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Arte ao Redor

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70 anos da Bienal de Arte: o que é imperdível na edição que começa em setembro

Com o título Faz Escuro Mas Eu Canto, atração conta com 91 participantes e mais de 1 100 obras; curador destaca artistas indígenas

Por Tatiane de Assis Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
27 ago 2021, 06h00
A imagem mostra duas obras. À esquerda, mostra nove artes feitas por Esbell. Elas incluem traços por cima de pinturas antigas. À direita, mostra um painel de telas de led. Cada uma delas compõe a imagem de chamas em fundo preto. Elas estão espalhadas em um plano, sem uniformidade.
70 anos da Bienal: artistas indígenas ganham destaque (Leo Martins/Veja SP)
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No próximo dia 4 (sábado), a Bienal de São Paulo inaugura sua 34ª edição, com o título Faz Escuro Mas Eu Canto, retirado do poema Madrugada Camponesa (1965), do amazonense Thiago de Mello. A mostra coletiva, com 91 participantes e mais de 1 100 obras, ocorre em sua tradicional casa, o Pavilhão Ciccillo Matarazzo, no Parque Ibirapuera.

“Um dos pontos altos da exposição é entrar em contato com trabalhos do Jaider Esbell e outros artistas indígenas contemporâneos brasileiros e se deslumbrar com a riqueza poética que eles trazem”, afirma o curador-geral, o italiano Jacopo Crivelli. “Mas também é importante notar a relação entre essas obras e peças de nomes vindos de outros lugares, o que nos permite ter visões de mundo diferentes daquelas que tínhamos, tanto sobre assuntos conhecidos quanto sobre aqueles que ignoramos.”

Essa defesa da rearticulação de sentidos e significados parece estar em consonância com a produção do evento. Desde que Crivelli e o paulistano Paulo Miyada, curador adjunto, tiveram seus nomes anunciados, muita coisa mudou, incluindo a data de abertura.

Com a pandemia, a mostra prevista para 5 setembro de 2020 passou para 3 de outubro e depois, finalmente, para setembro de 2021 (e vai até 5 de dezembro). A alteração fez o intervalo entre edições aumentar de dois para três anos, o que também ocorreu em 1993, para evitar coincidir com outra mostra, a Bienal de Veneza. A mudança ainda fez esta edição paulistana coincidir com os setenta anos da mostra. 70 anos da Bienal de Arte: o que é imperdível na edição que começa em setembro 34.bienal.org.br. Grátis.

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ARTISTA AQUI, CURADOR ALI

Segundo o curador-geral, Jacopo Crivelli, e o adjunto, Paulo Miyada, um dos primeiros artistas a serem convidados para a mostra foi Jaider Esbell. Ele participa com quatro trabalhos, entre eles uma instalação, denominada Carta ao Velho Mundo (2020), e uma série de pinturas, chamada A Guerra dos Kanaimés (2020), que se relaciona aos conflitos que seu povo, os Macuxis, e outras etnias indígenas travam. Esbell ainda faz a curadoria no Museu de Arte Moderna (MAM) da coletiva Moquém_ Surarî, com trabalhos contemporâneos dos povos Huni Kuin, Krenak, entre outros.

A imagem mostra nove artes feitas por Esbell. Elas incluem traços por cima de pinturas antigas.
Jaider Esbell: trabalho presente na Bienal (Leo Martins/Veja SP)

SEM MEDIAÇÃO DO OUTRO

Daiara Tukano tem voz e olhar firmes. Ao falar de quatro das dezesseis obras que expõe na Bienal e que trazem quatro aves — o gavião-real, o uruburei, a garça-real e a arara-vermelha —, ela mostra novas perspectivas de mundo e frisa de onde elas viriam: “São de povos que estavam aqui antes da grande invasão do território. Por favor, escreva essa expressão, grande invasão, ela precisa ser usada”, pede.

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Seus trabalhos estão em diálogo no último piso com obras de Lygia Pape (1927-2004), a maioria pertencente à série Amazoninos. “Para os modernistas brasileiros, a ideia do indígena já estava na pauta, mas de maneira muito distinta da forma como aparece na produção de Lygia, muito mais interativa, que quebra com a tradição do concretismo”, explica Crivelli, autor desse encontro. Um próximo passo nesse processo é dado por Daiara: “Ela é o último capítulo dessa linhagem, traz sua voz agora, sem mediação do outro”, assegura o curador.

