No final do ano passado, a cantora e compositora Zulaiê Silva, 34, reuniu amigos músicos e criou um bloco carnavalesco chamado Gal ToTal. Inscreveram-se na programação oficial da cidade para tocar os sucessos da diva da MPB em uma praça do Butantã no Carnaval. “Será um desfile tranquilo, para curtir e brincar em família”, diz a cantora, que assina como Zu Laiê e vai botar o bloco na rua no dia 12. Será uma entre as diversas novidades da festa em 2023, que incluem mudanças na gestão da prefeitura, novos blocos de cantores renomados e a proliferação de festas pagas pela cidade.
Serão cerca de 530 blocos de rua neste ano, menos que no último Carnaval “oficial”, em 2020, que teve 644. A redução se deve, entre outros fatores, ao veto dos desfiles em vias tradicionais como a Avenida Tiradentes e à dificuldade para fechar patrocínios. A prefeitura abriu um edital que daria 14 000 reais aos blocos, mas o pagamento atrasou e possivelmente só chegará após a festa, o que inviabilizou a participação de alguns grupos. “A previsão é que o pagamento saia ainda em fevereiro”, afirma o município.
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Além do Gal ToTal, cerca de sessenta blocos vão se apresentar pela primeira vez na cidade. Dois já nascem grandes: o Estado de Folia e o Bloco da Maria, comandados respectivamente pelos cantores Chico César e Maria Rita. Outros terão atrações inéditas. “Será lindo, vamos celebrar a alegria, a brasilidade e a vida”, diz a atriz Alessandra Negrini, rainha do Acadêmicos do Baixo Augusta, megabloco que terá, pela primeira vez, integrantes do Olodum.
O Sambódromo do Anhembi terá escolas estreantes e camarotes com atrações inéditas, como a cantora Ivete Sangalo. Veja as novidades nas páginas a seguir.
FESTAS LOTADAS
Ensaios pagos se multiplicam pela cidade e ajudam nas contas dos blocos
Se oficialmente o Carnaval de rua começa no dia 11, muito glitter rola na cidade desde o início de janeiro nos ensaios, festas e esquentas promovidos pelos blocos. A agenda se intensificou em 2023. Nas últimas duas semanas, pelo menos vinte eventos pagos ocorreram na capital. Entre eles a Banga Summer, que antecipa o desfile do bloco carioca Bangalafumenga em São Paulo. “As festas viraram uma necessidade para muitos blocos que buscam se autofinanciar”, diz César Pacci, sócio-diretor da Oficina, que além do Bangalafumenga traz à cidade o Sargento Pimenta e o Galo da Madrugada. “Existe um desejo represado de comemorar o Carnaval”, completa Anna Cecília Junqueira, do Gambiarra, que desfila no dia 12 e antes fará um esquenta pago. O Acadêmicos do Baixo Augusta optou pelos ensaios gratuitos. Um deles recebeu 3 000 pessoas nos Campos Elíseos (foto acima), no dia 29.
O QUE DIZ A PREFEITURA
Pela primeira vez, a Secretaria de Cultura vai centralizar a organização do Carnaval de rua, no lugar das subprefeituras. Mudanças como o veto aos desfiles em avenidas tradicionais e a antecipação do horário de dispersão dos blocos geraram críticas de alguns foliões. A secretária municipal de Cultura, Aline Torres, responde sobre esses assuntos.
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Houve diálogo suficiente com os blocos descontentes?
Houve muito diálogo. Se será suficiente, não posso saber. Nada é publicado sem o conhecimento deles.
A região da Sé receberá um quarto dos blocos. Não é muito?
Costumamos dar prioridade para os que saíram outras vezes nessas regiões. São os mais tradicionais.
Então a descentralização não funcionou?
Você tem blocos desde Perus (Zona Norte) até Itaquera (Zona Leste). As regiões distantes têm seus blocos.
O que mais preocupa?
