No fim de fevereiro, um novo hotel do grupo Hilton se instalou em uma ruazinha dos Jardins, a quatro quadras da Avenida Paulista. Inaugurado com diárias a partir de 750 reais (mais taxas), o empreendimento tem móveis de Lina Bo Bardi e Paulo Mendes da Rocha e, no restaurante, pratos como a ostra defumada com geleia de caju. O destino leva a marca Canopy, a bandeira de lifestyle do conglomerado Hilton, supostamente voltada a turistas que “querem se sentir um morador” da cidade — na prática, é um degrau menos luxuoso que os top de linha da rede.
No fim de semana passado (27 e 28), o Canopy decidiu suspender temporariamente as reservas, afinal São Paulo se encontra na fase mais devastadora da pandemia de Covid-19 (os hotéis, considerados serviços essenciais, podem seguir abertos). Não tinha nenhum hóspede naquele momento. É um bom resumo do dilema que o setor enfrenta na cidade: projetos grandes e luxuosos chegam por aqui, enquanto o próprio empresariado do segmento tem dúvidas sobre o futuro das viagens para a capital.
O Canopy não está sozinho na aventura. O Cidade Matarazzo, megaprojeto encabeçado por um empresário francês nas franjas da Avenida Paulista, promete inaugurar ainda neste ano o Rosewood Hotel, que vai ocupar o prédio da antiga maternidade Condessa Filomena Matarazzo. Os 46 quartos já contam com os mármores dos banheiros e a brasserie está praticamente pronta, o que inclui paredes com pinturas de Fernando de La Rocque, um dos cinquenta artistas que terão obras exclusivas no local.
+Assine a Vejinha a partir de 6,90.
O grupo Fasano também tem duas inaugurações no radar: um hotel no Itaim — onde a grife pretende mesclar seu público de grã-finos aos executivos da Faria Lima — e outro anexo ao Shopping Cidade Jardim, cuja estrutura será “acoplada” à fachada do empreendimento da Marginal Pinheiros. (O projeto do Itaim inclui uma torre residencial onde os apartamentos custam 43 300 reais o metro quadrado e estão 83% vendidos.)
O setor do turismo, porém, lança prognósticos sombrios sobre o futuro da atividade. A capital sempre dependeu, em grande medida, das viagens de negócios. “Elas garantem mais de 70% das hospedagens”, diz Orlando de Souza, presidente do Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil, que representa 104 hotéis em São Paulo.
Para Orlando e outros porta-vozes do setor, o filão corporativo terá problemas mesmo após a pandemia. “Ele será duramente afetado por fatores como o home office, a resistência de grandes empresas às viagens de executivos e o colapso do mercado de eventos, um dos mais afetados na crise”, diz Gervásio Tanabe, presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens Corporativas. “A tecnologia supriu necessidades das empresas. O turismo corporativo não voltará a ser o que era”, completa Ricardo Roman Júnior, presidente da divisão paulistana da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis. “Isso vai afetar a hotelaria toda, porque os clientes serão disputados pelos hotéis corporativos mais vazios.”
Para não terem o fim do Four Seasons (que em dezembro fechou a suntuosa unidade inaugurada dois anos antes perto do Shopping Morumbi), os projetos apostam em inovação e paciência. “São tacadas de longo prazo. São Paulo tem poucos hotéis que oferecem nossa experiência”, diz Constantino Bittencourt, sócio-diretor do Grupo Fasano. “Estamos otimistas. Vamos oferecer serviços que vão além de um hotel comum, como o wi-fi gratuito para a vizinhança e eventos artísticos”, conclui Cristiano Viola, gerente-geral do Canopy.
+Assine a Vejinha a partir de 6,90.
Hotel, sim. Mas sem o parque
O Cidade Matarazzo, projeto que vai revitalizar uma área de 27 000 metros quadrados próximo à Avenida Paulista, deve inaugurar seu hotel neste ano (destaque e visão aérea da maternidade Condessa Filomena Matarazzo, acima). Nas últimas semanas, porém, os responsáveis pela iniciativa anunciaram uma baixa.
O empreendimento não terá mais o Parque das Flores, um bulevar que ligaria o complexo à Paulista. Em dezembro, a arquiteta Adriana Leviski, responsável pela concepção do parque, disse a Veja SP que o investidor francês Alexandre Allard estava prestes a desistir da ideia, por causa de associações de moradores que se opunham à proposta. (Ela classificava o parque como “um presente de 130 milhões à cidade”.) Dito e feito. “Pela reação das entidades, entendemos que é melhor cancelar por ora (o parque)”, ele publicou em anúncio na última semana.
+Assine a Vejinha a partir de 6,90.
Publicado em VEJA São Paulo de 07 de abril de 2021, edição nº 2732