A partir da década de 80, a Represa de Guarapiranga entrou em processo de decadência e, ano após ano, viu seu potencial turístico e esportivo ser tragado por invasões imobiliárias, comércios irregulares e degradação ambiental. Desvalorizada, a região começou a assistir ao surgimento de várias favelas ao lado de condomínios e casas de luxo. Espalhado por uma área de 36,6 quilômetros quadrados no extremo sul da metrópole, o reservatório, que fornece água a 3,5 milhões de pessoas, ficou praticamente abandonado durante muito tempo. Felizmente, esse quadro está começando a mudar.
+ Tietê: não podemos desistir dele
A virada teve início em 2007, com uma parceria entre prefeitura e governo estadual. Batizada de Operação Defesa das Águas, ela tem evitado novas construções, removido famílias instaladas ilegalmente, demolido estabelecimentos, ampliado a rede de saneamento e construído parques em sua margem com o objetivo de revitalizar o local. Com isso, aos poucos, a Guarapiranga tem voltado a atrair os paulistanos a seus restaurantes, cursos de vela e clubes náuticos à beira da Avenida Atlântica, em Interlagos. “Trabalho em Santo Amaro, a vinte minutos de carro, e venho almoçar aqui uma vez na semana porque me desligo da correria de São Paulo”, conta o empresário Júlio Batista Neto, de 36 anos.
+ Sabesp retira 1.000 toneladas de plantas da Represa de Guarapiranga
Parte do programa previa a construção de oito parques ao longo de 12 quilômetros de extensão da Atlântica. Seis deles já foram entregues à população, consumindo um investimento de 15 milhões de reais. Durante os trabalhos, sumiram do pedaço estabelecimentos irregulares (duas boates e alguns trailers) e ocorreu a desapropriação de imóveis (dois motéis e um clube de golfe, entre outros) que impediam o acesso às praias e bloqueavam a vista. No lugar das paredes, surgiram gradis, quadras esportivas, playgrounds e academias ao ar livre.
Todos dispõem de banheiro e contam com equipe própria de administração. Funcionam tanto no período de seca quanto no da cheia. Os dois últimos parques ainda não têm previsão de entrega, assim como o término de uma ciclovia que deve acompanhar toda a orla, somando 12 quilômetros de comprimento. Até o momento, foram concluídos apenas dois trechos da obra — o primeiro, de 1,2 quilômetro, e o segundo, de 5 quilômetros.
“A ideia com todas essas melhorias é transformar a represa numa verdadeira praia paulistana”, diz o subprefeito de Capela do Socorro, Marco Antonio Augusto. Para que se chegue a esse estágio, ainda restam muitos desafios. O principal deles envolve a melhoria da qualidade da água. É comum os frequentadores encontrarem muitos detritos por ali, como pneus abandonados e garrafas PET. “Os maiores vilões são o esgoto doméstico e a sujeira que vem com as chuvas”, afirma Ricardo Araujo, coordenador do programa Mananciais, da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), que começou a ser implantado em 2007 na região. Para vencê-los, a empresa atua em duas frentes: faz obras de saneamento na região e evita a entrada de lixo no reservatório.
Em cinco anos, ela beneficiou 390.000 pessoas com rede de esgoto e despoluiu doze rios. Hoje, 70% dos 900.000 moradores do entorno têm infraestrutura de saneamento básico (o índice em 2009 era de 50%). No fim do ano passado, foram instaladas redes de contenção em onze córregos da Guarapiranga. Chamadas de ecobarreiras, elas evitam que 21 metros cúbicos de lixo (de carcaças de computador a pedaços de móveis), o suficiente para encher um caminhão basculante, alcancem o reservatório diariamente. Em paralelo a esse trabalho, há um esforço para impedir o surgimento de construções clandestinas. “Desde 2007, mantemos um contingente de guardas na região, que fazem rondas a pé, de barco, viatura e helicóptero, para coibir a invasão de terrenos”, diz Edsom Ortega, secretário municipal de Segurança Urbana.
Com a fiscalização, de lá para cá, 2438 imóveis ao redor da Guarapiranga foram demolidos. Algumas das melhorias ainda não são perceptíveis aos moradores e visitantes. Na década de 90, a represa recebia por dia 400 quilos de fósforo (nutriente presente no esgoto doméstico que contribui para a proliferação de algas). Foi a época em que o reservatório viveu sua maior crise. A contaminação era tanta que as plantas entupiam a tubulação e causavam problemas de manutenção. Atualmente, a entrada do elemento é 35% menor. No último boletim emitido pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), em maio deste ano, das seis praias da represa, duas estavam impróprias para banho. Na década de 90, porém, o quadro era ainda pior: quase 100% delas nem sempre ofereciam condições de balneabilidade. Até 2015, a meta da Sabesp é reduzir a entrada de fósforo no reservatório para, no máximo, 147 quilos por dia. A Guarapiranga, então, poderá respirar ainda melhor.
MELHORIAS SOCIAIS E AMBIENTAIS
– Em cinco anos, mais de 2.400 imóveis irregulares foram demolidos no entorno da represa (as famílias acabaram realocadas por programas da prefeitura)
– 390.000 pessoas foram beneficiadas com redes de esgoto
– A entrada de fósforo na represa é 35% menor que há vinte anos. Presente no
esgoto doméstico, ele é um forte indício de má qualidade da água e o responsável
pela proliferação de algas no local
– A instalação de redes, em onze córregos que desembocam na represa, evita a entrada de 21 metros cúbicos