Os horários. Quanto mais escuro, mais difícil para a PM conseguir fazer o trabalho dela. Outro desafio é conseguir devolver a via limpa e aberta para o trânsito e para quem não curte Carnaval.
A antecipação do horário de dispersão provocará problemas?
Obviamente que com blocos com 100 000 pessoas a gente terá mais flexibilidade.
60 NOVATOS NAS RUAS
Blocos estreantes se formaram até por videoconferência
Pelo menos sessenta blocos vão desfilar pela primeira vez nas ruas da cidade em 2023. A maioria é formada por ex-integrantes de outros grupos. Alguns nasceram durante a pandemia, como o Benjores, idealizado em 2020 para homenagear Jorge Ben Jor. “Nenhum bloco tocava só músicas do cantor”, diz o administrador Rogério de Paula, 34, vocalista da trupe.
Alguns estreantes trazem propostas inovadoras, como usar um instrumento como tema do desfile. O Zabumbeabá, por exemplo, fará da zabumba — uma espécie de “bumbo do forró” — a protagonista da folia. Criado em 2021, o bloco terá cerca de trinta músicos, a metade deles tocando zabumbas. “O tambor grave tem um impacto, fica uma sonoridade bem dançante”, diz o músico Lipe Torre, 40. O repertório inclui xaxados, xotes, forrós e homenagens a Luiz Gonzaga e Alceu Valença. Outros novatos acabaram reunidos por algum bairro da cidade. É o caso de Os Cataratos do Niágara, criado em 2022. O bloco reúne ex-amigos de faculdade que moram nas ladeiras da Pompeia, na Zona Oeste. “Fundamos o grupo de forma despretensiosa. Não temos intenção alguma de bombar”, afirma a comunicadora Bárbara Maués, 47.
“O CORAÇÃO FICA QUENTINHO”
Chico César terá pela primeira vez um bloco em São Paulo. Maria Rita também vai estrear na folia
Nascidos para se tornar megablocos, o Estado de Folia e o Bloco da Maria, comandados, respectivamente, por Chico César e Maria Rita, farão a estreia nas ruas de São Paulo. “É a cidade onde moro desde 1985, tenho profunda ligação com as alegrias e as dores daqui. Fico feliz de cantar as minhas músicas na versão mais alegre e festiva. O coração fica quentinho”, diz Chico César. O músico já fez apresentações pontuais no Carnaval paulistano, como em 2020, quando cantou no bloco QuilomboLAB, comandado pelos rappers Emicida e Rael. Também participou de diversos trios pelo Brasil, como os de Daniela Mercury, Margareth Menezes e Armandinho. A única experiência-solo tinha sido o MicroTrio, montado em um furgão de Salvador, em 2014. Canções animadas, sobretudo do álbum Francisco, Forró y Frevo, estarão no repertório. Clássicos como Mama África também compõem a lista. Estado de Folia sai no sábado (11), no Parque Ibirapuera. O Bloco da Maria faz o “esquenta” do Monobloco, no domingo (12).
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OLODUM EM SP
Grupo tocará no Baixo Augusta, um dos quinze megablocos de 2023
Entre os quinze megablocos previstos para o Carnaval de rua em 2023, deve chamar a atenção o Acadêmicos do Baixo Augusta, que terá participação do grupo Olodum em todo o percurso. “Aumentamos a estrutura para ter mais seguranças, cordeiros, bombeiros e ambulâncias”, diz Ale Natacci, presidente do bloco. A expectativa é que mais de 1,5 milhão de pessoas compareçam. Outros megablocos que preveem arrastar multidões são Bangalafumenga, Sargento Pimenta, Monobloco, Agrada Gregos, Charanga do França, Navio Pirata da BaianaSystem e os cordões comandados por Alceu Valença (Bicho Maluco Beleza), Michel Teló (Bem Sertanejo), Pabllo Vitar (da Pabllo) e Daniela Mercury (Pipoca da Rainha).
