O processo de concessão do Parque Ibirapuera está avançando rapidamente sem que questões fundamentais tenham sido colocadas em pauta. O que poderá ser feito no parque? Como os limites serão definidos? Se por um lado tivemos audiências públicas, por outro faltam respostas. Esta concessão tem o potencial de se tornar ícone para a gestão de áreas verdes e públicas, ou alterar e engessar nosso parque por toda uma vida. Se o edital que será oficializado nos próximos dias não endereçar lacunas de planejamento, governança e colocação de mercado, estaremos diante do pior cenário. O que deve ser feito para isto não acontecer?
Primeiro, não faz sentido concessionar sem ter um plano diretor do parque aprovado. Até o Conselho Gestor do parque já deliberou pelo plano diretor pré-concessão. Este talvez seja o maior dos perigos. Delegar a execução do plano diretor para o concessionário, após licitação como prevê o edital, quando o mesmo precisa entregar lucro é conflituoso e inaceitável. Este, se não conseguir aprovar as alterações estruturais que precisa para honrar o prometido, pagará multas e gerará desequilíbrio contratual. Péssimo para todos, mas principalmente para a sociedade, especialmente se um concessionário aventureiro propenso a riscos para ter altos retornos se predispuser a dar um lance e forçar um Ibirapuera atendendo a fins próprios, ignorando o interesse público. É assim que nascem concessões desastrosas.
Concessionar o parque como um todo, sem transparência sobre como irá funcionar é tão irresponsável como fazer estádios de futebol sem elaborar como irão se manter. A boa concessão de parques só acontece, veja-se mundo afora, quando está claro como o parque será e o que de fato está sendo concessionado. Ou seja: após a elaboração de um bom e legítimo plano diretor.
Segundo, falta legitimidade na governança proposta. Ninguém concessiona um espaço que convivem milhões sem pensar na dinâmica futura. O edital em consulta pública fala em 35 anos de concessão e, ao invés de fomentar a construção de diretrizes para melhorar seu funcionamento, propõe uma governança enfraquecida. Estabelece pouco mais do que um questionário de satisfação e limita o poder do Conselho Gestor à consultivo em questões centrais para o futuro do parque, como se em uma tentativa de reduzir o risco do concessionário que pode propor alterações substanciais ao parque como mínima resistência regimental.
Por último, temos o problema grave de colocação da concessão no mercado. Ao invés de fomentar a competição ao trabalhar mercados consolidados como os de alimentação, estacionamento e eventos em concessões separadas, como todos fazem, o edital entrega o parque como um todo, perdendo a concorrência. Além disso, procurando uma capacidade técnica inexistente permite que administradores de terminais rodoviários possam concorrer, mas que organizações dedicadas ao cuidado do parque sejam excluídas, mesmo com histórico e saúde financeira. Na mesma linha, contrariamente a fomentar investimentos ao longo dos anos, o edital define um montante muito pesado no início da concessão, exigindo ativos ainda obscuros, de interesses estranhos e permissão incerta, tal como possíveis aviários, aquários, ou tirolesas sob o lago. Sem foco, perdemos todos.
Precisamos escutar mais e debater de portas abertas esta concessão, com transparência e sem a pressa exagerada que pairava no ar. Ao estabelecer um plano diretor, os períodos condizente para concessão serão naturalmente ajustados, e a partir daí poderemos realmente fomentar o engajamento social e mudar como cuidamos de nossos espaços abertos verdes e públicos em São Paulo.
Thobias Furtado é diretor presidente da organização Parque Ibirapuera Conservação.