“Marca é pra cerveja”, diz Ricardo Nunes sobre legado na prefeitura
Às vésperas de completar dois anos no cargo de prefeito, ele diz que tem apoio de sete partidos para tentar a reeleição e cobra agilidade do TCM
O fato de estar prestes a completar dois anos de mandato sem ainda ostentar uma marca própria parece não incomodar o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB). “Essa questão da marca, o Bruno (Covas, ex-prefeito) brincava muito e eu brinco bastante, é para cerveja e refrigerante.” Em entrevista à Vejinha, ele cobra mais celeridade ao órgão que fiscaliza as contas da prefeitu ra, o Tribunal de Contas do Município, e diz que existe acolhimento para todas as pessoas em situação de rua. Além disso, fala do relacionamento com o ex-prefeito Fernando Haddad, hoje ministro de Lula, e afirma ter apoio de sete siglas para tentar se reeleger em 2024.
Qual é a marca da gestão até agora?
Essa questão da marca, o Bruno (ex-prefeito Bruno Covas) brincava muito e eu brinco bastante, é para cerveja e refrigerante. Acho que (a minha) é o prefeito que colocou a casa em ordem, é muito presente, está muito na rua e é o primeiro que chega e o último que sai da prefeitura. É uma cidade tão complexa que não dá para ser o prefeito de uma nota só e tem de atuar com várias ações.
O senhor disse que sua principal preocupação era cuidar das pessoas, já que era isso o que Bruno Covas gostaria. O senhor acha que ele aprovaria essa retirada das barracas das pessoas em situação de rua?
Eu não sei se você está fazendo um discurso do Boulos (deputado federal Guilherme Boulos, do PSOL) na sua pergunta. O que evidentemente o Bruno faria, e faria até melhor, porque tinha muito mais capacidade, inteligência e competência do que eu, seria fazer o que nós estamos fazendo. Estamos dando abrigo para as pessoas, unidades transitórias e hotel. Temos mais de 20 000 vagas disponíveis. As outras pessoas podem utilizar o auxílio-aluguel ou o Auxílio Reencontro. Portanto, a cidade tem condição de atender praticamente todas as pessoas.
Nem técnicos da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social nem o próprio secretário Carlos Bezerra Júnior foram consultados para a retirada das barracas. O senhor tomaria alguma atitude nas áreas de saúde ou do trânsito sem consulta aos secretários?
Acho que é uma questão de interpretação. A fala do Coronel Camilo (Alvaro Batista Camilo, subprefeito da Sé, que falou da retirada das barracas) é dentro do contexto da atribuição dele. O que é ruim é polemizar e politizar um assunto que na prática não existe. O que ele falou? “Olha, a gente precisa ter uma organização na cidade, não pode ter as barracas no meio da calçada atrapalhando as pessoas tran- sitarem.” O direito tem de ser visto de uma forma ampla. Eu não sei dizer se eles não foram consultados. Acho que nem deu tempo de eles se conversarem. Talvez você esteja fazendo uma leitura equivocada de que uma fala dele é o exercício de alguma ação, e não foi.
Qual é o recurso que o senhor tem livre hoje no caixa da prefeitura?
Objetivamente falando, não tem dinheiro livre porque tem projeto para ser executado, de todos os 11,5 bilhões de investimento. Como vou fazer 20 milhões de metros quadrados de recape? Já tenho o dinheiro para fazer e gastar os 2,5 bilhões de reais. Como vou fazer a aquisição das 5 000 unidades de habitações prontas? Eu já tenho 1 bilhão disponível para fazer. E vamos fazer 4,6 bilhões de reais de investimento em mobilidade com o BRT Radial Leste e Itaquera, corredor do Imirim e corredor da Amador Bueno.
E por falar no BRT, ele está parado no Tribunal de Contas do Município. Como é a sua relação com o órgão?
