Quando o arquiteto alemão Franz Heep chegou a São Paulo, no fim de 1947, seu currículo impressionava. Já havia trabalhado três anos com o mestre franco-suíço Le Corbusier, em Paris, e desenvolvido projetos habitacionais em Frankfurt, na Alemanha, com alguns de seus mentores, egressos da mítica escola de design Bauhaus.
O imigrante fez bonito na arquitetura local. Em pouco mais de uma década, ele projetou a sede do jornal O Estado de S. Paulo, que também abrigava o Hotel Jaraguá; a Igreja de São Domingos, em Perdizes; e mais de trinta prédios residenciais e de escritórios — entre eles o Edifício Itália, com o construtor Otto Meinberg, sua obra mais famosa.
O livro Heep — Um Arquiteto Moderno (Monolito, 304 páginas, 159 reais), do professor do Mackenzie Marcelo Barbosa, traz a história desse arquiteto, ainda injustamente desconhecido. Mas seu traço é marcante: das venezianas de alumínio pintadas de vermelho, verde e branco do Edifício Lausanne, na Avenida Higienópolis, às jardineiras dependuradas na fachada do Arlinda, no Largo do Arouche, ele demonstra detalhamento e apuro técnico, conseguindo destacar seus prédios na massa bege paulistana.
Além de dezenas de fotos, tanto históricas quanto atuais, estas clicadas por Ana Mello, e de plantas de diversos apartamentos, o livro esmiúça a história sofrida de Heep.
Quando se mudou para Paris, o católico alemão se casou com a judia checa Marie e se tornou sócio do polonês Jean Ginsberg, com quem projetou edifícios residenciais. Após a ocupação nazista, Heep, a mulher e a filha, Elisabeth, com 3 anos, refugiaram-se em San Sebastián, no País Basco. Com a ascensão do franquismo, a família volta para Paris e trabalha na clandestinidade.
Em 1944, o casal é preso. Marie é enviada ao campo de concentração de Drancy, e Heep é forçado a colaborar com os nazistas. Ambos escapam do cativeiro e decidem que a Europa não é mais o lar desejado.
No Brasil, porém, ele ficaria mais de dez anos sem assinar a autoria de seus projetos. À burocracia local, em tempos de políticas anti-imigração, somava-se a dificuldade de reaver o diploma, pois sua faculdade fora bombardeada na guerra. Nem uma carta assinada por Le Corbusier, em 1952, atestando o notório saber de Heep, adiantou. O registro só saiu em 1958.
Nos anos 60, entre a crise econômica provocada pelos anos Juscelino, o colapso do mercado imobiliário e a ditadura militar, o trabalho para o alemão escasseou de vez. Doente, Heep voltaria para Paris em 1977. Seis meses depois, morreria ali, aos 75 anos.