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OLÁ,

Os últimos da espécie: penduleiro

Orlando Meira ouve de longe quando um relógio está fora do compasso

Por Felipe Zylbersztajn
Atualizado em 5 dez 2016, 16h39 - Publicado em 8 nov 2012, 20h38

“Isto aqui depende basicamente de prumo”, explica Orlando Meira, de 54 anos, entortando a posição de um cuco na parede. Ele quer demonstrar que a cadência do relógio de pêndulo se altera com o mínimo desalinho. A diferença entre o tique e o taque é coisa de fração de segundo. Mas grita aos seus ouvidos. “Se o som estiver manco com a peça reta na parede, será preciso ajustar o mecanismo, entendeu? É como afinar violão.” Há quase três décadas mexendo com essas engrenagens, o profissional tem a fala acelerada de um garoto ansioso. Ele é um dos penduleiros mais antigos da capital. A oficina onde ele trabalha, na Vila Nova Conceição, tem uma trilha sonora própria, com dezenas de batidas entrelaçadas e músicas dos carrilhões. São máquinas alemãs, francesas, inglesas, suíças — todas com mais de noventa anos. Os pedidos se avolumam em cima da mesa de espera. A loja foi fundada em 1963 por João Scarabichi. Em meados dos anos 80, percebendo que a lanchonete de seu filho iria fechar, convidou o chapeiro Orlando para trabalhar com ele. “Entrei aqui para limpar e lustrar as caixas de madeira dos relógios, mas logo me encantei com os aparelhos”, lembra o especialista.

Depois de um ano, os veteranos da casa permitiram que o novato começasse a limpar as peças de metal dos relógios em manutenção. “Quando viram que eu estava interessado, pegaram um despertador velho para me mostrar como se montava”, conta. Das peças mais simples, Orlando foi evoluindo aos poucos para os produtos complicados, até virar craque no assunto. As restaurações mais complexas chegam a custar R$ 4.000,00. “Tem muito macete”, define. “Você leva uns quatro anos para começar a ter ideia de como a coisa funciona”, diz ele, sentado em sua bancada, onde há um relógio de mesa francês com as entranhas abertas. “Até hoje só um funcionário da loja quis aprender a profissão comigo. Mas ele desistiu depois de uma semana.”

Galeria do Relógio Antigo. Rua Afonso Brás, 618, Vila Nova Conceição, Tel.: 3842-0860

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