A Rua Aspicuelta, epicentro atual do agito noturno da Vila Madalena, contraria a lei da física de que dois corpos não ocupam o mesmo espaço. Ela reúne dezenove bares apenas no trecho entre as ruas Mourato Coelho e Fidalga. Nos fins de semana, eles atraem por dia um público estimado em 4.000 pessoas. A via é estreita (9,6 metros de largura), tem mão dupla e um congestionamento infernal, agravado pelo trabalho dos espaçosos manobristas, que param os carros dos clientes em fila dupla. Como se não bastasse, a cada dois minutos e meio passa um ônibus por ali — a Aspicuelta faz parte do itinerário de seis linhas. Impacientes, os motoristas dos coletivos tiram finas das calçadas, buzinam diante do congestionamento e não raro, derrubam motos estacionadas e esbarram nos automóveis parados no meio-fio.
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“No fim do ano passado, deixei o carro com um serviço de valet, e, quando me devolveram, ele estava com a lateral toda amassada”, conta o empresário Gabriel Mello. Para evitar entregar o veículo na mão de um desconhecido, há quem prefira batalhar por uma vaga na rua. A escolha também é arriscada. “Recentemente, um ônibus arrancou o espelho retrovisor do meu jipe”, indigna-se o empresário Caetano Tibiriçá. Para não ter surpresas desagradáveis no fim do programa, habitués do reduto estão preferindo desembolsar um dinheiro a mais (leia-se no mínimo 18 reais) para garantir um cantinho nos estacionamentos. “Não penso duas vezes. Apesar do gasto, é a melhor saída”, diz a arquiteta Tamara Toledo, que vai, semanalmente, desfrutar o agito local em seu Honda Fit.
Diante de tantos problemas, donos de bares e moradores da região iniciaram um movimento para tirar de lá os coletivos. “Até maio, vamos concluir o projeto de reurbanização da Vila Madalena, que inclui a substituição dos veículos grandes por micro-ônibus e a transformação da Aspicuelta em rua de sentido único”, afirma Flavio Pires, proprietário do bar Quitandinha e diretor da Associação de Gastronomia, Entretenimento, Arte e Cultura da Vila Madalena (Ageac). “O nosso primeiro plano foi aprovado em 2008 pela prefeitura. Mas, por motivo desconhecido, nunca foi executado”, completa ele. A Secretaria Municipal de Transportes diz que estuda fazer a troca da frota por coletivos menores, mas não tem ainda previsão de implantação do novo sistema. “Algo precisa ser feito, pois a região está ganhando novos bares e não comporta mais o mesmo planejamento de dez anos atrás”, afirma o executivo Wilham Castro, que há 32 anos vive no bairro.
Até o fim da década de 80, as ruas dali eram relativamente tranquilas. Um marco da transformação da vida noturna foi a inauguração do bar Olivia, em 1990, na Aspicuelta, no mesmo ponto onde hoje funciona o Posto 6. Logo em seguida, o Quitandinha, o mais antigo boteco em funcionamento na rua, também abriu suas portas. “No começo, eu conhecia todos os meus clientes, pois eles moravam nos arredores”, lembra Pires. Os negócios ficaram mais acelerados a partir de 2000, com a chegada de vários estabelecimentos e de um público vindo de mais longe.
Somente nos últimos cinco anos, foram inaugurados onze bares no trecho de 230 metros entre a Mourato Coelho e a Fidalga. “Hoje, a Vila é um ponto turístico por onde circulam pessoas do mundo todo”, diz o jornalista Fernando Costa Netto, sócio do Posto 6. “A valorização do bairro como um excelente reduto boêmio é importante para a cidade, e o agito característico deve ser preservado”, defende ele. “Mas é urgente que o movimento seja organizado de modo a evitar acidentes e problemas mais graves.”