Ao adentrar na Estação Júlio Prestes, no centro, o italiano Franco Corsico ergue os olhos acompanhando a cobertura côncava que se estende sobre ele a cerca de 20 metros de altura. Arquiteto, urbanista e ex-secretário de Desenvolvimento de Turim, no norte da Itália, Corsico desembarcou na capital paulista na última segunda-feira (8) para participar de um seminário. Promovido pela prefeitura e pela Associação Comercial de São Paulo, o encontro tratou de discutir a realização de operações urbanas ao longo da orla ferroviária. São medidas para recuperar determinadas regiões da cidade que possibilitarão a investidores construir além do que é permitido pela legislação. Como contrapartida, eles têm de arcar com taxas a ser revertidas em melhorias de infraestrutura.
O projeto para o trecho entre o Brás (centro) e a Lapa (Zona Oeste) prevê transferir 12 quilômetros da linha ferroviária para túneis subterrâneos. Há duas décadas, Turim vem realizando uma experiência semelhante. Iniciado nos anos 90, o empreendimento deveria ter sido concluído em 2006, quando a cidade sediou os Jogos de Inverno. Não deu tempo. Conforme as obras avançaram, foi preciso redesenhar alguns trechos, prolongando o cronograma. Hoje, com 80% do trabalho finalizado, a previsão é de que tudo esteja pronto no próximo ano. Os gastos já chegaram a 4,6 bilhões de euros, sendo pelo menos 2,6 bilhões investidos pela iniciativa privada. Com a Copa do Mundo de 2014 batendo à porta dos brasileiros, São Paulo também busca dar novo fôlego às áreas subutilizadas que são vizinhas à linha férrea. Prazos e custos, porém, ainda estão indefinidos.
A convite de VEJA SÃO PAULO, Corsico percorreu o futuro trecho subterrâneo a bordo de composições da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). “São bem melhores que as de Roma”, afirmou. O trajeto foi iniciado na Estação Júlio Prestes, no centro, e concluído em Imperatriz Leopoldina, na Zona Oeste, pela Linha 8 Diamante. “Para quantas cidades brasileiras podemos ir saindo daqui?”, perguntou o arquiteto ao cruzar a catraca da plataforma contígua à Sala São Paulo. “É possível irmos ao Rio de Janeiro?”. Não, não é.
Apenas municípios da Grande São Paulo são servidos pelos trilhos que partem dali. Corsico se surpreende com a resposta. Em Turim, onde vive pouco mais de 1 milhão de pessoas, um décimo da população de São Paulo, a maioria das estações opera linhas municipais, interestaduais e internacionais. Para os paulistanos, porém, viagens a outros estados ou mesmo ao exterior não passam por trilhos nem mesmo no deslocamento rumo aos aeroportos, sem conexão com metrô ou ferrovia.
Pela janela do trem, ele observa o muro rente à via, a pouco mais de 1 metro de distância. Do outro lado, edificações abandonadas de antigas fábricas. “Isto é especialmente feio”, disse, ao passar pelo Brás. Atribuiu o mau aspecto à proximidade das construções. “Pode-se isolar o trem com jardins e canais.” O barulho, segundo ele, seria outra boa razão para ampliar a margem da orla, diminuindo o incômodo dos moradores da região.
De acordo com a ideia da prefeitura, no espaço onde hoje corre o trem serão construídas avenidas arborizadas com amplas calçadas. Ao redor delas, prédios novos ou recuperados revitalizarão regiões degradadas e esvaziadas. Para Corsico, enquanto o projeto, caro e demorado, não sai do papel, é possível realizar outras benfeitorias. Remover escadas das estações, criar corredores com comércio e serviços nas imediações e ampla rede de estacionamentos integrados são alguns exemplos. “Tempo é o único bem pertencente a todos em igual quantidade”, diz o arquiteto. “Se o sistema não for fácil e rápido, ninguém vai usar.” Para ele, a trajetória dos trens será igual à da calça jeans: algo que nasceu para ser utilizado por operários e, pela praticidade, conquistou todas as classes sociais.