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Como se organiza o grupo que invadiu um ex-hotel no centro

Desde a noite do último dia 29, 417 pessoas dividem 170 quartos do hotel desativado

Por Felipe Zylbersztajn
Atualizado em 1 jun 2017, 18h02 - Publicado em 9 nov 2012, 11h27
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  • Pouco após a meia-noite do último dia 29, o vigia que tomava conta do prédio do hotel desativado Lord Palace, em Santa Cecília, foi surpreendido por um batalhão de pessoas na porta de entrada. “Pedimos ao rapaz que saísse, pois não queríamos ser acusados de cárcere privado. Ele entendeu que não era um assalto, e nós entramos”, conta Maria do Planalto, uma das coordenadoras da ocupação articulada por uma certa Frente de Luta por Moradia (FLM), que reúne grupos do chamado movimento sem-teto. Outros dez imóveis foram ocupados simultaneamente naquela madrugada. Segundo os invasores, sua intenção é chamar a atenção do prefeito eleito, Fernando Haddad, para a falta de habitação na capital.

    Desde aquela noite, 417 pessoas, que em sua maioria se apresentam como despejados de favelas da Zona Leste, dividem 170 quartos do Lord Palace. São ajudantesde obras, diaristas, catadores de material de reciclagem ou desempregados, além de 28 grávidas e 134 crianças. Todos com a carteirinha da FLM, que permite acesso ao edifício agora controlado por três integrantes da organização.

    Ajudantede porteiro de um condomínio residencial no Butantã, Emerson Basílio Moreira alugava por 400 reais uma casa em um terreno invadido em Ermelino Matarazzo, na Zona Leste, antes de participar da ocupação. “Não pretendo ficar aqui para sempre. Vim para lutar e pressionar a prefeitura”, alega. Apesar de desativado comercialmente, o prédio continua recebendo energia elétrica. Seus elevadores, porém, estão parados. A água encanada não chega acima do 4º andar (são onze ao todo) e, a partir dele, precisa ser carregada em baldes.

    Os apartamentos estão sem mobília e as comodidades atuais se resumem às banheiras — restritas aos quartos de final 4 — e aos ultrapassados aparelhos de ar condicionado, que não são ligados para economizar energia. “Vamos pagar as contas em atraso para não cortarem a luz nem a água”, diz Maria do Planalto. Segundo ela, o primeiro rateio ficará em 65 reais por família (seriam cerca de 6.000 reais em atraso).

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    Por enquanto, os banhos de imersão funcionam em sistema de rodízio. Idosos num dia, crianças em outro, homens no dia seguinte, e assim por diante. “Já usei a banheira duas vezes”, afirma a desempregada Mariza Machado de França, que habita um dos quartos com a filha de pouco mais de 1 ano. “Gostei bastante.” A FLM proibiu fogareiros nos apartamentos. Uma cozinha improvisada serve refeições três vezes ao dia. Verduras e legumes que seriam jogados fora são doados por comerciantes do Mercado Municipal toda semana.

    Lord Palace
    Lord Palace ()

    O antigo salão nobre virou um playground para as crianças, que em breve devem ganhar uma piscina de plástico no jardim. A rotina atual é bem diferente da dos bons tempos do hotel inaugurado em 1958. Ele costumava receber atores da Rede Globo quando os estúdios funcionavam a um quarteirão de distância, na mesma Rua das Palmeiras (em 1999, a emissora de TV mudou-se para o Brooklin), além de servir de concentração para o Palmeiras durante vários anos. Assim, ganhou o apelido de “hotel dos artistas”. Lembra William Bumaruf, que foi proprietário do Lord por 34 anos: “A gente recebia Chico Anysio, Chacrinha, Elizeth Cardoso…”.

    Ele se recorda da última reforma no lobby, em 2002. “Importei dois blocos de mármore da França, com 20 toneladas cada um, do mesmo tipo usado no piso do Museu do Louvre, em Paris”, afirma. Apesar do investimento, a decadência veio logo em seguida. “Nos últimos anos, a área no entorno ficou muito degradada, passou a ser frequentada por usuários de crack e sofremos assaltos. Tive até de acorrentar os computadores à parede.”

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    Em 2004, o Lord Palace deixou de funcionar e um restaurante passou a servir refeições no térreo, operação que durou até 2010. Desde janeiro, uma placa afixada na fachada informa que o imóvel foi desapropriado para dar lugar a moradias populares. A recente invasão é uma forma ilegal de os sem-teto presssionarem para esse processo andar mais rápido.

    Dos onze edifícios invadidos na cidade pela FLM, somente o Lord Palace está sob os cuidados da Cohab. Os responsáveis pelo órgão da prefeitura já anunciaram que irão à Justiça para reaver a posse. O antigo dono não concorda com o despejo. “É um orgulho para mim ter essas famílias morando lá dentro, elas precisam de moradia e aquele prédio fechado me deixava muito triste”, diz Bumaruf, que provavelmente pensaria diferente se o imóvel ainda fosse dele.

    INVASÃO REGRADA

    Dez normas de convivênciano hotel Lord Palace

    1 As mulheres são as responsáveis pela limpeza e os homens carregam a água

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    2 É proibido fumar dentro do prédio

    3 É obrigatória a participação de todos nas reuniões do grupo

    4 Os homens não podem andar sem camisa

    5 É proibida a entrada de bebidas alcoólicas e drogas

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    6 É proibido entrar e sair do prédio após as 22h, exceto em caso de trabalho ou estudo

    7 As cozinheiras não lavam a louça

    8 As grávidas ocupam os dois primeiros andares, para evitarem as escadas

    9 É proibido ouvir música ou TV em volume alto

    10 O uso das banheiras segue um rodízio

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