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Santa Maria Novella é sinônimo de tradição e beleza

Fundada pelos frades dominicanos em 1612, a botica florentina atrai clientes como a atriz Catherine Deneuve e o estrelado chef Alain Ducasse

Por Simone Esmanhotto, de Florença
Atualizado em 1 jun 2017, 18h28 - Publicado em 9 ago 2011, 19h51
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  • Vinte e um de junho. É o primeiro dia do verão em Florença. Com a brisa morna soprada do Rio Arno, a sensação térmica ultrapassa os 30 graus centígrados. Turistas se refestelam com sorvete de amêndoa, best-seller da Baroncini, uma das gelaterias favoritas da cidade italiana, berço do Renascimento. Caminhar pelas ruelas de pedras rústicas e entre construções de terracota, amareladas sob o sol da Toscana, é tropeçar em reproduções de David (a original, esculpida por Michelangelo, pronta em 1504, fica na Galleria dell’Accademia, também na cidade).

    Nada, no entanto, se aproxima tanto de uma viagem no tempo quanto provar um refresco 100% florentino, com um ingrediente de 400 anos: Acqua di Santa Maria Novella, bebida com teor alcoólico de 70%, à base de balsamita, menta e canela. Basta diluir duas colheres de chá num copo de água, e o calor vai mesmo embora. “Seguimos a fórmula original”, conta Gianluca Foà, diretor da Officina Profumo-Farmaceutica di Santa Maria Novella, a mais antiga perfumaria em funcionamento — a inglesa Floris é de 1730 e a francesa Houbigant, de 1775. Credita-se à botica de Florença a ideia de trocar o óleo por álcool na composição de colônias, abrindo caminho para as fragrâncias atuais.

    Luxo 2229 - Santa Maria Novella - botões de rosa
    Luxo 2229 – Santa Maria Novella – botões de rosa ()

    A água “batizada” resume, num frasco de 25 mililitros, a origem dessa perfumaria-farmácia, numa história que se confunde com a da Florença renascentista. Desde que se fixaram na cidade, em 1221, no monastério da basílica de Santa Maria Novella — daí o nome da marca —, os dominicanos se dedicaram ao plantio de ervas para fabricar medicamentos. O primeiro registro de uma fórmula preparada por eles data de 1381: uma água de rosas, considerada antisséptica no período da pandemia da peste bubônica, que matou quase um terço da população europeia. “Nossas receitas estão diretamente ligadas à descoberta da higiene pessoal, fruto de um interesse pelo corpo humano estabelecido na Renascença”, diz Foà. Até o início do século XVII, a alquimia se destinava ao tratamento de pacientes atendidos no mosteiro, dos pobres aos nobres da família Médici, poderosa dinastia da região, passando pelo poeta Dante Alighieri, aluno dos dominicanos.

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    Em 1612, os freis decidiram vender as invenções — o ano é usado como data oficial de fundação. Criada com ervas de propriedades calmantes (e por isso conhecida como anti-histérica), a Acqua di Santa Maria Novella é o produto número 1 comercializado pela marca. Com ela, outras quatro soluções produzidas no século XVII sob a bênção do frei Angiolo Marchissi, um apaixonado por química e fundador da farmácia, seguem à venda: água de melissa (digestiva), aceto aromático (para ambientes), sais de lavanda (para reavivar os ânimos) e pastilhas (para o hálito).

    Luxo 2229 - Santa Maria Novella - loja
    Luxo 2229 – Santa Maria Novella – loja ()

    Da farmácia original resta, preservadíssima, a sala com mobiliário e afrescos do século XVII, que dá passagem para o jardim onde os freis cultivavam as ervas — o mesmo verde que Leonardo da Vinci avistava de seu apartamento no mosteiro. Os balcões oferecem hoje suplementos alimentares e vitaminas. As vedetes da marca — sabonetes e pot-pourri — ficam na sala de vendas principal, que funciona na antiga capela de San Niccolò, de 1332. Sob arcos neogóticos, os clientes escolhem seus pedidos, num curioso silêncio monástico, a partir de cardápios no tom amarelado dos prédios terracota de Florença. Desde 1848, a entrada da loja é a mesma: pela Via della Scala, 16.

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    Luxo 2229 - Santa Maria Novella - sabonete
    Luxo 2229 – Santa Maria Novella – sabonete ()

    Da fábrica na Via Reginaldo Giuliani, a 3 quilômetros dali, saem hoje cerca de 600 produtos: de hidratantes a licores, de chás a desodorantes para cães e gatos. Embora a produção envolva maquinário moderno — os sabonetes são carimbados com o antigo logo não mais na força da manivela, mas pressionados a uma temperatura de 18 graus centígrados negativos —, não cabe aplicar a palavra “indústria”. Está mais para ateliê. Os 86 funcionários dedicam-se a dobrar as embalagens, colar rótulos, fechar perfumes, derramar cera na fôrma para velas à moda antiga: a mão e um a um.

    Luxo 2229 - Santa Maria Novella - pot-pourri
    Luxo 2229 – Santa Maria Novella – pot-pourri ()
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    Contrariando o padrão, os produtos aqui não vêm com data de validade. São mantidos o mais naturais possível e sem aditivos como antioxidantes. “É como queijo e vinho: quanto mais o tempo passa, melhor”, compara Eugenio Alphandery, dono, desde 2006, de um terço da Santa Maria Novella. O restante pertence à família Stefani, que assumiu o controle em meados do século XIX, depois de o governo italiano haver confiscado a farmácia dos dominicanos.

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    É essa receita que garante fãs como Alain Ducasse. O estrelado chef francês é devoto do creme de barbear da marca. Amiga de Alphandery, Catherine Deneuve foi responsável pela introdução da marca em Paris — ela adora os sabonetes e cremes. Mesmo rezando pela cartilha dos freis, Alphandery planeja, para o aniversário de 400 anos da grife, em 2012, uma linha de maquiagem. “Somos guardiões de uma tradição, e não de uma múmia”, explica o empresário, à frente de cinquenta filiais da marca, uma delas na Rua da Consolação, em São Paulo, inaugurada em 2006. As belas da tarde agradecem.

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