No último ano de sua gestão à frente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), Marco Antonio Zago comenta a atuação da agência na pandemia, os frutos colhidos com o apoio a pesquisadores no sequenciamento do genoma do coronavírus, bem como os desafios enfrentados em uma época de negacionismo crescente. Quanto à sua recondução ao cargo, contudo, ele faz mistério. “Não cabe a mim optar ou não pela recondução. Mas, caso haja a indicação dos meus colegas e a aprovação do meu nome, posso, então, avaliar o pedido.”
A que se deve a hegemonia da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Campinas (Unicamp) na presidência da Fapesp?
A nossa própria história, já que a Fapesp nasce em 1962 de esforços de um grupo de professores da USP. Contudo, ao longo do tempo, temos tentado fortalecer a participação de outras instituições, sejam elas universidades ou colégios técnicos. Isso tanto no conselho deliberativo quanto no técnico-administrativo, que se desdobra nas diretorias administrativa e científica.
Com a pandemia de coronavírus, houve um redirecionamento de valores para os recursos destinados a pesquisas em medicina?
Não, o que ocorreu com a crise sanitária foi uma redução global de pedidos de bolsa em todas as áreas do conhecimento, o que é algo que precisamos superar agora. O que fizemos foi estimular a criação de projetos nas ciências médicas. Em março, por exemplo, dez dias após o diagnóstico do primeiro caso de coronavírus na América Latina, uma equipe, que recebeu apoio da Fapesp e tinha pesquisadores da USP, do Instituto Adolfo Lutz e da Universidade de Oxford, sequenciou o genoma do Sars-CoV-2.
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A concessão de Bolsa de Estágio de Pesquisa no Exterior ficou parada durante a pandemia?
Com a recomendação de isolamento social e a restrição a viagens internacionais, achamos que era melhor paralisar a apreciação dessas bolsas por um tempo. Entendemos a frustração dos estudantes, mas não havia motivo para continuar. Contudo, retomamos em junho de 2021 o exame dos pedidos, o que foi amplamente divulgado no nosso site.
Há críticas da comunidade universitária sobre o processo de prorrogação de bolsas. Como o senhor as avalia?
Há critérios gerais para a prorrogação, que podem ser consultados em nossa página na internet, e critérios específicos, já que fazemos uma análise caso a caso. Pensando no impacto da pandemia nos pesquisadores, publicamos dois comunicados que autorizavam prorrogações. O primeiro, divulgado em março de 2020, estendia em dois meses o prazo. O segundo, em 31 de maio de 2021, falava de uma concessão de prorrogação de três meses.
Nas redes sociais, alunos dizem que nem sequer receberam resposta da agência sobre seus pedidos.
A informação que tenho é de que a situação está normalizada. Então, não tenho ciência desses casos.
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O senhor está no último ano de sua gestão, pensa em continuar?
Não sei dizer, porque isso depende da avaliação dos meus colegas. O presidente da Fapesp é escolhido a partir de uma lista tríplice, construída pelo conselho e enviada ao governador. Não cabe a mim optar ou não pela recondução. Mas, caso haja a indicação dos meus colegas e aprovação do meu nome, posso, então, avaliar o pedido.
“Ao mesmo tempo que vemos a disseminação de fake news, vemos a importância da ciência, em especial no combate à pandemia”
Em 2020, houve movimentos do governo estadual para reduzir a verba repassada à Fapesp. Depois de um recuo, a ação não foi para a frente. Acha que nos próximos anos a redução não ocorrerá?
Como você disse, houve um anúncio de um corte de 454,6 milhões de reais do nosso orçamento. Contudo, houve um recuo e isso não aconteceu, mantivemos a soma original. Governantes têm respeitado a garantia, via Lei Orçamentária Anual (LOA), de repasse de 1% da receita do estado para nós e para universidades estaduais. Isso não mudou até agora e esperamos que não se altere nos próximos anos, visto o trabalho que temos desempenhado para a sociedade.
A Fapesp ainda paga as bolsas com os maiores valores no Brasil (a de doutorado chega a R$ 3.726,30, por exemplo)?
Sim, continuamos e devemos manter esse posto no futuro, já que outras agências e instituições, como Capes e CNPq, tiveram cortes substanciais em seus orçamentos. Muita gente nos questiona se não é preciso diminuir o valor pago e atingir mais gente. Pensamos nisso, é uma questão, mas pensamos que é melhor ter uma soma maior que dê para o pesquisador ter uma vida com o mínimo de conforto, sem apertos. Assim, ele não precisa fazer bicos para complementar a renda e pode se concentrar em sua pesquisa.
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Em julho, devido a um problema no servidor do CNPq, a plataforma Currículo Lattes, que funciona como uma memória de atividades de pesquisadores brasileiros, ficou fora do ar. Se não fosse possível recuperá-la, qual seria o impacto para os acadêmicos paulistas?
A Fapesp tem sua própria plataforma, que traz projetos desenvolvidos pelos pesquisadores junto a nós. Contudo, é bem diferente do Lattes, que eu, na qualidade de diretor então do CNPq, de 2007 a 2010, ajudei a consolidar. A perda do Lattes teria grande impacto. Não é o ideal, mas, pelo jeito que as coisas estão andando, o melhor é que cada um dos pesquisadores faça backup de seus currículos.
Como é ser presidente de uma agência de fomento à ciência em meio a tempos de negacionismo crescente?
É um desafio interessante porque, ao mesmo tempo que vemos a disseminação de fake news, vemos a importância da ciência, em especial no combate à pandemia. A população enxerga no seu cotidiano o valor das pesquisas, com o desenvolvimento da vacina. A imprensa também tem seu papel, divulgando o que temos feito.
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Publicado em VEJA São Paulo de 22 de setembro de 2021, edição nº 2756