Em São Paulo, segue viva uma das tradições mais longevas da arte contemporânea brasileira. Em meados do século passado, um grupo de artistas nipo-brasileiros criou um salão artístico cuja história atravessa as décadas e aterrissa nos dias de hoje, com a 15ª Grande Exposição de Arte Bunkyo, que começa no domingo (8).
Um salão de arte não é só uma exposição, mas também um concurso competitivo, com um júri que seleciona as obras que serão expostas e premiadas. Desde 1959, isso acontece quase anualmente na sede da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social, o Bunkyo, na Liberdade.
Essa história começa ainda antes, com o Seibi-kai, grupo formado em 1935 por artistas japoneses e liderado pelo pintor Tomoo Handa (1906-1996).
A primeira mostra do coletivo aconteceu em 1938, antes dos trabalhos serem interrompidos pela II Guerra. “Os primeiros artistas do Seibi não tiveram grande reconhecimento porque, durante a guerra, o Brasil cortou relações com o Japão. Eles tiveram de parar de se reunir”, explica o crítico Enock Sacramento, curador-geral da mostra.
Foi no pós-guerra que a organização tomou força com artistas como Manabu Mabe (1924-1997) e Tomie Ohtake (1913-2015), que, a partir de 1952, começaram a expor suas telas no Salão de Artes Plásticas. Mesmo após a dissolução do grupo, nos anos 70, e incontáveis pequenas mudanças de nome, a última em 2007, esse salão é o mesmo de hoje e acontece há 64 anos no mesmo local.
Neste caso, longevo não é sinônimo de ultrapassado. O salão aboliu a taxa de inscrição e desta vez terá uma curadoria-geral e um patrocínio do governo estadual, via ProAC.
De um total de 1 469 obras e 599 artistas inscritos, foram selecionados 268 trabalhos de 220 nomes, com representação de dezessete estados. “É o maior salão de arte da cidade de São Paulo”, afirma Marcos Akasaki, presidente da comissão do setor de Artes Plásticas, uma das metades da exposição.
Ela é dividida entre esse e o núcleo de Arte Koguei, a arte tradicional japonesa, produzida a partir de trabalho manual com materiais como cerâmica e pedra.
Em nenhuma das duas vertentes há qualquer exclusividade ou preferência para artistas ou temáticas orientais. Cristina Myrrha, premiada neste ano com Azul (2021), não possui ascendência japonesa. Já Élcio Miazaki, com Tonsores (2022), foi premiado com uma videoperformance que não trata da tradição nipônica.
“O salão não é exclusivo para a etnia amarela, é aberto para todos os brasileiros. Veja a arte de Manabu Mabe, ele pinta uma japonesa? Não, é arte contemporânea, uma linguagem universal”, sintetiza Akasaki.
Bunkyo. Rua São Joaquim, 381, Liberdade, ☎ 3208-1755. ♿ Seg. a sex., 12h/17h; Sáb. e dom., 10h/17h. Grátis. Até 22/10. @artebunkyo. ■
Publicado em VEJA São Paulo de 6 de outubro de 2023, edição nº 2862