Debora Bloch comemora 45 anos de carreira com sucesso de Odete Roitman
Em 'Vale Tudo', antagonista está dando uma virada e só ficará mais perversa; "Não passo pano pra Odete”, diz a atriz

Nas ruas, Debora Bloch perdeu seu nome para Odete. Ao interpretar a icônica vilã Odete Roitman no remake de Vale Tudo, a atriz experimenta um dos momentos mais marcantes de seus 45 anos de carreira. “Agora me chamo Odete. Até em festa de pessoas que eu conheço há trinta anos, só me chamam de Odete”, diverte-se.

A performance da atriz tem sido celebrada pelo público e pela crítica e curtida nas redes sociais. Só neste mês, a personagem virou tema de memes quase que diariamente. A antagonista está dando uma virada e só ficará mais perversa. A vilã apronta uma atrás da outra: passou cantada em Alok, decretou que sentir ciúmes é cafona e disse uma frase na discussão com Raquel Acioli (Taís Araujo), na cena da prova do vestido de noiva de Maria de Fátima (Bella Campos), que virou figurinha favoritada: “Não temos lastro nem intimidade para uma agressão desta monta”, lacrou a empresária. Mesmo falando barbaridades tanto nos anos 80 quanto hoje, Odete continua sendo uma das personagens mais populares da trama. “Fiquei algumas noites sem dormir enquanto estava me preparando para Vale Tudo. Tive dúvidas do caminho”, conta. Ao mesmo tempo, ela afirma que não hesitou em aceitar a personagem, já que se sentia preparada. “É o meu trabalho. Faço isso há 45 anos”, diz. A partir de 14 de agosto, a atriz também estará no ar na série Dias Perfeitos, baseada no livro de Raphael Montes, no Globoplay.
Fiquei algumas noites sem dormir enquanto estava me preparando para Vale Tudo. Tive dúvidas do caminho, mas é o meu trabalho. Faço isso há 45 anos


Apesar do enorme sucesso, Debora deixa claro que a vilã representa a elite do atraso no Brasil. “Eu não passo pano pra Odete”, afirma. “É um ser humano horrível. Totalmente autocentrada, narcisista, prepotente, classista, preconceituosa. Um retrato de uma classe de pessoas que não tem empatia e que não consegue ver o mundo para além de seu umbigo”, critica. A atriz, que está mais ativa no Instagram e atingiu 1 milhão de seguidores desde a estreia da novela, continua mantendo suas opiniões políticas nas redes. Semana passada, ela postou uma campanha, usando a imagem dos personagens da novela, a favor da justiça tributária com a taxação de grandes fortunas, e um vídeo contra o chamado Projeto de Lei da Devastação (PL 2159/2021). “Existe um estudo de um economista sobre como as pessoas têm uma tendência a admirar os ricos e poderosos e menosprezar os necessitados. Existe esse fascínio. A Odete é tão assumidamente sem empatia que as pessoas acabam se divertindo. Talvez o público goste da vilania e da crueldade, mas num lugar de rir dela e de ver com distanciamento. Como é na ficção, ele se permite achar graça. Odete faz aqueles comentários absurdos com ironia e sarcasmo”, palpita Debora, que elogia o clima nos bastidores da novela e conta que os atores têm um grupo de WhatsApp chamado “Vale Nada”.
Nascida em Belo Horizonte, em uma família de origem de judeus ucranianos, Debora se mudou para São Paulo aos 7 anos, onde viveu até o início da adolescência, aos 14. Morou na Vila Mariana, em Higienópolis e na Bela Vista. Parte de sua família vive na cidade: sua mãe, Rebeca, sua irmã, a assessora de comunicação Deni Bloch, e sua filha, a cineasta e roteirista Julia Anquier, além de tios, primas e sobrinhos. “Cada vez que venho a São Paulo há um restaurante novo mais maravilhoso que outro. Além disso, São Paulo tem uma coisa muito legal de arquitetura e uma vida cultural incrível. E ainda tem cinema e teatro de rua. Eu amo”, lista Debora, que adora a combinação de visitar exposições e ir a restaurantes de museu (confira o rolê da atriz em São Paulo no quadro abaixo). A mais recente vinda à capital paulista teve um motivo especial: o casamento de sua filha com a cantora Maria Beraldo. Toda a família Bloch, inclusive seu filho Hugo Anquier, que mora em Berlim, se mobilizou para vir. “É muito legal você ver um filho feliz, amando e sendo amado. Ver que minha filha teve um encontro legal na vida, algo que nem sempre acontece, é maravilhoso”, diz. Julia conta que a mãe sempre estabeleceu um espaço de amizade entre as duas, no qual ela podia falar sobre tudo e ser acolhida em suas questões e dúvidas. “Então, foi muito natural contar pra minha mãe quando comecei a namorar mulheres e também foi muito natural a forma como ela recebeu. Não chegou a ser um grande assunto entre nós, foi mesmo muito tranquilo e acolhedor. Minha mãe sempre me incentivou a ser quem eu era e fazer o que me faz feliz”, conta Julia.
A nova mulher de 60 é uma mulher viva, bem diferente da mulher de 60 do século passado

