Há dias bons e dias extraordinários como este, em que se cruza o globo de avião — do Salão do Automóvel de Detroit para o Autódromo de Bahrein, no Golfo Pérsico — pela chance de pilotar o carro de estrada que mais se aproxima das máquinas da Fórmula 1. É no deserto que o McLaren P1 me espera. São muitos os motivos que fazem desse carro um oásis no universo quatro rodas. Ele sintetiza a sabedoria adquirida em cinquenta anos pela McLaren, tempo em que a equipe conquistou 182 vitórias — com Ayrton Senna campeão mundial em 1988, 1990 e 1991 — e 155 pole positions em grandes prêmios. Vem daí o nome deste carro para duas pessoas, com motor central: P1 de pole position e primeiro lugar. Não menos sedutor é o fato de ele ser o pioneiro entre os três superdesportivos híbridos com potência para revolucionar o mercado. O McLaren P1 se soma ao Porsche 918 e à Ferrari La Ferrari na tarefa de unir a propulsão convencional do motor a gasolina à energia elétrica para alcançar performances de outro mundo e consumos deste. Sim, é um híbrido com um estrondoso motor V8 de 3,8 litros, dois turbos e 737 cv — e um discreto mas dotado motor elétrico de 179 cv. Trabalhando em equipe, eles geram quase inverossímeis 916 cv num carro que pesa menos do que um Toyota Corolla (1 395 quilos).
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Esse avião de baixa altitude de fibra de carbono tem um aspecto furioso ao aterrissar diante do hotel. Passo sob a porta asa de gaivota para me acomodar no banco tipo baquet: o P1 parece surpreendentemente civil. Em respeito aos hóspedes, arranco em modo 100% elétrico. A visibilidade para trás é pouca. A suspensão é rígida. Mas, para um superdesportivo, o carro de 1 067 000 euros é apto à vida real, confortável e manso, se preciso. Assim que as primeiras fotos do P1 foram publicadas, a McLaren recebeu pedidos. Em outubro,quando foram entregues os primeiros carros, o resto dos 375 veículos tinha sido vendido. Ainda é possível entrar numa lista de espera. Mas a montadora não aumentará a produção. Com quatro semanas de trabalho manual e um carro pronto por dia, a última encomenda só será entregue em maio de 2015.
A não ser que haja algum cuidado com o pé direito, é fácil queimar no asfalto a borracha dos Pirelli P Zero Corsa 315/19 feitos sob medida a cada arranque: 2,8 segundos de zero a 100 quilômetros por hora. Em 16,5 segundos, chego a 300 quilômetros por hora ó o limite é 350. Na dianteira, lugar do porta-malas de 120 litros, fica o carregador para devolver a vida à bateria em duas horas. Ao contrário do que a Porsche fez no 918, aqui não se optou pela recuperação da energia excedente na frenagem. Foram desenvolvidos, com a Akebono, os freios a disco de cerâmica. Com esse revestimento duro, utilizado nos foguetes Ariane, bastam 30,2 metros para parar o carro a 100 quilômetros por hora.
Das ruas para a pista de Fórmula 1 do Bahrein, ativo o modo race. Em trinta segundos, o P1 muda de personalidade. Baixa 5 centímetros. Os amortecedores ficam 300% mais rígidos. O defletor ergue-se 30 centímetros. A traseira cola no asfalto. Ao toque da tecla azul do painel, com a inscrição DRS (drag reduction system), o defletor rebate-se, a força aerodinâmica de 600 quilogramas implode e, ao acelerar, o P1 voa. A tecla vizinha ativa o instant power assist system. É necessário voltar ao funcionamento de combustão econtentar-se com 737 cv. Mas, quando se aciona a tecla vermelha, o carro é catapultado. Nem os pilotos de F1 experimentam a sensação dentro dos seus carrinhos: o choque elétrico de 82 cv (e não 179 cv) dura uma dezena de segundos, e não meio minuto, como aqui. O Bugatti Veyron é mais potente e mais rápido na reta. O Porsche 918 tem uma maior autonomia elétrica e o encanto de um roadster. O Pagani Huayra é uma orgia de design de couro. Mas nenhum super desportivo “voa baixinho” de forma tão embriagantemente espetacular, tão precisa e violenta como o P1. E, com todo o respeito, parece difícil imaginar que o LaFerrari consiga fazer melhor.