Pudim de leite sem furinhos? Sim, ele existe!
Os milhões de buraquinhos denunciam uma temperatura exagerada e destroem a textura ideal da receita
Pudim de Leite. Sem furinhos.
Sério? Como assim?
É muito comum.
E os furinhos?
Não é comum, e não pode ter furinhos.
Você sabia que um dos maiores chefs de todos os tempos escolhia seus pupilos pedindo que preparassem ovos mexidos?
Às vezes, a simplicidade aparente das coisas esconde uma verdade que só descobre quem tem atenção e cuidado. Algumas receitas, quando bem-feitas, são eternas e agradam tanto que continuamos cultivando.
Para mim, um bom pudim de leite é o “ovo mexido” da confeitaria. Quase todo mundo faz, mas poucos fazem tão bem que você trocaria qualquer sobremesa estrelada por ele.
Afinal, são muitas as chances de erro: uma calda amarga ou sem sabor, milhões de furinhos (nem pensar! Eles denunciam temperatura exagerada e destroem a textura do pudim), excesso de açúcar (ou de leite condensado) e até farinha. Não pode e pronto. Pudim é de leite, não de pão.
E quem fez o primeiro pudim de leite?
Eu adoro investigar as origens das receitas que mais amo, mas aqui a tarefa é inglória. A ideia de cozinhar leite com ovos se perde na noite dos tempos.
Ninguém afirma categoricamente qual seria “a primeira receita”, mas uma boa pista pode estar no Daryols, receita que aparece na obra Forme of Cury. Compilado pelos mestres cozinheiros do rei da Inglaterra e publicado em 1390, traz mais de 200 receitas e um creme cozido no forno, talvez um dos primeiros pudins.
“Take creme of cowe mylke… do thereto ayren with sugur, saffroun, and salt.”
Forme of Cury
Ou seja, algo como misturar leite, ovos, açúcar e açafrão, levando ao forno. Na época, quase tudo ia ao forno dentro do “cofyn”, uma casca de farinha e água — precursora das tortas atuais — que muitas vezes nem era consumida.
Flan, palavra que também é usada para designar pudins, vem do latim usado para “tortas baixas”, também se referindo à categoria de receitas de cremes assados, muitas vezes dentro do “cofyn”.
Custard, usado em inglês para designar um creme doce à base de leite e ovos, tem origem em croustade, palavra medieval usada para tortas feitas com creme. (McGee, Harold. Comida e Cozinha: ciência e cultura da culinária. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014).
Toda esta vertente de receitas mostra o ovo como ingrediente capaz de criar uma mistura cremosa ou sólida. Por muitos séculos, os antepassados dos pudins atuais — especialmente na tradição ibérica — eram feitos com carne de aves cozida e desfiada.
A técnica refletia tanto o gosto medieval por misturar doce e salgado quanto uma estratégia inteligente para dar textura, já que o colágeno da carne ajudava a engrossar a mistura. Farinha de amêndoas também era um ingrediente recorrente, e no famoso Llibre de Sent Soví (do final do século XIV) aparece um manjar blanc, muito próximo do pudim, mas sem ovos.
Mas e o leite condensado?
É impossível pensar em pudim de leite sem ele, e isso se deve a uma excelente estratégia de marketing: durante décadas, receitas de pudim eram impressas no verso ou no rótulo das embalagens. Uma mão na roda para a cozinheira doméstica, ocupada demais para ser criativa — e ainda dava para usar a latinha como medida!
Apesar de o leite condensado às vezes ser tratado como vilão da confeitaria brasileira, responsável pelo excesso de açúcar em tudo, eu gosto dele. Quando bem usado, adoça com a vantagem de acrescentar menos água à receita, o que, em geral, rende mais cremosidade — e isso é sempre bem-vindo. Basta não exagerar.
Investigada a história e definidos os ingredientes, vamos à técnica — que é onde a porca torce o rabo.
Muitas receitas mandam bater a massa e assar em banho-maria. E aí, você que se vire com o tempo, a temperatura do forno, a água do banho-maria, o caramelo…
A forma do pudim deve ser lisa e com canudo no centro — isso garante boa distribuição de calor. Ela deve estar seca, e eu recomendo que seja untada com manteiga antes de receber o caramelo, que deve ser depositado apenas no fundo. Acredite: isso não só facilita o desenforme, como garante o topo do pudim lisinho e perfeitamente caramelizado.
Siga a receita do caramelo à risca e resista à tentação de mexer!
Sobre o cozimento, lembre-se de que o pudim perfeito precisa de calor suave. Ele é uma clássica mistura de ovos com líquido que não é batida durante o cozimento. As proteínas dos ovos ficam soltas e dispersas em bastante leite, formando uma rede frágil que entra em colapso se submetida a calor excessivo — surgem então os famosos furinhos (no caso do pudim) ou grumos (no caso de cremes). Eu sei que tem gente que ama um pudim com furinhos, mas a rigor, isso acontece por conta de um erro técnico.
Para um pudim pequeno (assado na forma de 18 cm de diâmetro, porque eu gosto dele alto. Se for usar uma forma grande dobre a receita da massa)
Ingredientes
- 3 ovos
- 5 gemas
- 500 ml de leite integral
- 395 g ( 1 lata) de leite condensado
- 5 g de extrato de baunilha
Para o caramelo:
- 150 g de açúcar
- 50 ml de água
Unte a forma escolhida com manteiga sem sal. Coloque o açúcar em uma panela de fundo grosso. Despeje a água. Espere ela hidratar o açúcar. Leve ao fogo baixo, deixando cozinhar até que o açúcar derreta e se forme uma caramelo com cor âmbar. Se for imprescindível mexer, segure a panela pelo cabo e gire suavemente. Despeje no fundo da forma de pudim previamente untada. Reserve enquanto prepara a massa do pudim.
Coloque leite, gemas, baunilha, ovos e leite condensado em uma tigela grande. Mexa com fouet (aquele batedor de arame) até que todos os ingredientes estejam bem misturados, e não seja visível nenhum vestígio de clara ou gema.
Passe a mistura por uma peneira fina. Despeje cuidadosamente sobre o fundo da forma (previamente caramelizado).
Coloque a forma dentro de uma assadeira funda e de fundo fixo, e leve ao forno, preenchendo a assadeira maior com água morna, até perto da metade da forma.
Deixe o pudim assar por 1 hora e 30 minutos no forno a 160 graus. Desligue o forno e deixe o pudim dentro dele por mais 3 horas pelo menos. Retire do forno e leve a geladeira até o dia seguinte.
Para desenformar, com a ponta dos dedos ou a ajuda de uma espátula, solte as laterais da forma. Se ainda parecer colado, passe o fundo da forma rapidamente sobre uma fonte de calor, que pode ser uma bacia com água quente. Isso fará com que a manteiga ( usada para untar a forma) derreta, facilitando o processo.
Verifique se o pudim já está mais solto, cubra a forma com o prato em que o pudim será servido, e vire o pudim. Retire a forma e sirva
Se ao virar o pudim ele não tiver soltado, repita o processo descrito e tente mais uma vez.
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