No século XIX, o poeta britânico Lord Byron descreveu o litoral de Montenegro como “o mais belo encontro entre terra e mar”. Ao sul da Croácia, os 294 quilômetros costeiros desse país de 620 000 habitantes são escoltados por montanhas que se apoiam quase verticalmente sobre o Adriático. Em certo ponto, um braço esmeralda avança e forma um forde, a Baía de Kotor, ladeada de vilarejos amuralhados. Recheadas de palazzos dos tempos do domínio veneziano, construções bizantinas e basílicas milenares, as cidades de Kotor, Perast e Herceg-Novi parecem peças de Lego diante da grandeza da cordilheira. Entre elas, formam-se praias de pedras vermelhas, cinzas, brancas, brilhantes sob o mar cristalino. O conjunto da obra se encaixa no já decretado papel de “nova Riviera”. Mas, diferentemente de outros hotspots mediterrâneos, esse canto dos Bálcãs vem se formando como um refúgio para não ver e não ser visto.
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No último verão, a estilista Mary Katrantzou, nome de destaque em Londres, circulou pela costa a bordo do iate da bilionária russa Nasiba Adilova, editora da revista digital Buro 24/7, referência de estilo de vida no Leste Europeu e no Oriente Médio. Nasiba foi uma das responsáveis pela campanha de lançamento do Porto Montenegro, projeto do canadense Peter Munk ó fundador da maior mineradora do mundo, a Barrick Gold ó, instalado numa antiga base naval do século XIX. Separada do balneário de Tivat por um muro alto, a marina consumiu 287 milhões de euros. O empreendimento, equivalente a 6,5% do PIB de Montenegro, tem entre seus investidores o barão Jacob Rothschild e Bernard Arnault, do conglomerado LVMH.
Até pouco tempo, pernoitar aqui era privilégio dos passageiros dos barcos atracados e dos proprietários dos 130 apartamentos do Porto. Inaugurado em agosto, o Regent (regenthotels. com; diárias a partir de 650 euros) é o primeiro hotel desse espaço, com 35 suítes e 51 quartos. O cinco-estrelas foi inspirado nos palacetes venezianos e traz influências da estética náutica em poltronas e tapetes listrados em tons de azul e tecidos que pendem do teto como grandes velas. O complexo acaba de concluir uma ampliação dos pontos de atracagem. Atualmente, um quarto das 400 vagas comporta barcos de até 180 metros ó o plano é dobrar a capacidade nos próximos anos. Para efeito de comparação, o Porto de Saint-Tropez, na Riviera Francesa, abriga embarcações de até 75 metros. No ano que vem, Porto Montenegro será a sede do Superyacht Ownersí Summit, o principal encontro da indústria. Munk conseguiu um acordo com o governo local para vender combustível livre de taxas — assim como champanhe e destilados. Isso signifca que abastecer em Porto Montenegro custa 45% menos do que na União Europeia, onde encher o tanque de um superiate pode custar mais de 200 000 euros.
Mas o lugar está longe de ser apenas um posto de diesel. Com vista para o forde, cinco píeres enfeitados com palmeiras conduzem a uma cidadela de ruas para pedestres onde se enfileiram restaurantes e lojas. Grifes como Lanvin, Moschino, Fendi, Kenzo e Chloé estão no mix das multimarcas Mungos e Mooi. O beach club Lido concentra o contido people watching em terra firme, com uma piscina de borda infinita de 64 metros de comprimento. À noite, um burburinho low proifle gira em torno do clube Scaramanga, cujo sistema de iluminação leva a assinatura de Patrick Woodroffe, responsável pela abertura da Olimpíada de Londres.
A vocação montenegrina para playground da aristocracia não é novidade. Nos anos 1950, a ilhota medieval de Sveti Stefan, a 30 quilômetros ao sul de Porto Montenegro, foi transformada em hotel pelo governo iugoslavo e caiu nas graças de celebridades como Sophia Loren e Elizabeth Taylor. Com o desmembramento do país a partir dos anos 1990, o lugar ficou abandonado. Uma vez conquistada a independência da Sérvia, em 2006, o grupo Aman Resorts venceu uma concorrência para devolver ao vilarejo os tempos de glória. Inaugurado em 2011, o Aman Sveti Stefan (amanresorts.com; diárias a partir de 950 euros) foi concluído neste verão, com uma nova piscina e um spa que se abre para uma das três praias particulares. Aqui a modelo Naomi Campbell relaxava sobre uma espreguiçadeira no momento da visita de VEJA LUXO para esta reportagem. A restauração foi uma aventura de seis anos. “É mais fácil construir algo do zero porque não há surpresas”, diz Adrian Zecha, fundador do grupo Aman Resorts.
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Entre os imprevistos, os engenheiros toparam com a igreja ortodoxa Alexander Nevski, soterrada durante a era comunista. Hoje, ela contorna a piscina de pedras negras, no melhor mirante da ilha para ver o sol desaparecer no Adriático. Sveti Stefan foi erguida no século XV para abrigar doze famílias do clã Pastrovic e protegê-las dos frequentes ataques de piratas. A aparência dos edifícios foi mantida e os cinquenta quartos e suítes foram alojados no interior das antigas residências. É preciso desfilar por cerca de 100 metros, ao longo de um istmo amparado por duas praias, até adentrar o portal do vilarejo. O caminho até o quarto passa por becos de pedras, de cujas paredes pendem trepadeiras floridas. As praças são enfeitadas com ciprestes e oliveiras. Por trás da fachada, o quarto é puro minimalismo.
No continente, a villa dos anos 1930 que serviu de residência de verão à rainha Marija Karadordevic completa o hotel, com oito suítes de frente para o mar. Em julho, o cenário foi palco do casamento do tenista sérvio Novak Djokovic com Jelena Ristic, longe dos holofotes da mídia. “Montenegro tem a reputação de ser o último segredo do Mediterrâneo, um fenômeno extremamente raro na Europa”, diz Adrian Zecha. Não deve durar muito. Para 2016 está previsto o lançamento de outro empreendimento peso-pesado nos arredores de Tivat, o One&Only, com 150 residências e uma marina para 250 barcos. Na ilhota de Sveti Marko, visível desde Porto Montenegro, o primeiro hotel da rede asiática Banyan Tree (autoproclamado “seis-estrelas”) deve ser inaugurado nos próximos anos. A hora de aproveitar o segredo é agora.