No dia 30 de março de 1974, aconteceu no Anhembi, na Zona Norte da capital paulista, o que é considerado o primeiro grande show internacional de rock do Brasil. A data completa 50 anos neste sábado (30).
O pioneiro foi o norte-americano Alice Cooper. Ele fez três apresentações na capital paulista e outras duas no Rio de Janeiro, mas a primeira noite foi a mais emblemática. O roqueiro levou uma multidão ao Salão de Exposições do Anhembi, que aproveitou o ingresso mais barato da primeira apresentação. As outras foram mais caras e não tiveram tanto público.
“O primeiro show foi mais barato, os outros foram quase o dobro do preço. Dizem que teve 180 mil pessoas. Eu duvido, mas pelo menos metade tinha”, diz Maurício Sarro, que esteve presente no show emblemático.
O historiador Daniel Sevillano, que fez seu doutorado na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) sobre o rock brasileiro nos anos 1980, explica que é difícil cravar quanto de público estava presente no local. “Não tinha essa visão numérica de participantes de show, até porque não tinha eventos desse tamanho”, diz.
Ele afirma que o show foi importante para mostrar que era possível um investimento dessa magnitude no país. “Naquela época, o Brasil não fazia parte da rota de shows desses artistas internacionais. Tinha a questão da distância, a incerteza se o show daria retorno financeiro e o fato da maioria dos países da América Latina estarem sob Ditaduras Militares no período”, diz.
Para Sarro, foi uma aventura. Ele saiu de Pirajuí, cidade de pouco mais de 20 mil habitantes a 380 km da capital paulista, acompanhado de um grupo de amigos e chegou de ônibus na manhã do dia 30. “Foi num dia de semana. Gastei todo o meu dinheiro nessa viagem. Ficamos lá esperando no sol o dia inteiro. Quando acabou o show eu estava exausto”, conta.
Na época, ele tinha 19 anos e nunca havia viajado sem os pais, mas afirma que a aventura valeu a pena para ver o primeiro show de rock de sua vida. Entre as memórias que se destacam, estão a hora de entrada do público no espaço – que Sarro afirma ter sido ao som do álbum The Dark Side of the Moon, da banda britânica Pink Floyd –, o momento em que o astro tocou sua música favorita, School’s Out, e quando quase foi pisoteado pela multidão, pois, assim que o show começou, o público que estava atrás tentou ir para frente à força.
“Teve a primeira música. Na segunda começou o empurra-empurra. Eu estava quase no olho do furacão e caí. Uma pessoa me deu a mão para levantar. A banda parou, entrou alguém falando português, não lembro o que foi dito mas o público acalmou. Aí eu pude aproveitar o show. Passou o medo que senti de que iam me pisotear”, diz.
Passada a confusão, Sarro conta que parte do público até sentou e a apresentação do músico conhecido por suas performances chocantes, com decapitação de bonecas, choques e guilhotina, seguiu como o esperado. “ Às 23h pegamos o ônibus de volta para casa. No outro dia, dormi até duas da tarde. E aí continuou minha vida”, reflete.
O historiador Sevillano ressalta que a vinda de Alice Cooper ao Brasil em 1974 é marcante não só por ser pioneira, mas também pelo contexto de Ditadura em que o Brasil vivia. “Ele poderia vir mas não poderia falar de política. Mas a própria apresentação dele tem um sentido político por estar ali como algo contestatório. Era um sopro de liberdade para um país que estava asfixiado pelo pior período da Ditadura”, conclui.