Em meio ao cinza predominante da Avenida Juscelino Kubitschek, o restaurante Kaá parece miragem. Um exuberante salão de 700 metros quadrados, ladeado por um jardim vertical com 7 000 plantas típicas da Mata Atlântica, impressiona logo de cara. Nos Jardins, o restaurante do Hotel Emiliano atravessa uma silenciosa revolução de legumes. Inspirado por O Dilema do Onívoro, livro do jornalista americano Michael Pollan sobre hábitos alimentares, o chef José Barattino não só adotou ingredientes orgânicos como passou a encomendar a pequenos agricultores nos arredores de São Paulo as hortaliças servidas nos refinados pratos que prepara. O que une as duas histórias? Além, claro, de receberem públicos parecidos, ambos escolheram iniciativas ecologicamente corretas como diferencial, aposta cada vez mais comum. “Adotar critérios de sustentabilidade é questão de sobrevivência, não só do planeta, mas das empresas de luxo”, diz Luciana Betiol, vice-coordenadora do MBA em Gestão de Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas.
Apesar de muitas empresas ainda caminharem a passos de tartaruga quando se trata de proteção ao meio ambiente, começam a surgir na cidade iniciativas interessantes. Um exemplo é a iluminação do Club A, point de milionários inaugurado em outubro, que consome menos energia elétrica graças a 2 000 lâmpadas LED. A economia, de 20 quilowatts por hora, daria para manter acesas quatro boates do mesmo porte. O salão de beleza do cabeleireiro
Marcos Proença, no Jardim Europa, tem apenas madeira certificada ou de demolição. Aliás, a Casa Cor, a maior feira de decoração do país, escolheu sustentabilidade como tema de sua edição deste ano. No começo de 2010, chega a São Paulo o, por assim dizer, irmão hippie da Mercedes-Benz S400. Além do motor a gasolina, terá outro, elétrico. Estima-se que o preço final bata os 500 000 reais, 100 000 a menos que seu equivalente movido exclusivamente a gasolina. O consumo de combustível é 26% menor, de 12,6 quilômetros por litro. A emissão de monóxido de carbono cai de 231 para 186 gramas por quilômetro rodado. A Audi, por sua vez, pretende trazer o e-tron em 2012. Com quatro motores elétricos e bateria de 313 cavalos, o modelo promete ser tão veloz quanto silencioso. “É uma experiência nova para os apaixonados por esportivos”, afirma Paulo Kakinoff, presidente da empresa no Brasil.
E pensar que, não faz muito tempo, a simples menção da palavra “orgânico” acionava os alarmes contra ecochatos…Esse cenário começou a mudar quando se falou em economia. Claro, salvar o planeta para gerações futuras motiva qualquer um. Se der para engordar o caixa durante o processo, tanto melhor. Para início de conversa, convenhamos que pega muitíssimo bem para qualquer marca — da Coca-Cola à bodega da esquina — ser vista como amiga da natureza. Aí já se vão milhares de reais economizados em propaganda. E quão sedutor, aos ouvidos de um empresário, soa o argumento número 1 da reciclagem, o de transformar lixo em dinheiro? Defensor de primeira hora das ecocausas, o estilista e empresário Carlos Miele começou utilizando fios confeccionados com plástico de garrafas PET nos jeans e agora produz peças feitas de sarjas orgânicas e tingidas naturalmente. Restos de tecido que seriam descartados viram longos de fuxico, artesanato que precisa apenas de retalhos. “É a nossa alta-costura”, diz. Em março de 2010, sua loja da Rua Bela Cintra passará a ter painel para captar energia solar, sistema de reutilização da água da chuva, pintura feita com tinta à base de água e decoração exclusivamente com móveis de madeira reciclada. Isso representará uma economia estimada em 300 000 reais na reforma do imóvel, além de gastar 10 000 reais a menos por mês com o funcionamento da butique. “A palavra luxo voltou a significar algo especial, não apenas um símbolo de status”, afirma Miele.
Num seminário sobre luxo verde realizado em março último pelo jornal inglês International Herald Tribune, François Pinault, presidente do grupo que detém as marcas Gucci e Bottega Veneta, confirmou que o alto grau de exigência do consumidor AAA obriga os executivos a jogar limpo com os funcionários e o meio ambiente. Isso explica, em parte, o fato de a Tiffany & Co. só comprar diamantes certificados pela Kimberley Process, cooperativa internacional de monitoramento da origem das pedras. A ideia é evitar matéria-prima oriunda de zonas de conflito, que poderia financiar violência e agressão ao meio ambiente. Do lado de cá do balcão, as coisas não são bem assim. Mesmo que o consumo consciente tenha virado moda, muita gente compra peças sem se preocupar com a sua matéria-prima nem com o impacto delas para o planeta. Diante de um casaco Stella McCartney, exemplo de moda sustentável, e outro de marca que não se preocupa com tingimentos naturais ou fios orgânicos, a consumidora compra o que melhor combinar com seu gosto. “Infelizmente, ainda temos um longo caminho para que esse critério pese na escolha”, diz Natalie Klein, da NK Store, que vende a grife no Brasil.