O perfil da Vila Madalena, do Sumarezinho e da Vila Anglo, na Zona Oeste, está em transformação desde que o novo Plano Diretor de São Paulo, elaborado pela gestão Fernando Haddad (PT), entrou em vigor. Apesar da crise econômica ter desacelerado o mercado imobiliário, pelo menos noventa casas foram derrubadas por construtoras no entorno da Estação Vila Madalena do Metrô para quinze lançamentos residenciais. Com o declive característico desses bairros, demolições já provocam danos estruturais em imóveis vizinhos das futuras torres.
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Há dez dias, um deslizamento de terra em obra da Even interditou um hostel na Rua Girassol depois de a parede de um dos quartos ir ao chão. Nenhum dos três hóspedes que dormiam no local se feriu. Na casa de cima, com frente para a Rua Senador César Lacerda Vergueiro, parte do quintal também ficou fechada para a realização de reparos. A construtora informou que já concluiu a contenção na área e não há mais riscos.
Na hora do incidente, porém, a movimentação de terra provocou pânico. “Tomamos um susto enorme, o estrondo estremeceu minha casa. Agora a tensão é constante, porque não sabemos o que mais pode acontecer. Os terrenos aqui são muito íngremes, não deveriam receber torres enormes de apartamentos”, diz a administradora de empresas Yara Sanchez, uma das poucas moradoras que resistiram à pressão do mercado imobiliário. Na região, alguns sobrados chegaram a ser vendidos por mais de 2 milhões de reais.
Os trabalhos de demolição começaram no início deste ano, cerca de seis meses após a aprovação do Plano Diretor. A consequência direta da medida foi a procura por áreas vagas. Como elas são raras, as construtoras passaram a comprar e demolir casas. No local em que houve o deslizamento de terra, por exemplo, eram treze lotes, todos já derrubados para a construção de uma torre de 22 andares e 166 apartamentos.
“É um cenário de destruição. Parece que caiu uma bomba atômica ali”, diz a produtora Beatriz Torres, que faz parte do conselho participativo da Subprefeitura de Pinheiros.
Os moradores reivindicam que a prefeitura reveja a liberação dos espigões e a marcação do perímetro a ser adensado – a proposta é que ele seja reduzido de 700 000 metros quadrados para 260 000 metros quadrados. “Nossa luta é pela preservação das casas e dos sobrados que caracterizam a Vila Madalena. Em 2012, o prefeito Haddad, durante a campanha eleitoral, chegou a participar de um abaixo-assinado exatamente com essa finalidade. Não pode agora agir de forma tão contrária”, afirma Beatriz, que guarda os documentos.
Os futuros prédios tomarão conta de ruas tranquilas, até então formadas por sobrados de médio e alto padrão – alguns com piscina. É o caso da Rua Senador César Lacerda Vergueiro. A via tem três empreendimentos residenciais em projeto e com demolições em andamento. “Trabalho aqui há dezessete anos e nunca vi tanta mudança ao mesmo tempo. Além das casas derrubadas, há outras vazias”, diz o vigia José Gonzaga.
Outro exemplo fica no cruzamento das Ruas Luminárias e Paulistânia, onde a Camargo Corrêa abriu um terreno para uma torre de 23 andares. Durante a demolição, o muro de uma casa vizinha foi danificado. A empresa lamentou o incidente e afirmou que vai providenciar o reparo, mas os moradores da região temem mais problemas em função da declividade dessa parte do bairro.
Segundo o urbanista Francisco Luiz Scagliusi, que mapeou em outubro todas as quinze áreas abertas no bairro para verticalização, há casos em que a declividade dos lotes passa de 65 graus. “Nessas condições é impensável liberar prédios. Além disso, as vias ainda são muito sinuosas e com calçadas estreitas.”
Com base no estudo feito por Scagliusi, cinco associações de bairro da Vila Madalena esperam convencer os vereadores da capital a promover as alterações pedidas a tempo de evitar mais lançamentos imobiliários com altas torres na região. “O próprio Plano Diretor abre brecha para a revisão do perímetro a ser adensado. Nosso mapeamento apresenta dados técnicos que justificam a necessidade dessa mudança”, afirma Scagliusi.