“Minha arte, em particular, é bem feia. Meio agressiva, monocromática. Toda a minha criação se baseia em tentar copiar a estética das paredes da cidade. Não os grafites, as paredes mesmo, a sujeira”, diz Cheo González, 47.
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O artista chileno que mora em São Paulo há cinco anos é fascinado pelo Bom Retiro. “Primeiro me apaixonei pelo bairro por ser um recanto de imigrantes. Depois, pelos restaurantes. E também porque queria um apartamento grande por um bom preço.”
Esse interesse especial é um dos motes da mostra virtual 22, do Museu Lusófono da Diversidade Sexual, que conecta entidades de cultura LGBTQIA+ de diferentes países que falam o português.
O número que dá título à exposição, na plataforma Google Arts & Culture, refere-se não só à Semana de 22 mas também à soma das onze pinturas de González, que é gay, com os onze excertos de obras do paulistano Mário de Andrade (1893-1945) que compõem o percurso, com curadoria de Franco Reinaudo.
Os textos transitam entre o político e o sensual, remetendo à bissexualidade do modernista. “Meu primeiro contato com Mário de Andrade foi nos anos 90 — peguei um livro em um sebo e adorei, mesmo tendo um português muito ruim na época”, conta Cheo, que traçou carreira na publicidade antes de se dedicar exclusivamente à arte, com sua vinda à capital paulista, em 2018.
Na região onde mora, estabeleceu uma relação única entre as obras e a vizinhança. “Meu trabalho tem uma conversação do estúdio com a rua. Faço as pinturas, vou para a rua e colo elas em paredes. Lá elas ficam uma semana, um mês, o pessoal pixa, rabisca, e depois trago para o ateliê. Repito esse procedimento quatro, cinco vezes por obra. A maioria se perde, mas muitas voltam”, explica Cheo, que já participou de duas mostras do Museu da Diversidade Sexual, a coletiva Diversa (2019) e a pandêmica Queerentena (2020).
“O processo da Covid-19 me fez pensar na fragilidade econômica dos artistas queer.” Foi a partir desses projetos que decidiu desenvolver o The Queer Museum — um museu virtual de arte LGBTQIA+ com foco comercial, previsto para abril, com exposições de artistas do mundo todo.
Em agosto, partirá para Londres para cursar mestrado em artes, mas conta que sentirá falta de São Paulo. “Acho a cidade muito interessante. A sujeira, as paredes. Lá não tem muito isso.”
Publicado em VEJA São Paulo de 15 de fevereiro de 2023, edição nº 2828
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