IVETE NO ANHEMBI
Camarotes dos desfiles terão atrações inéditas em 2023
Famosos que nunca se apresentaram no Carnaval de São Paulo vão estrear nos camarotes do Sambódromo do Anhembi em 2023. Um exemplo é a cantora Ivete Sangalo, que sobe ao palco do tradicionalíssimo Camarote Bar Brahma durante o Desfile das Campeãs (no sábado, dia 25). Nos dias de desfile regular das escolas, a programação do espaço inclui Zeca Pagodinho e Péricles (17), Sorriso Maroto, Pixote e Diogo Nogueira (18) e Seu Jorge e Alexandre Pires (19).
Bem ao lado do recuo da bateria, o Camarote 011 também organiza apresentações musicais com grupos como Nuwance e Entre Elas, formado por mulheres sambistas (ambos no dia 17) e duplas como Brenno e Gustavo (19), de sertanejo. Sempre com comida e bebida à vontade até de madrugada, o 011 terá um cardápio inspirado em carnavais de várias regiões do Brasil, incluindo baião de dois, acarajé, caldinho de vatapá e cocada. O serviço dos camarotes normalmente é open bar e inclui um transfer do hotel até a avenida (veja mais na agenda no final).
PONTE AÉREA DA FOLIA
Os destaques do Rio, para quem viajar à cidade
Embora tenha aumentado o número de cariocas que também curtem o Carnaval em São Paulo, ainda são muitíssimos os paulistanos que viajam para aproveitar a festa na Cidade Maravilhosa. O Rio montou o maior esquema operacional já feito nos desfiles de rua na cidade e espera 5 milhões de pessoas nos blocos. Quem cruzar a ponte aérea nos próximos dias vai poder participar de oito megablocos, um recorde do evento carioca. Abre a agenda dos megablocos, que desfilam em um circuito montado no Centro da cidade, o Carrossel de Emoções, que agita o público com funk já no sábado (4), a partir das 8h. Em seguida, no domingo (5), o Bloco da Lexa, liderado pela cantora, reúne foliões no mesmo horário. No dia 18, é a vez do tradicional Cordão do Bola Preta e no dia 26, do Monobloco. Fora do circuito de megablocos, são destaques o Simpatia é Quase Amor, grupo com quase quarenta anos que festeja em Ipanema no dia 11 e no domingo (19), e a banda Bangalafumenga que, depois de passar por São Paulo, faz show no bairro da Glória, no dia 19.
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“NÃO VAMOS SÓ PARA PARTICIPAR”
Terceiro Milênio será a escola novata no Grupo Especial
Estreante na elite do Sambódromo do Anhembi, a escola Estrela do Terceiro Milênio vai apresentar o enredo Me Dê a Sua Tristeza que Eu Transformo em Alegria. As pretensões são maiores que apenas se manter no Grupo Especial. “Nosso projeto é impactar. Se nada der errado, acredito que vamos disputar o título”, diz o presidente Silvio de Azevedo.
Fundada em 1998 no Grajaú, em apenas cinco anos a agremiação saltou do Acesso 2 (espécie de terceira divisão) para o grupo principal. Em 2022, faturou o Acesso 1, deixando para trás escolas tradicionais como a X-9 Paulistana, a Leandro de Itaquera e a Pérola Negra. Para Azevedo, a ascensão está ligada ao maior envolvimento da comunidade no projeto. “É uma região periférica, que costuma estar nas páginas policiais dos jornais. Fomos agentes transformadores”, afirma. A mudança também teve uma ajudinha de foliões influentes. O vereador Milton Leite (União Brasil), presidente da Câmara, é também presidente de honra da escola. Segundo Azevedo, o padrinho político ajuda a “abrir portas”.
CONFIRA A AGENDA ABAIXO:
Colaboraram Humberto Abdo e Júlia Rodrigues
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Publicado em VEJA São Paulo de 8 de fevereiro de 2023, edição nº 2827