A imagem mostra uma obra de Daiara. É um grande gavião, com a cabeça colorida. Ele está de asas abertas, em um único plano. O fundo é colorido, com ele sobre o que parece um sol. Há também linhas e contornos sobre toda obra.
Uma das aves de Daiara Tukano: “São de povos que estavam aqui antes da grande invasão do território” (Leo Martins/Veja SP)

AS PELES DO PAVILHÃO

Conversar ou confrontar a arquitetura do Pavilhão Ciccillo Matarazzo, desenhado por Oscar Niemeyer, é uma decisão com a qual se defrontam, a cada edição, os arquitetos que pensam a expografia da mostra. A resposta dada por Andrade Morettin, responsável pelo projeto em 2021 que busca criar uma escala intermediária entre os visitantes e o prédio monumental, é construir galerias dentro da construção, cujas peles são tecidos de juta, placas de policarbonato e painéis de madeira de reflorestamento. Ao final, tem-se um sentimento mais acolhedor, que se apropria do grandioso, por sua face idílica.

A imagem mostra artes interagindo com a estrutura da Bienal.
Pavilhão da Bienal: diálogo com arquitetura (Leo Martins/Veja SP)

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LABIRINTO FEITO COM TEMPO

No segundo andar do pavilhão, o visitante se depara com a instalação Paisagem (2021), de Regina Silveira, que é uma veterana e já participou da Bienal nos anos de 1957, 1981, 1983 e 1998. A obra é uma espécie de labirinto, em que as placas de vidro que a compõem parecem estilhaçadas por balas.

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Sobre as consequências do adiamento da mostra para o processo de produção do trabalho, o curador adjunto Paulo Miyada diz: “Mesmo quando estávamos em dúvida sobre a data, a conversa entre curadores e artistas não cessou. Nesse tempo estendido, a obra da Regina, por exemplo, foi se consolidando, achando a forma, a escala, o material.”

A imagem mostra um labirinto de placas de vidros. Nas telas, há danos semelhantes a de marcas de balas.
São Paulo, SP 23/08/2021 BIENAL DE ARTE – Montagem das obras da Bienal de arte, prevista para o início de setembro. Foto: Leo Martins (Leo Martins/Veja SP)

PAISAGEM CONSTRUÍDA

Uma das obras que Daniel de Paula leva para a Bienal é Circulação (2019). O suporte utilizado nela são 24 painéis de LED, que têm seu funcionamento ditado por um processador, que endereça a cada tela um “pedaço” da imagem. O caráter fragmentário, que se desdobra para o que é visto, nos leva a pensar sobre a ideia de paisagem, o discurso advindo de sua construção e também as consequências de admiti-la como simplesmente uma extensão da realidade.

A imagem mostra um painel de telas de led. Cada uma delas compõe a imagem de chamas em fundo preto. Elas estão espalhadas em um plano, sem uniformidade.
Circulação (2019): obra de Daniel de Paula (Leo Martins/Veja SP)

NO MAR, ENTRE VOZES

Na terça (24), Arjan Martins estava a mil no pavilhão da Bienal na montagem da exposição, na qual ele apresenta dois trabalhos, Complexo Atlântico — Cordas (2021) e Complexo Atlântico — Oceano (2021). O primeiro é uma instalação, composta por uma âncora com 1,3 tonelada e um cordão que corta o pavilhão, formando um triângulo, em referência ao comércio entre América, África e Europa no período colonial e que, por conseguinte, abarcava a travessia forçada de pessoas escravizadas. O segundo é uma pintura, que traz uma mulher incógnita: “Ela não tem uma identidade, pode representar várias pessoas que foram forçadas a fazer esse percurso”.

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A imagem mostra uma pintura de Arjan Martins. Nela, há silhueta de pessoas e, no centro, uma mulher negra sem rosto.
Pintura e instalação: de Arjan Martins (Leo Martins/Veja SP)
A imagem mostra uma âncora encaixada em um pilar da bienal. É possível ver, na ponta da âncora, um pedaço do cordão.
Âncora de 1,3 tonelada: cordão corta o pavilhão (Leo Martins/Veja SP)

DENTRO E FORA

Percorrer o térreo do Pavilhão da Bienal pode ser motivo de surpresa na 34ª edição, isso porque ele foi seccionado por uma estrutura, a dita pele, de mais de 7 metros de altura, com faces de policarbonato. De fora dela, nota-se o aspecto difuso do material, quando em contato com a luz, seja ela artificial ou natural. De dentro, vê-se Boca do Inferno (2021), série com 150 monotipias, com Carmela Gross, junto ao meteorito de Santa Luzia e outros dois objetos que resistiram ao incêndio e destruição do Museu Nacional, no Rio, em setembro de 2018.

A imagem mostra a estrutura com mais de 7 metros de altura,com faces de policarbonato.
Surpresa: estrutura com mais de 7 metros de altura (Leo Martins/Veja SP)

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Publicado em VEJA São Paulo de 1° de setembro de 2021, edição nº 2753

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