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Onde há conflito, podemos mediar

Gelson Liberman, mediador judicial e extrajudicial, destaca que os conflitos e desentendimentos são inevitáveis e ensina que é possível lidar com eles

Por Gelson Liberman, em depoimento a Helena Galante
Atualizado em 29 abr 2022, 11h24 - Publicado em 29 abr 2022, 06h00
Duas pessoas distantes, separadas por um vão
Distância (Getty Images/Reprodução)
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Descobri a profissão de mediador de conflitos por meio dos acontecimentos da vida. O “nada é por acaso” funcionou bem comigo. Passei por um divórcio litigioso por praticamente um ano e meio. Filhos pequenos e o término de um relacionamento de praticamente dezesseis anos. Como num instinto automático, fui procurar um ótimo advogado em busca da vitória.

+ A fuga

Naquela oportunidade, achava que o juiz daria uma sentença justa para o meu caso. A cada dia daquela separação via um distanciamento entre o que acreditava e a realidade dos fatos. Audiências e mais audiências que não chegavam a lugar nenhum e, junto com tudo isso, um turbilhão de acontecimentos que não acompanhavam o trâmite jurídico. Como passar por aquele conflito sem prejudicar os meus filhos?

Anos mais tarde acabei conhecendo uma mediadora que achou que eu levava jeito para ser mediador. O curso seria uma parte no Brasil e outra na Argentina. Uma ótima oportunidade para aprender mediação e viajar. Além disso, a data coincidia com a meia maratona de Buenos Aires (tenho a corrida como hobby). Foram duas semanas que me transformaram. A cada aula, a certeza que estava no lugar certo e na hora certa.

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A vontade de ser mediador era tão grande que após o curso já estava trabalhando. Uma das companheiras de aprendizado trabalhava no fórum em que fiz o meu divórcio e me ofereceu a sua vaga para trabalhar lá, pois estava saindo. A sensação de estar no mesmo local onde passei as minhas audiências e poder ajudar as pessoas numa outra perspectiva foi incrível. Comecei as primeiras sessões com aquele frio na barriga. Que responsabilidade, pensei. Nos primeiros encontros fiquei junto de mediadores mais experientes e aprendendo.

Aos poucos fui melhorando. Como tudo na vida, quanto mais praticava, melhor ficava. O mediador é um profissional que, quanto mais experiência tiver, melhor. Além disso, é uma profissão em que a idade avançada é muito bem-vinda.

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Afinal, o que o mediador de conflitos faz? Eu sou um facilitador da conversa. Minha função principal é fazer com que os envolvidos escutem de verdade o outro em busca de uma solução. Pense numa mãe com uma laranja e dois filhos na disputa. Será que dividir a laranja é a melhor solução? Muitos falarão que sim.

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Numa mediação vamos perguntar: “Para que você quer?”. Um filho diz que quer fazer um suco de laranja e o outro, um doce. Com essas respostas ficou muito fácil. O suco da laranja para o filho que quer o suco e a casca para o que quer o doce. Dessa forma teremos o ganha-ganha do conflito. Não é sensacional?

Atuo em vários tipos de conflito. No caso de um divórcio com filhos, em que os pais continuam pais mesmo com o término daquela relação, em brigas de vizinhos que continuarão convivendo, na empresa familiar em que aqueles parentes provavelmente se encontrarão em algum evento social. Daí a importância de uma ótima alternativa para resolução dessas questões. Casos pontuais como uma batida de trânsito, uma compra ou serviço prestado frustrado podem ser mediados também.

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Onde há conflitos, podemos mediar.

O conflito faz parte de nós. Quando não concordamos com o outro, há desentendimento, é inevitável. Mas a maneira como o encaramos, não.

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Na mediação, o processo é confidencial. As partes são empoderadas para resolver as suas questões e não deixar o juiz decidir a sua vida. O advogado trabalha orientando as partes. É uma maneira mais rápida, econômica e que respeita o que a pessoa quer. O comprometimento dos envolvidos numa mediação é muito maior do que via sentença judicial. Discutimos o valor da pensão alimentícia, por exemplo. Quanto você pode pagar? Um acordo conversado é totalmente diferente de um imposto.

Os envolvidos precisam se sentir acolhidos para dividir suas questões pessoais. A verdadeira empatia não é se colocar na posição do outro, mas entender o outro, pois cada um é único. Mostro que tudo na vida pode ser mudado. Eu não decido nada, mas sinalizo que existe luz no fim do túnel e que juntos somos mais fortes.

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Não é a solução para todos os problemas, mas, mesmo quando não chegamos ao acordo, fazemos pontes. Num mundo tão polarizado, a tentativa de uma mediação é, com certeza, a tal felicidade. Você não acha?

Gelson Liberman, mediador judicial e extrajudicial, aparece sorrindo e ao fundo está um mar azul e o pôr do sol laranja
Gelson Liberman (@liberman.mediacao) atua como mediador judicial e extrajudicial. (Acervo Pessoal/Reprodução)

A curadoria dos autores convidados para esta seção é feita por Helena Galante. Para sugerir um tema ou autor, escreva para hgalante@abril.com.br

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Publicado em VEJA São Paulo de 4 de maio de 2022, edição nº 2787

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