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OLÁ,

Aeroporto e ONG de resgate animal travam embate por terreno em Jundiaí

Mata Ciliar, que cuida de 2 000 animais, está no local há 26 anos; concessionária diz que atividade atrai "urubus" e apresenta risco para aeronaves

Por Guilherme Queiroz
Atualizado em 19 Maio 2021, 22h25 - Publicado em 19 Maio 2021, 21h56
Imagem mostra Onça Pintada lambendo sorvete
Onça-pintada na Associação Mata Ciliar (Reprodução Instagram/Divulgação)
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Uma disputa que envolve o governo de São Paulo, a concessionária que administra o Aeroporto de Jundiaí e uma ONG de acolhimento e reabilitação de animais silvestres ganhou destaque na última semana. Desde segunda-feira (17), ativistas e membros da Associação Mata Ciliar fazem uma vigília no terreno cedido pelo poder público (vizinho do aeroporto) onde a instituição tem uma unidade.

Tudo começou quando a VOA SP, concessionária que desde 2017 administra terminais aeroportuários privados em cinco cidades paulistas, notificou a Mata Ciliar, solicitando a desocupação de parte do terreno onde fica a ONG. A empresa deu 48 horas para o esvaziamento do local, mas afirmou que o prazo é “meramente burocrático”. 130 animais silvestres ficam na área. A empresa pede o local para ampliação das atividades comerciais do aeroporto.

Desde então, ativistas da Mata Ciliar fazem uma vigília no terreno pleiteado, temendo uma ação da VOA. De acordo com a ONG, há duas semanas a concessionária retirou parte das cercas do local. Uma reunião está marcada entre governo do estado, a VOA, a Mata, e a prefeitura de Jundiaí para sexta-feira (21), em uma tentativa de resolução da questão.

LINHA DO TEMPO

A história é complicada. Em 1995, a Mata Ciliar firmou uma parceria com o Centro Paula Souza (autarquia estadual da área de educação), que cedeu o terreno, vizinho ao Aeroporto de Jundiaí, para o uso da instituição. “A gente recebe animais do estado inteiro: da Polícia Ambiental, Corpo de Bombeiros. Temos convênios com onze municípios da região de Jundiaí”, explica Samuel de Oliveira Nunes, coordenador de comunicação da entidade. A ONG conta com unidades também nas cidades paulistas de Araçatuba, Pedreira e Vargem. Somente em Jundiaí, cuida de cerca de 2 000 animais.

“Realizávamos formações com os alunos de educação ambiental do Paula Souza, mas esse convênio findou-se em 2017 e a Mata começou a ir atrás para regularizar a permanência no local”, explica a advogada da instituição, Juliana Oliveira.

Em 2020 o terreno onde fica a ONG apareceu em uma fila de leilões de terrenos estaduais, o que assustou a entidade e causou pressão da sociedade civil de Jundiaí: como resultado, o vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB) gravou um vídeo se comprometendo a trabalhar pela regularização da situação da Mata Ciliar e garantir a permanência definitiva da entidade na área.

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“A Mata tem muita credibilidade em Jundiaí. Sempre participa dos conselhos municipais, faz parte do diálogo público. Por isso o apoio por parte da população é tão forte”, comenta o cientista social e ativista Henrique Parra Filho, atuante em questões ambientais no município.

Mas, em 2021, outra reviravolta: a VOA SP requereu a desocupação de 29 000 dos 326 500 metros quadrados onde ficam as instalações da Mata Ciliar. E aí a confusão de versões ganha força: a entidade afirma que, em 1998, o governo do estado publicou um decreto dando os tais 29 000 metros quadrados para o Aeroporto de Jundiaí, antes estadual e agora com administração privada. O que a entidade alega é que nunca teve conhecimento dessa mudança até agora, em 2021. “A área nunca foi pleiteada, nunca tentaram retomar esse terreno”, afirma a advogada Juliana.

“É um problema de disputa territorial: um terreno que é do governo estadual, cedido para a fauna silvestre, mas ao mesmo tempo cedido para o Aeroporto. Percebemos que houve um problema de comunicação”, conta a deputada estadual Marina Helou (REDE), que enviou uma equipe para Jundiaí para acompanhar o desenrolar da questão.