Como a gente tem muita obra que nunca houve na história da cidade, evidentemente você vai ter muito mais casos de avaliação. O que tenho falado de forma aberta, transparente e respeitosa com os cinco conselheiros é que todos os órgãos de controle precisam entender que o tempo da necessidade da população tem de ser acompanhado com o tempo dos processos que tramitam nesses órgãos. Eles têm de fazer o trabalho, mas não podem demorar tanto. Não é possível que fiquei três anos com o contrato de semáforo parado e aí eu tive de arrumar uma alternativa, que foi a de fazer um aditivo na concessão da iluminação. Não é possível que o Pode Entrar (programa que visa reduzir o défi cit habitacional), que eu soltei em julho, a liberação de uma parte foi só no fim de dezembro. Precisa ter celeridade, porque tem pessoas que moram em áreas de risco. E aí, por que demora tanto? Fiscalize, mas tenha agilidade.
Há morosidade por parte do Tribunal de Contas do Município?
É uma cultura de morosidade, e não é só lá. Eu falei para o doutor Ricardo Anafe (presidente do Tribunal de Justiça): “Faz três anos que a ponte Pirituba-Lapa está parada. Não tem cabimento”. Eu não estou reclamando do Tribunal de Contas do Município. O que eu estou pedindo é que o tempo de análise dos processos seja o tempo da necessidade das pessoas. Criou uma cultura de que as coisas param.
O vereador Milton Leite disse em entrevista que, se o senhor não criasse a tarifa zero nos ônibus, quem ganharia a eleição (para prefeito em 2024) seria o Boulos. O que o senhor achou disso? E a tarifa zero vai ser criada ou não?
Falou besteira. A questão da tarifa zero eu quero fazer e, se for possível, farei. Agora, nunca tomei uma atitude irresponsável. Estão sendo feitos os estudos, e isso depende de uma série de variantes, como a questão financeira, e de alteração de legislação federal. Uma coisa que as pessoas podem ter certeza é que não vou ficar fazendo discurso e tomar alguma atitude pensando na eleição.
Quando Fernando Haddad era prefeito, o senhor, como vereador, integrou a base dele na Câmara Municipal e votou de forma favorável a vários projetos. Depois, se desentenderam. O que aconteceu?
A gente tinha até no começo uma boa relação, mas houve um certo momento em que eu acho que algumas coisas não foram legais. Começou quando a Marta Suplicy (atual secretária municipal de Relações Internacionais) veio para o MDB. Não fui articulador da vinda dela, e eu falava isso para ele, que eram questões do MDB Nacional. Eu nem tinha relações com a Marta, não tinha nem o celular dela. Hoje ela está fazendo um excelente trabalho. Depois teve a questão do Theatro Municipal (Nunes foi relator da CPI que investi- gou supostos desvios) e aí eu acho que ele acabou misturando um pouco as coisas.
E a relação com o Haddad ministro?
A relação é muito boa. Eu sou prefeito de São Paulo, tenho de governar para todos e isso está muito claro na minha administração. Só para você ter uma ideia, o Fernando Haddad pediu a liberação de pessoas da minha equipe para trabalhar com ele. Fico feliz que ele tenha escolhido bons quadros.
Uma pesquisa da Rede Nossa São Paulo indicou que só 9% da população considera a administração ótima ou boa. O que acha disso?
Eu nem tenho conhecimento dessa pesquisa. No detalhe não. É a pesquisa que o Boulos participou do lançamento dela? Como é que vou ler uma pesquisa que chama o Boulos para fazer o lançamento? Considero a pesquisa que eu faço do Lavareda (cientista político Antonio Lavareda), do Ipespe, que tem uma frequência mensal. E se você pegar a nossa pesquisa, a nossa avaliação de ótimo e boa está em 31%.
Alguns nomes da direita têm mostrado interesse em participar das eleições municipais em 2024, entre eles o deputado federal Ricardo Salles (PL). Isso pode fragmentar a disputa e rachar o voto conservador?
Hoje tem uma tendência de ter o PL com a gente, até porque estava com a gente antes da eleição de 2020, já fazia parte da base. A nossa relação com o partido antecede e muito a ida de Jair Bolsonaro e não justifica o PL ir para uma candidatura bolsonarista. Se vai vir o Ri- cardo Salles, eu acho difícil, porque temos um histórico. O Republicanos, o Marcos Pereira (deputado federal que preside a sigla), tem falado que quer estar com a gente. O Podemos, o PSC, o União Brasil e o PSDB têm dito que querem estar com a gente. O Ricardo Salles não tem uma vivência na cidade.
Publicado em VEJA São Paulo de 8 de março de 2023, edição nº 2831
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