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OLÁ,

Natalie Klein, herdeira das Casas Bahia, construiu seu próprio reinado fashion

Exigente e determinada, a empresária de 33 anos diz não ter vocação para ser socialite

Por Alvaro Leme e João Batista Jr.
18 set 2009, 20h28

Terça-feira passada, saída do restaurante Gero, nos Jardins. Um ambulante tenta vender bilhetes da Mega-Sena a uma cliente que acaba de almoçar ali. “O prêmio é de 7 milhões de reais”, argumenta para a moça de camiseta preta e óculos escuros. Ele nem imagina estar diante da herdeira de uma das grandes fortunas brasileiras, o que não é raro quando se trata de Natalie Klein. Fora dos círculos de moda e de leitores atentos de coluna social, pouca gente sabe quem é e que cara tem a neta do fundador das Casas Bahia, rede de varejo que faturou 13,7 bilhões de reais em 2008. Esse jeito discreto, além, é claro, dos recursos familiares, ajudou-a a construir seu próprio patrimônio, a NK Store. As roupas que saltam aos olhos sem chamar atenção demais, exceto nos preços, colocaram a butique de luxo inaugurada por ela há doze anos no topo da lista de preferências das meninas e senhoras muito ricas de São Paulo. As clientes vão à loja da Rua Sarandi (que também tem entrada pela Haddock Lobo) até três vezes por semana há 15 000 delas cadastradas. Gastam, em média, 2 500 reais em cada visitinha dessas.

Se os cartões de crédito dessa turma tivessem limite, ele seria estourado com pompa e circunstância a partir da próxima sexta (23). É para quando está prevista a inauguração de mais um pedaço do minirreino fashion de Natalie: o primeiro endereço da badalada grife Marc Jacobs na América Latina. Instalada no imóvel de 360 metros quadrados onde outrora reluziam brilhantes da joalheria Tiffany, a loja abrigará criações do estilista americano antes vendidas apenas nos 1 050 metros quadrados da vizinha NK. “Fico emocionada por construir meu próprio caminho”, diz a empresária, em meio às obras. “Não tenho talento para socialite.”

Seja ao falar de tapumes, de uma sandália Givenchy ou de seus vinte cavalos, Natalie Klein não demonstra vestígio da imagem habitual das herdeiras. Naturalmente, teve tudo de melhor ao longo da vida, como qualquer nascida em berço de ouro. Mas não espere vê-la com um cachorrinho dentro da bolsa, apesar de ter seis totós, que reveza entre seu belo apartamento no Itaim e uma fazenda em Sorocaba. Sua afetação parece inversamente proporcional à fortuna. Nas viagens internacionais, quando não dá para pegar carona num dos aviões da família, nem cogita comprar bilhete para a primeira classe. “Fico confortável na executiva, pois sou pequenininha”, explica ela, que tem 1,61 metro de altura. “Até uns dez anos atrás, minha família viajava de econômica”, diz. E se por acaso você tem impressão de, certa feita, tê-la visto num vagão de metrô em Londres ou Nova York, saiba que provavelmente era ela, sim. “Se estamos no exterior a trabalho, usamos transporte coletivo sem drama”, afirma Thiago Costa Rêgo, diretor de marketing da NK e braço-direito da empresária.

Cair nas graças de um peso-pesado da moda internacional como Marc Jacobs serve para Natalie como um tapa com luvas (não necessariamente de pelica, já que a moça é desprendida) em parte da sociedade paulistana. Quando abriu a NK, em 1997, aturou muito patrulhamento pelo fato de ser neta de quem é. “Achavam que eu era só mais uma menina querendo brincar de lojinha”, lembra. Determinada, trancou o curso de arquitetura na Faap no último ano para dedicar-se ao negócio. Sim, o capital inicial veio do pai, Michael Klein, que investiu o equivalente a 1 milhão de dólares na empreitada, mas ela botou a mão na massa sozinha. “Decidi não me envolver na empresa da minha família, por isso não admitia a possibilidade de não dar certo”, diz. Vendia, no início, além das peças de sua própria marca, cinco grifes internacionais ? hoje são catorze, entre elas Stella McCartney, Missoni e Lanvin ?, em cujas portas foi bater munida somente de lábia, figurinos fantásticos e, vá lá, da confiança que só tem quem dispõe de um belo extrato bancário. “Natalie conhece muito bem suas clientes, que possuem perfil semelhante ao dela”, afirma a expert em moda Gloria Kalil. “Isso explica todo o seu sucesso.”

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Centralizadora, aprendeu a mandar ainda criança. Tinha 8 anos quando os pais se separaram e, na ausência da mãe, a decoradora Jeanete Roizman, virou “a dona da casa”. Aos 10, contratava as empregadas e governantas, a quem solicitava organizar a despensa em ordem alfabética. Se a lição de casa dos dois irmãos (ela é a filha do meio) não saía a seu contento, apagava tudo e mandava-os refazê-la. O caçula, Raphael, hoje trabalha como diretor de marketing da rede e o mais velho, Leandro, morreu em 2001, aos 27 anos, vítima de câncer. “Pode parecer piegas, mas meu grande sonho é ver as pessoas que amo com saúde”, diz ela. “Passamos por um inferno ao perder meu irmão.”

