Lembrado por seus hóspedes ilustres e com arquitetura única, o Hotel Maksoud Plaza está sendo cobrado na Justiça pela prefeitura de São Paulo por dívidas milionárias de impostos. O Fisco municipal ajuizou uma ação em dezembro cobrando da holding Hidroservice Engenharia, que controla o hotel, mais de 4,9 milhões de reais em IPTU, mas ainda há outras dívidas que somam 3,1 milhões de reais, segundo informou a prefeitura à Justiça.
Em recuperação judicial desde 2020 e fechado desde 2021, o hotel acumula dívidas com trabalhadores, fornecedores, prestadores de serviços e com o poder público, em uma história que ainda envolve brigas entre familiares e herdeiros.
Hoje lacrado e de portas fechadas, o prédio de 22 andares na Rua São Carlos do Pinhal, Bela Vista, foi um símbolo de uma São Paulo luxuosa das décadas de 80 e 90, sendo palco de apresentações de Frank Sinatra, além de ter hospedado artistas famosos e abrigado restaurantes e bares. Mas dificuldades financeiras começaram a aparecer nos anos 2000.
Em 2011, o hotel foi leiloado para pagar dívidas trabalhistas (sob questionamentos judiciais dos donos do hotel). Em 2014, o fundador, Henry Maksoud, morreu e seu neto, Henry Maksoud Neto, assumiu a gestão do local, prometendo fortalecer o império, enquanto Claudio e Roberto, filhos do fundador, questionavam o destino da herança. Em dezembro de 2021, a Justiça finalmente validou o leilão e o hotel foi fechado. Um mês depois, foi entregue aos novos donos, Jussara Simões e Fernando Simões, irmãos e acionistas da Simpar.
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A holding chegou a somar dívidas de 845 milhões de reais ao todo, entre débitos fiscais, trabalhistas e a outros credores, mas o valor foi reduzido com renegociações. A Fazenda Nacional, por exemplo, cobra do Maksoud 52,8 milhões em impostos. Em outubro, uma decisão da 8ª Vara de Execuções Fiscais Federal da capital determinou o pagamento imediato do valor.
Ao saber dessa decisão, a prefeitura de São Paulo pediu, na ação da recuperação judicial, para ter seus débitos quitados imediatamente, argumentando que isso significaria uma preferência dos tributos federais sobre os municipais, o que seria ilegal. O juiz negou o pedido por entender que o Maksoud vem pagando em dia todos os seus parcelamentos e que a prefeitura vai receber devidamente.
A prefeitura então ajuizou uma ação de execução fiscal cobrando os valores imediatamente, e ainda aguarda decisão, sem prazo para acontecer. Consta na Dívida Ativa do município que a Hidroservice, controladora do hotel, deve 41 milhões de reais em IPTU, mas a maior parte foi renegociada por meio de acordo de Programa de Parcelamento Incentivado (PPI).
Procurada, a Procuradoria-Geral do Município informou que não pode detalhar as dívidas do Maksoud por causa do sigilo fiscal, mas disse estar “acompanhando todos os feitos relativos ao contribuinte e atua manejando os recursos cabíveis, sempre que proferidas decisões contrárias ao seu interesse e dos munícipes”. O órgão explicou que a holding tem apenas um acordo PPI vigente, já que os outros foram rompidos por atrasos nas parcelas.
A reportagem tentou contato com a Hidroservice por telefones disponíveis na internet, mas não foi atendida. A Vejinha ainda contatou o advogado que representa a empresa no processo de recuperação judicial, mas ele informou que não cuida da parte fiscal e por isso não se manifestaria. No dia 1º, a empresa relatou já ter gastado 52 737 533,35 reais com dívidas e pagamentos relacionados à operação da empresa e pediu mais 28 milhões para os pagamentos dos próximos meses, o que foi autorizado pela Justiça.
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A Vejinha apurou que a cobrança da prefeitura se deu porque o Maksoud teve atraso na liberação de valores para pagar as parcelas do acordo com o município. Entretanto, após alguns leilões de objetos e móveis do hotel terem sido realizados, o Maksoud agora tem o dinheiro e já informou à Justiça que conseguirá pagar o que deve de impostos municipais, aguardando apenas a liberação do juiz responsável pela recuperação judicial. Em relação aos tributos federais, o valor já foi quitado.
Em paralelo, há anos familiares brigam pelo destino da herança de Henry Maksoud. Uma ação ajuizada por Roberto, apoiado por Claudio, questiona até a veracidade da assinatura do fundador do hotel em seu testamento, que deu a maior parte da herança ao neto homônimo e à viúva Georgina Célia Maksoud.
Também houve questionamentos em relação à decisão de Henry Neto de ter pedido recuperação judicial, e em outras ações se discute o inventário dos bens de Maksoud pai. Os parentes travam uma guerra de versões em diversos procedimentos judiciais e, por causa das divergências, juízes já nomearam, mais de uma vez, pessoas de fora da família para fazer o inventário do falecido dono do hotel. Esses processos ainda estão em tramitação, a maioria em segredo de Justiça.
LEILÕES
Desde que o hotel entrou em recuperação judicial, já foram realizados diversos leilões para vender de móveis a obras de arte, de itens de cozinha a computadores. O leilão mais recente ocorreu no último dia 6 de fevereiro e contou com quadros de artistas brasileiros como Emanoel Araújo (morto em setembro de 2022), Marysia Portinari e Maria Bonomi.
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Outros destaques desse leilão foram três pianos, um deles avaliado em 300 000 reais. O motivo do alto valor? Trata-se de um luxuoso Steinway & Sons Modelo D, que foi usado por Frank Sinatra na ocasião de seus shows no hotel Maksoud Plaza em 1981. Ainda não foi divulgado o valor arrecadado com essas vendas. Outro leilão, realizado em outubro, vendeu móveis e outros itens mais simples do hotel e arrecadou 144 152,73 reais.
Em nota após a publicação, a assessoria do hotel afirmou que as dívidas não são todas do hotel, mas também da Hidroservice, e que as dívidas com o poder público estão quitadas, com a exceção justamente das dívidas do IPTU referentes a 2021 e 2022. “Ambos não foram pagos porque houve atraso da Justiça em liberar valores arrecadados com a venda de imóveis (como a própria antiga sede do Hotel) da Hidroservice”. O hotel ainda diz que, em relação aos tributos federais, quando a Fazenda Nacional soube da conclusão do trato para a venda da antiga sede do hotel, pediu, conforme previsto no acordo de parcelamento dos débitos, “a antecipação do pagamento de uma garantia do acordo, vinculada àquele prédio (o restante da dívida parcelada está vinculada a outros imóveis, ainda não vendidos), justamente no valor de R$ 52,8 milhões”.
*A reportagem foi alterada em 24/2, às 18h12, para corrigir a informação de que o hotel somava dívidas de 845 milhões. O valor era devido pela holding como um todo, e não só pelo hotel.
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Publicado em VEJA São Paulo de 1° de março de 2023, edição nº 2830