Nos tempos áureos de poder, quando estava à frente do Banco Santos, o empresário Edemar Cid Ferreira montou uma das adegas mais incríveis do país. As preciosidades ficavam estocadas em sua mansão no bairro de Cidade Jardim. A instituição financeira faliu em 2005, deixando um rastro de dívidas de quase 3 bilhões de reais. Condenado a 21 anos de prisão por gestão fraudulenta e formação de quadrilha, entre outros crimes, Edemar chegou a ficar 89 dias na cadeia em 2006, mas hoje recorre em liberdade da sentença. Na semana passada, a Justiça iniciou a venda de bens pessoais do ex-banqueiro com o objetivo de ressarcir os seus credores. O processo começou justamente pelos valiosos rótulos de bebida. Das 1.200 garrafas disponíveis, 1.079 foram arrematadas por 510.000 reais num leilão on-line que durou três dias. Apesar do início promissor, a novela está longe de acabar.
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Há algum tempo, o ex-banqueiro vem travando uma batalha com o executivo Vânio Aguiar, que administra a massa falida do Banco Santos. Edemar entrou com uma ação para impedir o leilão das bebidas, alegando que parte delas havia se estragado por falta de conservação adequada. Mesmo derrotado, promete voltar à carga agora, pedindo a anulação da venda. Segundo ele, falta de cuidados na manutenção também teria comprometido seu acervo de obras de arte. Quando foi despejado da mansão da Cidade Jardim em 2011, deixou por lá 600 peças avaliadas em 20 milhões de reais. O culpado por todos esses problemas, na sua opinião, é Vânio Aguiar. “Ele desligou o sistema de refrigeração da casa e estragou minha coleção”, reclama. Aguiar diz que tudo não passa de uma estratégia para embaralhar o processo. “Os problemas já ocorriam desde a época em que Edemar morava na residência, que mais parece uma estufa”, rebate. “Ele quer dificultar o pagamento de suas pendências.”
Algumas peças realmente estão com problemas sérios, conforme atestam várias análises técnicas. Em abril, Aguiar ofereceu o acervo ao Museu de Arte Contemporânea (MAC) em caráter de guarda provisória. Os responsáveis pela entidade, porém, descartaram o negócio depois de fazer uma vistoria no material. De um total de 312 peças avaliadas, 133 estavam com avarias, como a presença de fungos. “Não é possível dizer se o lote já sofria com isso no tempo em que estava sob a guarda de Edemar”, diz Tadeu Chiarelli, diretor do MAC. Por determinação da Justiça, o museu cuida de outras 1.500 obras da coleção do ex-banqueiro desde 2005.
Outras perícias, no entanto, dão pistas de que ao menos parte do estrago teria ocorrido recentemente. Indicado por Régis Rodrigues Bonvicino, juiz da 2ª Vara Cível de Pinheiros, o perito Alberto Sauro avaliou os bens logo após o despejo. “Fora o ladrilho assinado por Burle Marx, localizado no heliponto, o acervo encontrava-se intacto”, lembra. De acordo com o especialista, o administrador da massa falida orientou os funcionários da mansão a desligar o sistema de ar condicionado, de modo a reduzir as despesas com a conta de luz, na casa dos 20 000 reais por mês. Isso teria iniciado os problemas que afetaram os bens. “É mentira”, afirma Aguiar. “Quando assumi o caso, os equipamentos já estavam parados, pois o Edemar não tinha mais dinheiro para gastar com a manutenção da residência. Só de IPTU havia uma dívida de 5 milhões de reais.”
Funcionário de carreira do Banco Central aposentado no ano passado, Aguiar ganha 30.000 reais para cuidar do caso. Embora não o critiquem publicamente, muitos dos credores, principalmente os ligados a empresas de São Paulo, andam inquietos com sua atuação. “Ele recebe bem, mas cuida de outros oito processos de falência e está dando pouca importância ao caso do Banco Santos”, afirma um deles. Aguiar não concorda com a crítica. “Dedico 75% do meu tempo a essa causa e zelo pelos bens com muita atenção.”
PRECIOSIDADES ARREMATADAS
O resultado da venda ocorrida na semana passada
■ Total arrecadado: 510.000 reais
■ Quantidade de garrafas vendidas: 1.079, quase 100% dos 143 lotes oferecidos
■ Lote mais caro: 11.420 reais, por onze garrafas de champanhe Cristal
■ Lote mais barato: 760 reais, por sete garrafas de vinho do Porto