das obras com tranquilidade, mas, quando se arrepende de vender alguma, conta com uma sorte quase mística. “Sempre aparece outro exemplar algum tempo depois. Aí guardo pra mim.” Atualmente, as pessoas o procuram para vender coleções pertencentes a familiares falecidos ou esvaziar estantes durante mudanças de imóveis. Todo mês, são cerca de 200 livros adquiridos.

Mais do que uma loja, o espaço tem se tornado um ponto de encontro, desejo que Lombardi alimentava desde o início do projeto. “É uma espécie de central de notícias do bairro, fico sabendo de todas as histórias”, comenta. “As pessoas têm uma visão meio romântica de dono de livraria, acham que eu fico o dia inteiro fumando um cachimbo e lendo livros. Mas não é bem assim”, diverte-se. Na maior parte do dia ele atende clientes, limpa exemplares, procura obras raras na internet e prepara o envio dos pedidos on-line.

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(Roberto Setton/Veja SP)

Com o fechamento de livrarias e de sebos na cidade, o momento não parece dos melhores para o comércio de livros. Ainda assim, Lombardi não teme as flutuações do mercado: “É um negócio viável, porque o livro físico continua algo bastante valorizado”, afirma, reforçando que não enxerga nos livros digitais uma ameaça. “Se eu tô há dez anos, é porque funciona”, conclui.

Apesar do ar antigo, o Desculpe a Poeira é uma promessa de futuro. “Boa parte de Pinheiros está sendo demolida para que prédios maiores subam, e nesta rua não pode, porque os prédios são tombados. Daqui a cinquenta anos, esse lugar vai continuar exatamente assim”, conta Lombardi, que planeja ficar ali por um bom tempo. “Quero envelhecer aqui.”

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Publicado em VEJA São Paulo de 21 de junho de 2024, edição nº 2898

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