“No trap é assim mesmo: a gente não mostra a cara e não conversa muito”, diz o produtor Alex Ribeiro, 30, um dos três fundadores do Cena Festival, ao lado do empresário Gabriel Romano, 28, e do artista Jé Santiago, 30.
Mas os óculos escuros, bonés e capuzes não escondem a empolgação quando o papo é sobre o maior festival de rap e trap do país, que acontece pela terceira vez em São Paulo, nos dias 9 e 10.
É incomum que um evento inédito se torne tão popular em um espaço de tempo tão curto. Em 2019, na edição de estreia, 15 000 pessoas compareceram ao Sambódromo do Anhembi, em dia único — em 2022, esse número saltou para mais de 100 000, ao longo de três noites.
“Vejo o Cena como o último estágio. Primeiro trouxemos o trap para o Brasil, popularizamos o jeito de falar e se vestir, e o auge disso tudo é a celebração dessa cena”, conta Jé, ex-integrante do coletivo Recayd Mob que agora traça caminho próprio também nos bastidores da música.
“Em 2018, fui no festival de rap Wireless, em Londres. Não tinha nada parecido no Brasil. Quando voltei, o Gabriel (Romano) entrou em contato com a ideia de criar um festival, e falei que tinha acabado de ver quarenta shows de trap”, conta o músico, que convidou Alex, seu parceiro desde os tempos da escola, para completar o trio. “Nós dois fomos criados em Diadema, e o Gabriel é de Peruíbe. A gente nunca teve acesso a esses eventos. Vimos a necessidade de criar um projeto para pessoas iguais a nós, com valor acessível. Ninguém estava se posicionando assim no mercado naquele momento”, diz Alex.
Neste ano, o festival acontecerá pela primeira vez na Neo Química Arena. “A gente queria fazer no Anhembi, como nas duas outras edições, mas não conseguimos. Quase não fizemos o festival por não termos um espaço”, conta Jé.
No line-up, a marca do Cena é trazer grandes nomes que ficam fora do radar de megafestivais — desta vez, os destaques são os rappers americanos Don Toliver, Kodak Black e Sheck Wes.
“Tem duas coisas que nós não abrimos mão de fazer: identidade visual e curadoria. Assim, não perdemos a legitimidade, e também realizamos o objetivo de conectar a cena brasileira com a internacional”, explica Alex. “Trazemos os artistas mais quentes do momento, esse é o nosso diferencial. Resolvemos arriscar e estamos conseguindo acompanhar a cena lá de fora, hoje temos bom relacionamento com as agências gringas e os empresários dos artistas”, diz Jé.
Para a dupla, o Cena é um projeto a longo prazo, apesar dos empecilhos do mercado — em 2022, o festival tomou um “prejuízo milionário” ao ser adiado por conta do Carnaval pós-pandemia, e, neste ano, a edição anunciada em Salvador foi postergada “por questões de logística e produção”.
Para além dos shows, em agosto, foi anunciada a criação do selo TrapHits, parceria do festival com a gravadora Universal Music que irá lançar projetos de artistas nacionais. “O gênero do trap está crescendo muito, e grande parte desse público tem 12, 13 anos. Daqui a alguns anos, o negócio vai estar mais quente ainda”, diz Alex.
“O Cena anda muito com a cena nacional — se ela cresce, o festival também. O nosso objetivo é fortalecer em São Paulo, tentar outras praças e quem sabe levar o festival para fora do país. O Brasil é um polo do rap mundial, estamos só atrás dos Estados Unidos. Nossa cena pode dominar tudo”, diz Jé.
Neo Química Arena. Avenida Miguel Ignácio Curi, 111, Itaquera. ♿ Sáb. (9) e Dom. (10), a partir das 10h. R$ 345,00 a R$1 249,50. 16 anos. @cenafestival.
Publicado em VEJA São Paulo de 1 de dezembro de 2023, edição nº 2870