“A prefeitura não só reconhece a importância da Mata Ciliar, mas apoia a entidade com valor mensal de 64 000 reais. A administração está à disposição para participar desta discussão”, disse em nota a administração de Luiz Fernando Machado (PSDB).

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O MOTIVO DA DESOCUPAÇÃO, SEGUNDO A VOA

De acordo com a concessionária, as tratativas para a devolução do terreno de 29 000 metros quadrados se iniciaram em 2019. Desde então, diz a VOA, “as partes iniciaram diálogo para a devolução da área e remanejamento total da ONG para outro local do município”. A empresa afirma ainda que se propôs a arcar com todos os custos para uma eventual mudança.

A Mata Ciliar nega que qualquer acordo tenha ocorrido. “Esse contato nunca existiu”, alega Juliana. A VOA alega que as atividades da ONG, que cuida de animais silvestres, atraem a presença de urubus, o que aumentaria o risco de acidentes aéreos. A empresa formulou um parecer técnico sobre a presença das aves e enviou para órgãos com a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) e o Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (DAESP). “A VOA expressa grande preocupação quanto a permanência da ONG Mata Ciliar a partir do dia 20 de maio, quando o aeroporto começa a operar por instrumentos e irá incrementar suas rotas comerciais”.

“Estamos no pé da Serra do Japi, o maior remanescente de Mata Atlântica da região. A gente já resgatou lobo-guará dentro do aeroporto. A questão do urubu e tantas outras aves, é pela localização, aqui tem de tudo. A própria concessionária nos traz bichos que são resgatados”, comenta o coordenador de comunicação da Mata, Samuel.

A concessionária alega também que depois do suposto diálogo ter se iniciado em 2019, a ONG acelerou “obras na área da concessionária, construindo viveiros de animais silvestres”. A Mata não nega as novas edificações: “a demanda é gigantesca. A gente recebe mais de 30 espécimes por dia, precisamos expandir o nosso trabalho”, afirma Samuel. “Lobo-guará, jaguatirica, anta, jabutis, tucanos, são alguns das espécies naquela área”, diz a advogada Juliana.

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O GOVERNO DO ESTADO

Procurada, a gestão João Doria (PSDB) afirmou que o conflito sobre a área de 29 000 metros quadrados é uma “tratativa entre a Associação e a Concessionária”. Afirmou que a área que o vice-governador Rodrigo Garcia se comprometeu a regularizar para uso permanente da Mata Ciliar é a de 297 500 metros quadrados, do Centro Paula Souza.

“O Conselho do Patrimônio Imobiliário estuda como atender legalmente a Associação, considerando que ela ocupa a área hoje a título precário. Para que a ocupação seja permanente é preciso um instrumento legal de permissão de uso. O Conselho trabalha para regularização. Não houve mudança no compromisso tampouco na solução encontrada pelo governo e associação, que tem ciência das limitações legais do Estado”, diz a administração de Doria, em nota.

REUNIÃO

“A única forma de resolução é pelo diálogo. Terá uma reunião na sexta-feira (21), após articulação com a Secretaria do Meio Ambiente”, afirma Marina Helou (REDE). “Até lá, enquanto a questão não for resolvida de forma definitiva, vamos manter a vigília”, diz a advogada Juliana.

ANAC E DAESP

A ANAC e a DAESP confirmaram o recebimento do parecer técnico da VOA, que alega que a presença de urubus na região é ocasionada pelas atividades da Mata Ciliar, relatando que tal fenômeno é um risco para as operações do aeroporto.

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O DAESP informa que submeteu o parecer para análise e informa que a presença de qualquer espécie de animais “sobretudo as aves, nas proximidades dos aeroportos, representa um risco às operações aéreas. O regulamento brasileiro de Aviação Civil determina que o operador do aeroporto seja responsável pela implementação de procedimentos básicos capazes de diminuir o risco de colisão entre aeronaves e fauna”, diz o órgão, em nota.

A ANAC afirmou que o parecer foi peticionado na agência nesta quarta e que “poderá se manifestar após análise das informações”.

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