A costumados às espadas de São Jorge, às pencas nas calçadas, talvez os paulistanos se surpreendam com os cactos no jardim da loja e estúdio de design de mobiliário Mula Preta, dos potiguares André Gurgel, de 32 anos, e Felipe Bezerra, de 50. O estranhamento, contudo, cede espaço ao entusiasmo quando se sabe que lá na Alameda Gabriel Monteiro da Silva está a primeira loja no Brasil da Taschen.
É uma unidade pocket da editora alemã, fundada por Benedikt Taschen e tida como uma referência mundial na produção de livros “normais” e de luxo, sobre artes, design e arquitetura. A loja tem seu coração em uma estante com quinze módulos chamada K7, porém há títulos por todo o espaço. Quinhentas obras estão disponíveis, incluindo edições especiais que marcam em 2020 os quarenta anos da editora.
Entre os livros encontrados por lá, estão Dalí — A Obra Pintada (360 reais) e um lança- mento recente, que traz um compilado da produção do arquiteto catalão Gaudí (360 reais). Na lista de edições limitadas, se destaca Genesis, de Sebastião Salgado, com 46,8 centímetros de largura por 70 de altura. Acompanhada de uma mesa desenhada pelo renomado arquiteto japonês Tadao Ando, é destinada a bolsos rechonchudos, já que um exemplar sai por 28 000 reais.
A vinda da Taschen para o Brasil é esperada desde 2004. O país é a quarta praça da editora nas Américas. Em 2013, houve uma experiência exitosa em uma loja temporária no Rio, exclusivamente voltada à produção de Sebastião Salgado, mas nada aconteceu além disso.
“Tivemos na pandemia uma oportunidade única”, explica Julius Wiedemann, editor executivo da companhia alemã, que elenca fatores para a abertura da unidade: “Há uma dificuldade de distribuição no país, devido à crise de grandes redes. Também é muito difícil vender os livros de edições limitadas aqui”. Ele acrescenta a identificação com o espaço do Mula Preta: “É a cara da Taschen”.
O designer e empreendedor Felipe Bezerra, que tem mais de 300 livros da editora, concorda e explica as pretensões do negócio. “Mais do que uma loja, queremos ser um ponto de encontro.” André Gurgel, o outro sócio, também responsável pela poltrona Dunas (abaixo), que traz em madeira as montanhas de areia, fala do DNA da marca: “Trazemos o bom humor da cultura nordestina para as nossas peças”. É uma explicação certeira e simples, que nos leva às boas novas, poucas, de 2020. Talvez nem Padim Ciço aventasse esse encontro da inventividade nordestina com a obstinação alemã na Pauliceia.
Publicado em VEJA São Paulo de 02 de dezembro de 2020, edição nº 2715.