Eloy Casagrande, 33, é o novo baterista do Slipknot. O músico paulista, que fez parte da lendária banda brasileira Sepultura nos últimos doze anos, foi anunciado oficialmente membro do grupo americano de metal no último dia 30.
Este é mais um capítulo grandioso em uma carreira meteórica, que beira o “impensável” — palavra usada por Eloy na postagem que confirma a novidade. Nascido em Santo André, Casagrande começou a tocar bateria aos sete anos. Logo venceu concursos no Brasil e no exterior, tocou em projetos como Mr. Ego, Aclla, Andre Matos, Iahweh, 2ois! e Gloria, e, aos vinte, entrou para a maior banda brasileira de heavy metal.
Ao lado de Andreas Kisser, Derrick Green e Paulo Jr, lançou três discos de estúdio e rodou o mundo em turnês. Agora, começa um novo desafio, ao lado de oito novos colegas mascarados.
O Slipknot é uma das bandas de metal mais conhecidas no mundo, fundada nos Estados Unidos, em 1995, e marcada pelo uso de máscaras e pela extensa lista de membros. Com Eloy, são nove integrantes: Corey Taylor, Shawn “Clown” Crahan, Mick Thomson, Alessandro Venturella, Jim Root, Sid Wilson e Michael Pfaff — o último membro atual não foi anunciado oficialmente.
De São Paulo, onde continua a morar entre os compromissos da banda, Eloy conversou com a Vejinha sobre a nova fase. Saiba mais dos bastidores da negociação, a saída do Sepultura e a nova rotina do baterista a seguir.
Eloy, para começar: como e quando começaram as conversas com o Slipknot?
O convite surgiu em dezembro, através do empresário (deles). Ele perguntou se eu tinha interesse em fazer, primeiramente, uma audição. Eu aceitei. Eles me pediram para gravar e enviar alguns vídeos aqui mesmo, do Brasil. Inicialmente foram três músicas, depois me pediram mais três, e perguntaram se eu tinha algum plano de ir para os Estados Unidos, e eu tinha uma apresentação marcada lá em janeiro, com o meu projeto de música instrumental, Casagrande & Hanysz. Então eles adiantaram um pouco o meu voo, e fiquei cinco dias em Palm Springs, ensaiando com a banda completa. Depois eles me pediram para estender a estadia em mais cinco dias, para a gente gravar algumas coisas. Acho que isso também fazia parte dessa audição, eles jogavam ideias novas para mim, para ver como era a minha composição. Eles queriam me testar em todos os sentidos.
Depois desses dez dias de ensaios e gravações, quando você recebeu a confirmação que havia entrado na banda?
O Slipknot é formado por nove músicos, então são várias esferas e camadas, e eles precisavam da aprovação de todos até dar o OK para mim. Acho que foi no dia 5, 6 de fevereiro que recebi a confirmação que eu tinha passado no teste.
Esse período de audição foi desafiador para você?
Em um primeiro momento, eles não explicaram o que a gente faria. Foi tudo meio que no escuro. A primeira coisa que eles enviaram foi um documento de confidencialidade, pelo qual eu não poderia comentar isso com ninguém. Fui aprendendo o repertório, me preparando, e, faltando quatro dias para a viagem, eles mandaram uma lista de 32 músicas que seria importante eu saber. Muitas das que eu estava aprendendo não estavam nessa lista, então comecei a correr atrás das partituras. Quando cheguei lá (nos Estados Unidos), eles me passaram um setlist no primeiro dia, que tinha algumas músicas que eu também não sabia, mas a gente saiu tocando. No primeiro dia, eu estava com um nervosismo absurdo, porque a banda estava completa, e é bem impactante ver os caras ali na sua frente. Uma banda que eu escuto desde a adolescência, e acompanhava na televisão. No primeiro dia eu fui péssimo, não gostei da minha performance, mas a partir do segundo dia eu fui melhorando. A cada dia eles passavam um setlist diferente, pela manhã, então eu tinha algumas horas para aprender uma música ou outra que faltava. De forma geral, foi muito tranquilo. Eu tive o apoio de todos.
“A banda iria acabar, e eu não queria parar de tocar bateria aos 33 anos de idade”
E como foi esse contato com os demais integrantes?
Eles foram muito respeitosos e tranquilos, porque sabiam que aquela posição em que eu estava era um lugar estressante. Então eles respeitaram o meu tempo, e agora, depois de alguns shows, estou muito mais tranquilo e confortável. Também não é fácil encaixar nove músicos tocando juntos, é como uma orquestra. Cada pessoa toca de uma forma diferente, então levou um tempo até eu entender como a banda funcionava e eles entenderem como eu funciono. A gente está muito feliz para fazer os próximos shows.
Nesse meio tempo, como você conciliou esses testes com a preparação para a turnê final do Sepultura?