Quando começa a contar histórias de sua menina-dos-olhos, Michael Klein, seu tutor no mundo empresarial e sócio, fica emocionado de orgulho. “Hoje as pessoas a procuram por causa de seu brilho próprio, não por ser herdeira da Casa Bahia”, afirma. Pai e filha planejam, um dia, montar uma linha de roupas populares para vender nas lojas da rede de varejo. “Se ela quiser vir, mando instalar um escritório na hora”, diz, sem convicção de que isso possa acontecer de fato. Uma das poucas ocasiões em que Natalie trabalhou para o negócio da família foi aos 5 anos de idade: um comercial de televisão em que dividia a cena com Pelé. A brevíssima carreira de miniatriz deu lugar a muitas travessuras. Exigia os mesmos direitos que os irmãos. Se um deles ganhava uma mobilete, queria uma também. Não tinha medo de pular muros e fazer trilhas. O ônus dessa inquietação veio na forma de incontáveis fraturas, luxações e torções. Aos 15 anos, passou um mês no hospital após ser atropelada quando andava de moto. “Quase perdi a perna”, recorda. “Quebrei cada braço pelo menos duas vezes.” Depois de adulta (está atualmente com 33 anos), encarou o Rally dos Sertões e, adivinhe, capotou o carro e foi parar num hospital em Palmas, no Tocantins, de onde saiu com escoriações.

Na adolescência, driblava os seguranças, com quem odiava andar, para flanar ao lado das amigas ou dos namoradinhos sem supervisão. Uma de suas táticas era entrar no cinema e, cinco minutos após o início do filme, sair de fininho enquanto sua escolta a esperava lá fora. Hoje, jura, a necessidade de proteção não a incomoda mais. “Vivo num país em que as pessoas passam fome. Não posso reclamar de absolutamente nada”, afirma. Língua solta para falar de moda, estilo e negócios, ela controla muito bem as palavras (por motivos óbvios) se o assunto é segurança. Seu carro e algumas partes do apartamento onde vive são blindados e, se precisa ir a um prédio desconhecido, uma equipe visita o local previamente para avaliar o risco. Curiosamente, quem a vê pelas ruas ou caminha a seu lado não se dá conta de que há guarda-costas em volta. “Eles são treinados para ser invisíveis”, limita-se a dizer. Além de não facilitar a vida de malandros mal-intencionados, a tática garante a ela alguma privacidade. Evita, por exemplo, repetir episódios como o do dia em que comprava calcinhas numa loja e se deu conta de que a vitrine estava tomada por seguranças. “Mostrei uma peça e pedi a opinião deles”, brinca.

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Outro capítulo capaz de deixá-la monossilábica é sua vida amorosa. “Minha intimidade não é interessante,” explica. “Não sou famosa.” Proibiu veementemente o atual namorado, o estilista e empresário Tufi Duek, 54 anos, de fazer qualquer confidência sobre seu relacionamento. “Natalie é uma mulher muito inteligente e conseguiu criar uma loja parecida com ela: discreta, moderna e cool”, declara, obediente. Os dois começaram o namoro em meados de 2008, pouco depois de ela se divorciar do marido, Anuar Tacach, com quem ficou durante nove anos ? não tiveram filhos. “Conti-nua-mos amigos”, diz ele. Segundo Natalie, não sobraram traumas. “Meu fundo do poço é bem raso”, afirma. “Estou numa fase muito feliz, tanto pessoal quanto profissional”, prossegue ela, e volta a falar do que realmente gosta: bons negócios. “Quero, daqui a dez anos, continuar a ter nas mãos as grifes mais legais do mundo. Meu sonho é ser na moda o que meu pai é no varejo.”

O que é que a NK tem

Alguns dos looks que fazem o sucesso da butique, exibidos por clientes bacanas

Do total de vendas da NK Store, 80% são da marca própria ou de sua segunda linha, a Talie. O restante é dividido por três grifes brasileiras e outras catorze internacionais; essas últimas, como na concorrente Daslu, costumam ter preços mais altos que as etiquetas nacionais devido às taxas de importação e ao câmbio. Combinar com maestria diferentes elementos de todas elas é o ingrediente fundamental da receita de moda de Natalie Klein. As três editoras de moda ouvidas por Veja São Paulo utilizaram a mesmíssima palavra para se referir à moça e seu guarda-roupas: cool. “Ela sempre fugiu do estilo de quem quer aparecer”, define Lilian Pacce, do jornal O Estado de S. Paulo. “Ostentar é cafona. Hoje, as pessoas não compram as coisas para se mostrar aos outros”, concorda Natalie.

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