Há três meses, a americana Heritage leiloou uma bolsa Hermès por 185 000 dólares. De couro de crocodilo numa cor rara, quase albino, a Birkin Himalayan Nilo Crocodile de 30 centímetros traz detalhes como fechos de ouro branco de 18 quilates incrustado de diamantes. Não foi o arremate mais alto pago pelo modelo icônico. Em dezembro de 2011, os mesmos leiloeiros bateram recorde com uma versão vermelha: 203 150 dólares. Esses são exemplos no topo da pirâmide de um mercado recente e crescente – comercializar bolsas de grife – para as casas de leilão, cuja imagem ao longo dos anos se solidificou com a venda de artigos ditos nobres, como arte, mobiliário, joalheria e relojoaria. “Bolsas se tornaram itens cobiçados por colecionadores, que querem o prazer imediato de possuir a sua”, diz Cristiano Bierrenbach, vice-presidente da empresa estabelecida em 1976. “Elas representam excelente aplicação: uma edição limitada da Hermès, em bom estado e com certifcado, preserva seu valor tanto quanto um quadro de Picasso. ”Como não são muitos os Picassos disponíveis na praça, os acessórios tornaram-se um dos nichos com o maior potencial de crescimento não só na Heritage, que movimenta cerca de 15 milhões de dólares por ano com sua divisão de bolsas, mas também em concorrentes como a Christieís, a Leslie Hindman Auctioneers, de Chicago, ou a Artcurial, de Paris.
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Para se ter uma ideia do peso desse departamento, duas casas de leilão brigam na Justiça por causa de um especialista em bolsas, responsável por identificar itens legítimos. Matthew Rubinger, de 26 anos, foi o diretor de acessórios de luxo da Heritage até o primeiro semestre deste ano, quando assumiu a direção internacional para a Ásia e Hong Kong da Christieís. A Heritage acusa o ex-funcionário de quebra de contrato e roubo de segredos de negócios e pleiteia uma indenização de 60 milhões de dólares. Compensou a perda com a contratação de Max Brownawell, 21 anos, ex-estudante de engenharia de sistemas na Universidade de Virgínia, nos Estados Unidos. “Compro e vendo artigos de luxo de segunda mão desde os 12 anos”, diz ele, introduzido ao universo pela mãe, Carolyn. “Ela tem bom gosto e sempre pediu minha opinião durante as compras.” O conselho que Brownawell dá à mãe é o mesmo para os investidores: “O mais importante é amar a bolsa, mas considere o valor no mercado secundário, para não perder muito dinheiro quando se cansar de usá-la”.
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Nesse quesito, os modelos Hermès são hors concours, chegando a valer sete vezes mais que um Chanel, a segunda no ranking. “Na loja, uma Chanel de crocodilo custa 40 000 dólares, enquanto uma Hermès similar sai por 55 000 dólares. No mercado de revenda, no entanto, a diferença de valor entre as duas é chocante, simplesmente porque é possível comprar uma Chanel nas lojas, mas uma Hermès é muito difícil de obter”, afrma Caitlin Donovan, especialista da Christie’s, em Nova York. É o que explica as margens de venda no martelo entre 80% e 120% sobre o preço pago pelo comprador original. Leilões, portanto, não funcionam necessariamente como brechós para barganhas finas, mas como oportunidade de deparar com um modelo extinto no comércio tradicional. É o caso de Birkins de avestruz: com a difculdade de encontrar couro de qualidade, a grife francesa cancelou a produção em Pantin, nos arredores de Paris. Agora, só versões usadas. “A Hermès foi a primeira a dar um tratamento de obra de arte aos produtos”, acredita Cyril Pigot-Kesller, da Artcurial. Desde 2006, a casa preserva um setor de acessórios – e apenas os assinados pela Hermès. “É a única a manter intacta a tradição do ‘savoir faireí francês.” Nos três leilões anuais, que movimentam 4 milhões de euros, a Artcurial oferece lenços, canetas, relógios, abotoaduras, joias, sapatos, equipamentos de equitação, roupas e bolsas.
As mais caras são Kelly – batizada assim em 1956, depois de a princesa Grace Kelly ser registrada por paparazzi escondendo a barriga de grávida com o modelo – e Birkin – homenagem nos anos 1980 à intérprete inglesa Jane Birkin. Ambas são fabricadas em cores variadas e com diversos tipos de couro – crocodilo é o top. O material utilizado no fecho (platina, ouro ou paládio) também determina o preço. Estampas e incrustações de pedras preciosas são outros elementos que alimentam o apetite dos compradores. “Ter um modelo desses em casa é como possuir uma joia, uma obra de arte ou uma Ferrari. Ninguém sai por aí exibindo o carro o tempo todo, mas sabe quão bom investimento ele representa”, diz Pigot- Kesller. Nem só objetos de status clássicos do visual feminino movem os lances. “Há algo nos detalhes das pedras incrustadas nos artigos da marca americana Judith Leiber que os põem na categoria de joias, e não de item funcional”, acredita Caitlin, da Christieís. Entre os modelos de boa cotação encontram-se as carteiras e peças colecionáveis (artigos extravagantes, que viram objetos de design, como as bolsas-bambolê) da Chanel e edições limitadas de Louis Vuitton, como as malas rígidas feitas em Asnières. Peças recentes, caso da YSL ou da Bottega Veneta, com cifras bem mais modestas, estão na mira. “Basta adquirir o status de incomum para que os clientes queiram tê-la em sua coleção.”