Caio Blat estreia Os Irmãos Karamázov no Sesc Pompeia
Adaptação teatral marca momento áureo na trajetória do ator, que completa 35 anos de carreira

Mesmo quem acompanha a carreira do ator Caio Blat pode nem se dar conta. Dos seus 44 anos de vida, nada menos que 35 ele passou trabalhando. Tinha 9 anos quando começou a fazer comerciais e 11 quando entrou para o elenco de Mundo da Lua, seriado produzido pela TV Cultura entre 1991 e 1992, com roteiro de um time que incluía Ana Muylaert e Fernando Bonassi. Já na estreia, “apenas uma diversão na época”, contracenou com mestres como Gianfrancesco Guarnieri e Antonio Fagundes.
De lá para cá, o ator paulistano trilhou uma carreira consistente, pautada em escolhas acertadas, mesclando papéis populares nas novelas com trabalhos inquietantes no cinema independente e no teatro — Cama de Gato, filme em que estrela uma cena de estupro coletivo, foi exibido enquanto fazia o protagonista de Um Anjo Caiu do Céu, na Globo.
Caio vive um momento áureo em sua trajetória. Na quinta (27), estreia no Sesc Pompeia aquele que considera seu projeto de vida: a adaptação para o teatro de Os Irmãos Karamázov, último livro do escritor russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881).

“Ele conseguiu colocar toda a sua obra neste livro, onde antecipa o pensamento de Nietzsche e de Freud, que considerava o maior romance já escrito”, ressalta, mencionando conceitos como morte de Deus e complexo de Édipo, durante entrevista concedida de sua casa, na Lagoa, no Rio de Janeiro. Um projeto que começou a ser maturado há vinte anos com o amigo Manoel Candeias, com quem divide a adaptação.
Além de adaptar e dirigir (ao lado de Marina Vianna), Caio interpreta Ivan, um dos três filhos de Fiódor Karamázov. Ambientada na Rússia pré-revolucionária, a peça acompanha as disputas entre os irmãos e o patriarca pela herança da família e pelo amor da mesma mulher. Ressentimentos vêm à tona até culminar com o trágico desfecho.
Na montagem, a obra, com mais de 800 páginas, se transformou numa ópera rock moderna.

“Fazer Os Irmãos Karamázov, uma peça de duas horas, na era dos quinze segundos das redes sociais, é um ato político. Ajuda a perpetuar essa obra e a não deixar morrer o teatro da palavra”, destaca o grande amigo Babu Santana, no elenco com Luisa Arraes (ex de Caio), Sol Miranda, Nina Tomsic, Pedro Henrique Muller, Lucas Andrade e Marina.
Em paralelo com a peça, em cartaz até 30 de março, Caio tem divertido (e irritado) o público como o Benjamin de Beleza Fatal, novela do Max. “É um personagem rico, um playboy submisso, hedonista, uma pessoa medíocre que se acha o gostosão. Tem sido um privilégio fazer a dupla de bandidos com a Camila (Pitanga, que vive sua esposa, Lola), que com esse papel entra para o panteão das novelas”, afirma o ator, que também fez “uma ponta” como assistente de direção na produção.
Na trama, Caio repete a dobradinha pai e filho com Herson Capri, com quem tem dividido o palco em Memórias do Vinho, que volta a São Paulo no segundo semestre. “O Caio é ator, diretor, adaptador de obras importantes, produtor e faz tudo com muita dedicação e alegria. E administra muito bem a sua carreira, sempre com foco na qualidade das escolhas”, elogia o colega.

Ele tem razão. Em breve, Caio volta ao cinema para levar às telonas a vida de Cacilda Becker (1921- 1969), atriz pioneira. “Foi a primeira a exigir ser contratada. É como se minha geração prestasse homenagem a um dos fundadores do nosso ofício”, conta Caio, que vai dirigir Débora Falabella no papel principal. O filme será todo gravado no restaurado Cine-Theatro Central, construção de 1929 em Juiz de Fora (MG). Tem mais: ele revisita pela quarta vez o personagem Riobaldo ao ser a voz escolhida para gravar o audiobook de Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa.
Vivendo no Rio há mais de duas décadas, Caio conta que tem redescoberto sua cidade natal. Até comprou uma quitinete no Copan. “Gosto de passar pelo Largo São Francisco, visitar a Biblioteca Mário de Andrade, a Casa de Francisca, a Praça Roosevelt. Me sinto em casa.” Seja sempre bem-vindo, Caio.
Publicado em VEJA São Paulo de 28 de fevereiro de 2025, edição nº 2933