Desde que comecei a minha jornada no vedanta, a percepção que tenho sobre a felicidade e o autoconhecimento mudou radicalmente. Assim como praticamente todos nós, cresci em um ambiente onde a definição do que é ser feliz está associada a uma recompensa externa, ligada a realizações materiais ou status.
É nesse sentido que essa cultura milenar indiana abriu meus olhos para uma verdade mais profunda: esse sentimento, na verdade, é um estado do ser. Ou seja, não se trata de algo simplesmente que se opõe à tristeza, em que objetos ou situações podem fazer uma pessoa transitar entre dois estados de espírito fechados. Consequentemente, também vai além dos papéis que desempenhamos na sociedade e do que essas “funções” têm a nos oferecer.
Vamos pegar um exemplo simples para esclarecer a ideia: imagine indivíduos que estão compartilhando o mesmo espaço e circunstâncias. Eles vivem o mesmo momento, mas não necessariamente possuem emoções parecidas. Isso mostra que a felicidade verdadeira vem de dentro, de um entendimento mais profundo sobre quem realmente somos.
Quando alcançamos esse equilíbrio mental e espiritual passamos a ser livres para experienciar todas as emoções, mas sem nos sentir aprisionados por elas. Inclusive, é uma forma de combatermos a famosa síndrome do impostor, que muitos de nós experimentamos ao duvidar de nossas conquistas ou capacidades.
O vedanta ensina que essas limitações autoimpostas são apenas ilusões. Na verdade, quando compreendemos que a felicidade é a nossa natureza essencial, as circunstâncias da vida se tornam secundárias e passamos a ter mais consciência de cada passo que queremos dar em direção ao bem-estar pessoal.
É um cenário em que há uma visão clara dos nossos valores, metas e prioridades. E, a partir do momento que cultivamos uma motivação própria para lidar com situações estressantes e de pressão, por exemplo, as decisões tomadas tornam-se menos impulsivas. Assim, a pessoa consegue estabelecer um alicerce sólido do que ela precisa aprimorar dentro de si para evitar arrependimentos e garantir a sua plenitude.
Além disso, a cultura védica se caracteriza por sua universalidade e relevância incondicional. Ela não se dirige exclusivamente a monges em busca de iluminação ou empresários em busca de paz interior. É um chamado para todos que estão dispostos a questionar e, talvez, abandonar temporariamente seus papéis sociais em busca de algo real.
A beleza dessa sabedoria está na liberdade que ela oferece: a liberdade de nos despirmos de identidades limitadas e, quando estivermos prontos, vesti-las novamente, mas com a plena consciência de que somos, em essência, seres de pura felicidade.
Refletindo sobre minha própria história, percebo que o maior presente que o vedanta me deu foi a clareza de que, não importa quão turbulenta possa ser a superfície da vida, há sempre uma via de como ser feliz dentro de cada um de nós, esperando para ser reconhecida e percorrida plenamente.
Independentemente dos altos e baixos de rotinas corridas, essa é uma perspectiva livre de sofrimento e disponível para todos, a qualquer momento das suas histórias.
A curadoria dos autores convidados para esta seção é feita por Helena Galante. Para sugerir um tema ou autor, escreva para hgalante@abril.com.br.
Publicado em VEJA São Paulo de 1º de março de 2024, edição nº 2.882.