Eu recebi o convite para fazer o teste depois do anúncio da turnê. O grande lance, da razão de eu ter aceitado fazer a audição, foi o final do Sepultura. A banda iria acabar, e eu não queria parar de tocar bateria aos 33 anos de idade. Rolou um papo com o Slipknot, perguntei sobre a agenda deles, se daria para conciliar as duas bandas, mas eles falaram que não, não teria como, eu seria exclusivo. Então foi uma decisão minha, pelo término do Sepultura. Foi complicado, eu comuniquei eles quando tinha fechado o acordo, no dia 5 ou 6 de fevereiro. Logo nesse dia eu convoquei uma reunião e expliquei a situação. Foi isso, uma decisão individual.
Você entrou no Sepultura com vinte e poucos anos, e agora deixa o grupo com trinta e poucos. Olhando para trás, qual o saldo que você leva?
Foi um aprendizado gigantesco. Foram muitos anos, três álbuns de estúdio. Álbuns ao vivo. Muita composição. Muito tempo que a gente viajou junto. Olho para trás com um grande carinho e muita admiração. Além de um sentimento de muita gratidão, por todos esses anos. Por eles terem, naquela época, acolhido um baterista de vinte anos, dando uma grande responsabilidade na mão de uma criança. Mas eu sempre me preparei para isso, e acredito que amadureci muito. Viajando também, conhecendo diferentes etnias. A gente foi para cerca de setenta, oitenta países. Tocamos na Mongólia, Chipre, Cazaquistão, Quirguistão, Uzbequistão, China, Rússia, Ucrânia. Foi, com certeza, a maior escola da minha vida.
Como foi o preparo para o seu primeiro show com o Slipknot?
Rolou toda uma preparação, da velocidade das músicas, as pausas, quando você pode tomar água. O que é muito interessante é que é ensaiado, mas a gente tem liberdade para mudar o que quiser. Essas são as músicas, você toca elas, mas você pode sempre mudar e improvisar, desde que não derrube a banda. E isso é algo que eu sempre priorizei na minha vida: a liberdade musical. Tive liberdade no Sepultura, e continuo tendo no Slipknot. Dia 25 de abril era a data do primeiro show. Eu estava muito nervoso, e tive a sorte da minha esposa ir comigo. Mas eu estava completamente apagado, não conseguia nem me comunicar direito. O momento que eu coloquei a roupa, fiz a maquiagem e vesti a máscara, foi muito emocionante. Nesse momento, fui tranquilizando.
Você se sentiu tranquilo no palco?
Foi um show menor, e acabei tocando mais forte do que o normal. Quebrei dez, quinze baquetas. Eu estava tocando forte pela adrenalina, pelo nervosismo e pela felicidade de estar ali. Tive alguns problemas técnicos, também, que ninguém sabe. Na quarta, quinta música, a proteção do bumbo se soltou. Esse adesivo de Kevlar caiu, e a cola residual continuou na pele. Então, quando eu tocava, o batedor grudava e não soltava. A gente tentou trocar, mas ele caiu de novo. Tive de pegar terra do chão e jogar no adesivo, assim ele parou de grudar. Que loucura, é a vida real (risos). Fiquei um pouco frustrado, gostaria de ter tocado mais à vontade, mas estreias, para mim, nunca foram muito boas. Desde o André Matos, o Sepultura. Essa foi até tranquila, para a situação.
Tocar de máscara e maquiagem, trouxe alguma mudança para você?
A primeira grande mudança, ao usar uma máscara, é mental. É uma outra persona que está ali. A máscara tem vida. Se alguma outra pessoa colocar ela, não vai ser a mesma coisa. Criei ela juntamente com o Shawn, fomos elaborando o design juntos, então é uma junção do Slipknot com a minha personalidade. Só que, quando você veste a máscara, acontece algo diferente. Não sei explicar ainda. E a questão física de tocar é tranquila, eu pensei que seria pior. É claro que ela esquenta, porque é cheia de espuma, então fico muito suado. Mas tem um espaço bom para respirar. Antes da primeira apresentação, eu já estava ensaiando com uma máscara feita para atletas, que simula altitude. Ela tem várias válvulas, e tampa o nariz e a boca, restringindo a respiração. Isso me ajudou a tocar mais tranquilo.
Eloy, como o metal entrou para o seu repertório?
Dos meus sete anos até os onze, eu só tocava música brasileira. Fui iniciado na bateria através do samba, do baião, meu primeiro professor era especialista em samba, e o meu segundo tocava com o Tom Zé. Aos doze, veio o rock mais clássico — acho que minhas primeiras grandes influências foram Black Sabbath, Deep Purple, Led Zeppelin e Van Halen. O metal veio um pouco depois, quando eu tinha treze, quatorze anos, com Metallica, Angra, o próprio Sepultura e o Slipknot.
Seu início no metal significou também uma outra demanda física no instrumento?
