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Guardião do blues e do jazz, Bourbon Street celebra trinta anos na ativa

Casa de shows em Moema completa três décadas com programação especial que inclui apresentações de Seu Jorge e Gary Brown

Por Tomás Novaes
8 dez 2023, 06h00
Edgard Radesca, 77, ao lado da guitarra de B.B. King: histórias lendárias (Leo Martins/Veja SP)
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Em uma esquina simpática de Moema, rodeada por escolas e casas, existe um sobrado que já recebeu alguns dos nomes mais importantes da música internacional — de Nina Simone a Ray Charles, de Ron Wood a Diana Krall.

No dia 13 de dezembro, esse lugar, o Bourbon Street Music Club, completa exatos trinta anos de sua inauguração, que serão celebrados com apresentações especiais de Seu Jorge e Gary Brown.

É verdade que o bluesman B.B. King fez os quatro shows de abertura da casa, em 1993 — o início de uma relação próxima, que rendeu outras turnês e até uma guitarra autografada, exposta em uma espécie de santuário na entrada do espaço. Mas, poucas semanas antes, o casarão recebeu um primeiro evento fechado, com duas apresentações da cantora Marva Wright.

“No primeiro dia, às 3 horas da tarde, aqui era uma praça de guerra. Pó, serra, gente correndo para lá e para cá. Foi cena de filme: dois minutos depois de colocarmos os entulhos no caminhão, chegaram os primeiros ônibus com os convidados”, relembra Edgard Radesca, 77, fundador e diretor da casa.

Bourbon Street 30 Anos
Edmilson Santilli, Clóvis Fernando de Cerqueira César, Edgard Radesca e, depois de FHC, Luiz Fernando Mascaro: os quatro sócios com o presidente recém-eleito, em 1994 (Leo Martins/Veja SP)

Foi durante um papo de madrugada com o cunhado Luiz Fernando Mascaro, baixista e veterinário, que resolveram abrir um espaço dedicado à cidade americana de New Orleans em São Paulo. “Ele foi o primeiro a viajar para lá e voltou com a ideia de trazer aqueles músicos. Um dia, tomando cerveja às 5 da manhã, viramos sócios e decidimos abrir uma casa”, conta Radesca, engenheiro de formação, que comandava uma consultoria de marketing na época.

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“Esse endereço era uma casa em L com um jardim aberto. O ideal era ir para Pinheiros ou Vila Madalena, como hoje, mas não tínhamos o dinheiro. Pensamos então: temos que fazer algo tão bom que as pessoas venham até nós”, conta o empresário.

Entre as primeiras viagens para os Estados Unidos e a inauguração, foram quatro anos de uma lenta construção. “Quando entrou o Plano Collor, estávamos no meio das obras. De repente, ficamos sem dinheiro. Ninguém era louco o suficiente para virar sócio — então todos que entraram no negócio eram parentes (risos). Nos piores momentos, a gente só tinha verba para os tijolos”, diz.

Antes da abertura, em 1991, o grupo chegou a promover uma turnê de artistas de New Orleans pelo interior de São Paulo, para levantar dinheiro. E, para trazer B.B. King, fizeram uma vaquinha.

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Com a grana arrecadada, conseguiram arrematar quatro shows da lenda do blues em um leilão. “O bonito dessa história é que nunca pude confirmar se a gente realmente ganhou o leilão, ou se ele (B.B. King) escolheu abrir um clube em vez de fazer shows maiores. Eu falo isso e fico arrepiado. Conhecendo a pessoa especial que ele era, pode e deve ter sido isso”, afirma, emocionado, Radesca.

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Trinta anos depois, pouco mudou no Bourbon Street, que mantém a sua acústica caprichada, com pé-direito alto, diferentes ambientes e duas mesas de som. Após a reforma de abertura, a outra mudança estrutural aconteceu somente em outubro de 2020, com a criação do Jazz Café, que integra o bar e o salão à rua.

“A pandemia foi um momento muito difícil. Para sustentar a casa, tivemos a ideia de criar um espaço para abrir à tarde, com almoço. Fazer isso acontecer foi um contraponto muito importante para a nossa alma, de resistência”, diz Radesca.

Hoje, ele continua ativo e presente no seu estabelecimento, sem planos de se aposentar. “Quem me suceder precisa ter esse espírito. Você não constrói algo por 30 anos para virar um lugar somente comercial. Muitas vezes nós não cuidamos do dinheiro para cuidar da realização. Essa é a história desta casa”, afirma.

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Para ele, a questão essencial para o futuro do Bourbon é conseguir um patrocinador. “Na pandemia, recebi mais de 100 contatos de interessados. De dinheiro, nós tivemos ofertas. Mas não quero um parceiro que só olhe para a grana, tem que ter paixão, envolvimento, gostar de música. Essa figura é muito difícil de encontrar”, diz.

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Para comemorar as três décadas do espaço de Moema, Seu Jorge estreará no palco intimista, no dia 14. “De B.B. King a Seu Jorge. É o arco da música negra, artistas que tiveram, no começo da sua vida, muitas dificuldades e que conseguiram, pela música, ter voz”, comenta o proprietário.

Além dessa noite especial, o saxofonista Gary Brown, de New Orleans, se apresenta no dia 13, data do aniversário da casa. E, até domingo (10), uma série de outros nomes estarão na 19a edição do Bourbon Street Fest, no Parque Burle Marx, gratuitamente, e também no Bourbon.

“No ano que vem, completamos vinte anos de festival. Será uma edição especial”, adianta Radesca, olhando para a frente com otimismo, paixão e “uma pitada de irresponsabilidade”, como costuma dizer.

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Publicado em VEJA São Paulo de 8 de dezembro de 2023, edição nº 2871

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