Alex Garland sobre ‘Tempo de Guerra’: “Fazer cinema é político”
Filme com sequência realista da Guerra no Iraque pode “desencorajar pessoas a se juntarem ao exército”; confira entrevista com diretores e elenco

O veterano de guerra Ray Mendoza e o cineasta Alex Garland juntaram-se com o objetivo de criar “o filme de guerra mais realista de todos os tempos”. A partir das memórias do ex-fuzileiro na Guerra do Iraque, nasceu Tempo de Guerra.
O longa acompanha uma missão de um pelotão de Seals, tropa de elite da Marinha Americana, que termina em caos. O diretor e seus colegas do exército são vividos por um elenco de novos talentos, formado por Cosmo Jarvis, Kit Connor, Will Poulter, D’Pharaoh Woon-A-Tai, Joseph Quinn, Charles Melton, entre outros.
Os atores reencenam uma invasão a uma casa no território inimigo, que é interrompida quando os jovens entram na mira do grupo terrorista Al-Qaeda. Então, tentam escapar do local em meio a um contra-ataque.
Exceto por uma cena de abertura, com um momento de integração da equipe, todo o filme se passa naquela tarde de 2006, que mudou as vidas dos soldados ali presentes para sempre.
Reconstruir o passo a passo de um evento tão traumático não é uma tarefa fácil. É de se esperar que cada um ali sentisse dificuldade de falar sobre o assunto e contar o que aconteceu ou que até mesmo as memórias tivessem sido afetadas pelo trauma.
A arte e o cinema surgem como ferramenta para guiar o caminho. “Este filme foi como terapia e recuperação da jornada de uma vida inteira”, conta Ray Mendoza, em entrevista a Vejinha. “Estou bem mais ciente dos meus gatilhos. Sinto que um grande capítulo da minha vida foi fechado.”

Will Poulter, que interpreta Erik, ficou interessado pelo projeto justamente por mostrar a realidade e “quebrar com as convenções de como a guerra é representada em Hollywood”. “Há uma tendência de glorificar ou romantizar as ações nesses espaços, e eu estava animado para fazer parte de um projeto que fosse contra a corrente”, afirma.
Além da proposta de um filme de guerra realista, outro motivo para a realização foi remontar os acontecimentos daquele dia, pois Elliot (interpretado por Cosmo Jarvis) não se lembrava.
Nos preparativos para o papel, o elenco passou por um rigoroso treinamento do exército, ao longo de três semanas antes das filmagens, e teve contato com as pessoas reais que estavam interpretando. “Eles nos davam informações com bastante entusiasmo para nos ajudar com a veracidade da representação. Criou um acordo recíproco entre nós e eles”, comenta Cosmo Jarvis.

Kit Connor acrescenta: “Eu aprendi muito com ele [Tommy, quem interpretou] mas os colegas também me trouxeram vários insights sobre como ele era como pessoa e como reagia à cada situação”. Para britânico, famoso pelo papel na série Heartstopper, o grande aprendizado, como ator e espectador, foi um melhor entendimento do que “realmente significa estar em um campo de guerra”.
O mesmo vale para Alex Garland: “Entendi a complexidade da experiência na guerra e me deu um senso maior de empatia”.
Os diretores explicam que o filme não mostra o conflito de forma mais ampla por se tratar da perspectiva em primeira pessoa de Mendoza e seus colegas, mas que isso não tira a força da pesquisa e do teor político do projeto. “Fazer um filme é político. A ideia de que apresentar uma sequência real de eventos de guerra é apolítico é um erro, não se trata só de esquerda ou direita”, diz Garland.
“O filme abre a conversa sobre o que aconteceu no Iraque”, define D’Pharaoh Woon-A-Tai, que interpreta Ray Mendoza. “Não tem um viés, é mais uma transcrição do que aconteceu. Não estou me afastando do ativismo, é uma conversa importante. Nós não glorificamos nada, não fizemos nada parecer descolado. Na minha opinião pessoal, este filme pode não querer que as pessoas se juntem ao exército”, conclui o ator.
Publicado em VEJA São Paulo de 11 de abril de 2025, edição nº 2939