Lembro que, quando entrei para a banda do André Matos (ex-vocalista das bandas Viper, Angra e Shaman, morto em 2019), eu tocava metal há pouco tempo. No primeiro show, com dezesseis anos, lembro que pela metade eu não estava mais conseguindo raciocinar. Completamente exaurido, os braços doendo. Não tinha preparo físico, porque é técnica, mas também é força. Você tem que ter a resistência muscular para ter longevidade na sua técnica. Esse dia foi um choque para mim, e comecei a me preparar, fazer academia, musculação, corrida. Aprendi a me comportar no palco, administrar a minha energia, não entregar tudo nas primeiras músicas. Nessa idade, tive vários problemas de tendinite nos punhos e cotovelos. Depois de começar na academia, nunca mais tive problemas.
Desde o seu anúncio no Slipknot, vídeos de você criança, no programa do Faustão, voltaram a circular pela internet. A música surgiu como um caminho profissional muito cedo na sua vida?
Aconteceu de uma forma bem precoce. Comecei a tocar profissionalmente com quinze, dezesseis anos. Foi uma escolha, mas também nem tanto. Quando terminei o terceiro colegial, veio aquela ideia: “O que fazer agora?”. E tive uma crise financeira na minha família, meus pais se separaram. Não que tenha surgido uma pressão para fazer dinheiro e trabalhar, mas eu mesmo vi que era necessário. O que eu pudesse ajudar seria muito bem-vindo em casa. Tocava em diferentes bandas, comecei a fazer faculdade de produção musical e a me especializar como baterista de estúdio. Gravei muita coisa de música sertaneja. Juntava todo o dinheiro e colocava em casa. Nunca busquei música pensando em ficar rico, você escolhe a música para ter o prazer de fazer o que gosta, e se expressar. O músico tem que sempre estar com uma necessidade, senão a chama apaga. Seja uma necessidade financeira, espiritual, de expressão. E, naquele momento, a minha necessidade vinha de todos os lados.
O seu anúncio oficial no Instagram do Slipknot foi um sucesso. Como você lida com toda essa repercussão?
Quando vi o post, não acreditei. Eu estava com a minha esposa, e não sabia, e nem sei exatamente porque aconteceu. Talvez um pouco pela pressão do povo brasileiro, que estava inundando os comentários. Acho que eles pensaram o seguinte: “Pô, já que as pessoas estão pedindo tanto e não param de comentar sobre isso, vamos dançar conforme a dança” (risos). Foi inacreditável, uma emoção muito grande. E os fãs brasileiros são maravilhosos, cara. Não consigo mais acompanhar as minhas redes sociais. Sou só eu, por enquanto, administrando tudo. Tenho uma pessoa que me ajuda a responder os e-mails profissionais, e a assessoria de imprensa da banda tem me ajudado. Mas as redes sociais foi um negócio que eu abandonei, porque recebi muita mensagem e muito apoio. Me senti realmente abraçado. E podem ir lá, comentar mais, estou adorando. Não poderia ser mais grato ao povo brasileiro.
Qual a sua visão sobre a influência do Sepultura e do Slipknot para o metal?
É difícil imaginar o metal como um todo sem as duas bandas, acho que teria uma lacuna. O Slipknot teve uma influência do Sepultura, eles falam isso abertamente em entrevistas e tudo mais. Quando fiz o teste, conversei com o Shawn, e ele disse que, quando estavam lançando o primeiro disco, era através da mesma gravadora do Sepultura. Na época, ele foi a um show deles, e lá estavam distribuindo o primeiro single do Slipknot. Então as bandas têm uma história interligada. A gente já fez shows juntos no passado, acredito que no futuro também vão rolar outros. Esse debate sobre quem vem primeiro, quem vem depois, o ovo ou a galinha, acho que é meio inútil. A gente tem que aproveitar o que cada músico e banda oferece, entender o cenário e respeitar a história de cada.
Após sua saída do Sepultura, a banda anunciou o Greyson Nekrutman como baterista. Ele chegou a entrar em contato com você, para pedir algum conselho?
Mandei uma mensagem para ele, a gente conversou brevemente, desejei sucesso. Eu já tinha o conhecido em janeiro. Quando fiquei sabendo que seria ele, mandei uma mensagem, desejei boa sorte. E ele também, agora, quando fui anunciado, escreveu para mim. Isso que é legal, a gente ter essa união, pelo menos no mundo “baterístico”. Tenho amizade com o Jean Dolabella, um grande amigo que passou pelo Sepultura, falo com o Greyson. Quando o Jay Weinberg, que estava tocando com o Slipknot até eu entrar, veio ao Brasil, a gente saiu para almoçar. Nós mantemos essas amizades, e só desejo boa sorte para todo mundo.
O que você já pode falar de projetos futuros com o Slipknot?
Estou tentando entender ainda como que funciona a dinâmica da banda, ainda não ficou tão claro como que funcionam as coisas em relação a disco e músicas novas. Nós escrevemos algumas coisas, e elas estão, por enquanto, engavetadas. No dia 12, temos um show, e vamos ficar alguns dias lá, trocando algumas ideias musicais. Por enquanto, acredito que não tenha nenhuma pressão para gravar material novo. Mas tenho certeza que eles querem fazer, não sei para quando, porque agora a banda está focada em celebrar seus 25 anos.