‘Grande Sertão’ traz obra de Guimarães Rosa para a contemporaneidade
Filme dirigido por Guel Arraes apresenta realidade nas periferias das grandes cidades do país, com linguagem poética original
✪✪✪ Dirigido por Guel Arraes, Grande Sertão traduz a obra-prima de João Guimarães Rosa de 1956 para o cinema. Mais do que uma adaptação, trata-se de uma reinterpretação do enredo aos novos tempos. O cenário do sertão nordestino dá lugar a uma paisagem urbana distópica em um futuro não tão distante. A atmosfera, construída com maestria pela direção de arte de Valdy Lopes, é apocalíptica.
Aos poucos, o espectador percebe que se trata de uma realidade semelhante à atual, quando uma criança se torna vítima de uma bala perdida e sua mãe lamenta e se revolta com a situação. A ideia do diretor foi criar uma comunidade da periferia chamada “Grande Sertão”, onde policiais e bandidos se confrontam, para abordar a vida nas favelas por meio da ficção.
É nesse cenário de guerra urbana que Riobaldo (Caio Blat) e Diadorim (Luisa Arraes) buscam a sobrevivência e as respostas para perguntas sobre a vida e o amor. Atualizar a narrativa para os dias de hoje foi uma escolha acertada. O filme conversa com a nova geração sem perder a linguagem poética da obra original, com roteiro assinado pelo diretor e Jorge Furtado.
A trama segue um ritmo acelerado e foca no arco da aventura épica e da história de amor. A narração de Riobaldo, bem executada por Blat, foi mantida como base. Eduardo Sterblitch também brilha como Hermógenes, com caracterização e figurino caprichados.
Guel obtém sucesso com o projeto, que durou cinco anos. Não à toa, recebeu o prêmio de direção em sua primeira exibição, no Tallinn Black Nights Film Festival, na Estônia, em novembro de 2023.
Publicado em VEJA São Paulo de 7 de junho de 2024, edição nº 2896