Nos 45 anos de carreira da atriz, celebrados neste ano (ela estreou aos 17 na peça Rasga Coração), Debora nunca fez tantas cenas de sexo na TV como em Vale Tudo. Dia sim, dia não, Odete Roitman vai para cama com Walter (Leandro Lima) ou dá o bote em “novinhos” e nos “contatinhos” que cruzam seu caminho e seu celular. “É uma mulher de 60 que está para jogo”, provoca. Numa inversão do conceito de sugar daddy, expressão que define o homem que usa riqueza e poder para se relacionar com mulheres mais jovens, Odete é uma espécie de sugar mommy que despreza o afeto dos que querem um caso mais sério. “Ela é mais despudorada que eu, tem uma cara de pau e uma autoestima impressionantes. Adoraria ter a autoestima da Odete”, diverte-se a atriz. “A (novelista) Manuela Dias trouxe essa nova mulher para a Odete. Mais pragmática, que não está atrás de um amor romântico e que entende que as relações podem ter várias maneiras de acontecer. Ela inverte os papéis e bota a Odete muito em uma posição que sempre foi um lugar masculino: de quem escolhe, de quem dispensa, de quem decide”, observa.
Aos 62 anos, Debora leva para a TV aberta todos os dias uma mulher desejável e desejante. É a mulher do século XXI: em forma, bonita e vivendo tudo o que há para viver. “A nova mulher de 60 é uma mulher viva, bem diferente da mulher de 60 do século passado”, decreta a atriz. Disciplinada, ela mantém o corpo em forma com ioga e musculação. Também tem uma rotina de alimentação equilibrada, levando marmitas para o trabalho. E gosta de cozinhar. “Minha mãe faz um risoto delicioso e um cuscuz marroquino com camarão que eu amo. Lá em casa todo mundo gosta muito de comer. A gente é bem gulosa”, entrega a filha Julia. Quando pode, a atriz vai ao teatro, às rodas de samba (que adora) e a shows. Tem muitos amigos, gosta de estar com a família e se apaixonou aos 55 por seu atual marido, o produtor português João Nuno Martins, com quem está casada há sete anos. “Esse papo chatíssimo de que acabou a vida da mulher depois da menopausa é conversa para boi dormir. As mulheres hoje fazem exercício, cuidam da alimentação, usam a tecnologia a seu favor na pele. Não precisam mais andar de bengala”, afirma.

As fotos que ilustram a capa e a entrevista para esta reportagem de VEJA SP foram feitas em uma rara quarta-feira de folga. No ritmo intenso das gravações, ela tem tido apenas o domingo livre, dia em que se dedica a estudar as cenas que serão gravadas na semana seguinte. “Debora é uma atriz que chega ao set com as cenas profundamente estudadas”, descreve a diretora Joana Jabace, com quem já trabalhou em quatro projetos e agora em Dias Perfeitos. A mesma disciplina que a atriz aplica na vida pessoal e no autocuidado é ferramenta para a profissão. “Tenho muito respeito pela força que as novelas têm no Brasil. Como artista, conseguir chegar a tantos lugares em um país continental, com culturas tão diferentes, é uma grande responsabilidade. Quando você entra no estúdio, corre o risco de perder essa noção. Mesmo que você como ator não vá assistir, precisa ter consciência de que milhões de pessoas vão ver. Tem uma função social. Por isso, faço questão de estudar tanto as minhas cenas para poder entregar uma obra de qualidade para as pessoas”, diz.
Eu não passo pano pra Odete. É um ser humano horrível. Totalmente autocentrada, narcisista, prepotente, classista, preconceituosa. Um retrato de uma classe de pessoas que não tem empatia e que não consegue ver o mundo para além de seu umbigo
Ao final da entrevista, vestida de forma descontraída, distante dos figurinos clássicos de Odete, com jeans wide leg, mocassim flat e suéter, Debora se despede e pede dicas de viagem para a equipe. As gravações da novela estão previstas para ir até novembro. Próximo projeto? “Férias, pelo amor.”
Os rolês favoritos de Debora Bloch por São Paulo
Exposição no Instituto Moreira Salles e almoço no restaurante Balaio IMS
“Essa combinação de exposição e boa gastronomia no mesmo lugar é uma delícia em São Paulo. Adoro esse programa de conferir uma mostra no IMS e depois ir ao Balaio, que eu amo.”
Exposição na Japan House e almoço no restaurante Aizomê
“É muito gostoso poder ver uma exposição lá e depois ir nesse japonês maravilhoso.”
Espetáculos e exposições nas diferentes instalações do Sesc
“Gosto de ver a programação dos Sescs, que são a coisa mais incrível de São Paulo. Não só os teatros, que são maravilhosos, mas todas as atividades. O Sesc é um lugar de altíssimo nível, além de ter instalações incríveis.”
Teatro Oficina
“Um lugar incrível, tem todos os espetáculos que eu assisti lá e aquele prédio da Lina Bo Bardi.”
Komah
“Adoro os restaurantes coreanos. Eu ia muito a esse restaurante da Barra Funda quando gravei a série Segunda Chamada em São Paulo.”
Publicado em VEJA São Paulo de 18 de julho de 2025, edição nº 2953.