Não me afogue exigindo sorrisos de mentira.
Não me afague furtando minha humanidade.
A lágrima também é meu contato com a vida.
Ponte do meu mundo com o mundo.
Preciso dela para não enlouquecer.
Para não ir com a enxurrada de sorrisos viciosos.
+ Quebrando “barreiras mentais” na corrida de rua
Confiemos no tempo.
Alguma escura melancolia é portal que me abre
o país de dentro. Para que tanta luz o tempo todo?
É quando o sol da festa se despede que vem a noite
benfazeja de diversos reencontros.
Revejo fraquezas, abraço incongruências, converso
com minhas feridas, reforço compromissos com mudanças.
Sou desses que gostam da caverna assim como louvam
o amanhecer. Tudo faz parte do meu hoje e do meu porvir.
Se me vir sorrindo, portanto, saiba que é de verdade.
Alegria alimenta, festa aquece, gargalhadas curam. Isso é parte de quem sou.
Mas me deixe quieto quando os cantos da minha boca
apontarem para baixo. Eles também apontam para dentro.
Essa é outra parte de quem sou, igualmente importante.
+ Ansiedade, uma condição do viver humano
Pelo meu bem talvez você queira ver algo mágico acontecer. Você
prestidigitaria com palavras ou gestos as minhas emoções. Em segundos meus
olhos ganhariam brilho, meu rosário dos dentes brilharia e eu sairia a cantar.
Louvável intenção, ação bonita carregada de carinho,
mas que pode ser puro desrespeito.
Talvez, também pelo meu bem, deixe comigo essa tristeza.
Se quiser me ajudar, basta ficar ao meu lado. Ou não.
Seu silêncio será benfazejo. Ou me dê de presente
sua ausência. Ela pode ser salvadora.
Só peço paciência. Que consiga contemplar minha paisagem
numa estação sem flores — antes de agir com impulsos piedosos.
+ Será que a idade é um fator importante para a felicidade?
Ofereça acolhimento quando meu olhar molhado
pedir passagem para o horizonte.
Creia: lágrimas podem ser amigas.
Qual o tempo certo de voltar a sorrir?
Por quanto tempo alguém precisa chorar?
Deixe de lado a arrogância de saber.
Em vez de violentar minha ampulheta, tenha
paciência para, simplesmente, ver a areia cair.
A curadoria dos autores convidados para esta seção é feita por Helena Galante. Para sugerir um tema ou autor, escreva para hgalante@abril.com.br
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Publicado em VEJA São Paulo de 7 de setembro de 2022, edição nº 2805