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Isolamento na pandemia precipitou crise em alguns relacionamentos, mas mais casais buscam ajuda profissional

Terapeutas registram maior procura de pessoas que tentam superar problemas e continuar vivendo juntos

Por Fernanda Bassette
Atualizado em 27 Maio 2024, 20h09 - Publicado em 4 jun 2021, 06h00
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  • Dar o play para assistir sozinho ao último episódio de uma série da Netflix, sem a companhia da esposa, foi a gota d’água que fez transbordar todo o stress vivido no casamento entre a supervisora de atendimento Mariana Hasegawa Ebenau, de 32 anos, e o gerente de marketing Thiago Hasegawa Ebenau, de 29. Casados há dois anos, mas morando juntos há quatro, os dois andavam se estranhando e soltando faíscas ao menor dos problemas desde o início da pandemia, quando passaram a fazer home office e dividir tarefas confinados num apartamento de 45 metros quadrados.

    “Nós já estávamos estremecidos há algum tempo, vivendo um climão, brigando por qualquer coisa. Nesse dia eu surtei. Começamos a discutir feio, foi uma gritaria, algo totalmente descontrolado. A partir daquele momento, a gente se deu conta de que precisávamos de ajuda profissional se realmente quiséssemos continuar juntos”, conta Mariana, na companhia do marido, ao lembrar o que fez os dois procurarem apoio na terapia de casal.

    A iniciativa de buscar ajuda partiu do próprio Thiago, o que surpreendeu Mariana, que temia uma reação negativa do marido caso ela propusesse uma terapia. “Quando eu tenho um problema, eu quero resolver. A Mariana já fazia terapia e tinha melhorado muito. Então, por que não tentar a de casal?”, disse Thiago.

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    thiago e mariana sorrindo para a foto
    Thiago e Mariana: a iniciativa de buscar ajuda foi dele (Reprodução/Arquivo Pessoal/Veja SP)

    Mariana e Thiago são apenas mais um entre os tantos casais que vão pedir ajuda a terapeutas e rompem as barreiras do preconceito — o Instituto do Casal, por exemplo, registrou o triplo da procura no último ano. “A busca por terapia aumentou muito. Chegamos a atender de quarenta a cinquenta ligações por semana de pessoas relatando que estão com problemas na sua relação. Temos recebido pedidos de ajuda inclusive dos homens, algo que não era tão comum”, afirma a psicóloga Marina Simas de Lima, cofundadora do Instituto do Casal.

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    O mesmo movimento é observado pela psicóloga Silvana Rita Silvestre de Oliveira, presidente da Associação Brasileira de Terapia Familiar. Ela atua há quase quarenta anos atendendo casais e famílias e viu a procura aumentar em cerca de 50%, o que para ela demonstra que os casais estão perdendo a vergonha e estão buscando ajuda mais precocemente. “O casal que procura terapia está disposto ao diálogo, e o nosso trabalho é justamente ajudá-lo a administrar os conflitos. Antes era muito comum as pessoas só irem procurar ajuda quando já estavam muito machucadas e quando não viam mais saída para a relação”, avalia Silvana.

    Juntos há um ano, Raquel Oliveira Frangiotti, de 35 anos, e o noivo, Rodrigo Silva e Souza, de 47, decidiram fazer terapia para alinhar os problemas da relação. Os dois já foram casados — ela por dois anos e ele por quase dezoito — e carregavam os traumas das relações anteriores, o que acabava interferindo no relacionamento. “Tínhamos duas realidades completamente diferentes. A Raquel tinha uma bagagem vinda de um relacionamento abusivo e eu vinha de um casamento longo com dois filhos, ainda com pendências que dificultavam uma vida futura entre nós”, conta Rodrigo.

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    O desgaste entre os dois os motivou a procurar a terapia de casal há cerca de quatro meses. Os resultados positivos já começaram a aparecer logo na segunda sessão, depois de Raquel levar uma “bordoada” da terapeuta. “Eu passei mais de cinquenta minutos despejando todos os problemas nas costas do Rodrigo, como se ele fosse o único culpado. Ao final, a psicóloga me fez refletir e enxergar como eu estava sendo egoísta no meu comportamento”, conta Raquel. A partir de então, os dois resolveram ficar noivos e vão se casar em outubro. “A decisão de casar veio graças à terapia, que nos deu a certeza de que nossas diferenças seriam resolvidas”, disse.

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    rodrigo e raquel sorrindo para selfie com trilha arbórea no fundo
    Rodrigo e Raquel: traumas anteriores e casamento em breve (Reprodução/Arquivo Pessoal/Veja SP)

    E foi a terapia de casal que salvou o casamento da professora de inglês Raquel Carvalho, de 32 anos, com o especialista em comunicação Roger Rodrigues da Silva, de 36. Juntos há dezesseis anos — sendo oito deles de casamento —, os dois estavam a ponto de se separar em março do ano passado. A crise entre os dois começou em dezembro de 2019, quando Raquel estava fazendo um estágio em uma escola na Hungria e recebeu uma proposta para dar aulas por dois anos. Ela imediatamente aceitou, sem comunicar o marido, que só soube da decisão ao chegar na Hungria para curtir as férias. “Na minha cabeça era a oportunidade da minha vida para impulsionar a carreira. Na cabeça dele era uma traição, como se eu não desse prioridade ao nosso relacionamento”, lembra Raquel.

    Roger voltou para o Brasil sozinho e ficou remoendo o que fazer com o casamento. Mas logo veio a pandemia, o contrato de Raquel foi suspenso e ela teve de voltar para o país — nessa altura, Roger estava decidido a se separar da mulher. Inconformada com a decisão, Raquel conversou com o marido e, juntos, decidiram buscar ajuda profissional para encontrar uma solução que não fosse impulsiva. “Eu estava tão magoado que decidi me separar sem pensar que poderia me arrepender depois. Quando falamos sobre fazer terapia juntos, topei porque pensei que só uma pessoa de fora, com olhar totalmente neutro, poderia nos ajudar a entender o que estava acontecendo com nosso casamento”, conta Roger.

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    E funcionou. Os dois fizeram sessões semanais de terapia até dezembro, quando sentiram que estavam com a relação sólida novamente. “No começo foi muito dolorido, mas a terapia nos ajudou a desatar os nós que não estávamos conseguindo, já que os dois tinham razão e os dois estavam errados. Foi a terapia que nos mostrou que nós queríamos ficar juntos. Se não fosse isso, provavelmente hoje estaríamos separados”, diz Raquel.

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    Publicado em VEJA São Paulo de 09 de junho de 2021, edição nº 2741

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