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Facundo Guerra, o novo reizinho da noite

Histórias, manias e estratégias do empresário à frente de quatro bem-sucedidas casas na cidade

Por Carolina Giovanelli e João Bastista Jr.
Atualizado em 14 Maio 2024, 12h17 - Publicado em 9 jul 2011, 00h50
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  • Dentro da riquíssima galeria de personagens que fizeram e fazem sucesso agitando a noite paulistana, Facundo Guerra, um argentino nascido em Córdoba e radicado no Brasil desde 1976, já merece um capítulo exclusivo. Ele entrou no ramo por acaso, depois de perder o emprego de executivo que lhe rendia um salário mensal de 10.000 reais e de uma tentativa frustrada de se associar a uma marca de roupas. Mesmo sem experiência no mercado da boemia, topou o convite de um amigo para virar sócio de uma boate construída dentro de um galpão de 400 metros quadrados onde funcionava uma oficina de carros, na parte central da Rua Augusta, ao lado de inferninhos, hotéis de alta rotatividade e botecos vagabundos.
    + Os principais negócios de Facundo Guerra+ A turma das baladas de Facundo
    Surgia assim o Vegas, que virou sucesso instantâneo. Desde o começo, a pista embalada por DJs internacionais mistura uma fauna variada que inclui patricinhas, garotos com piercings e alternativos de todas as vertentes. A vizinhança um tanto degradada acabou dando um charme extra à balada. Ali por perto, o empresário fez outras investidas certeiras, inaugurando, quase na sequência, os bares de estilo moderninho Z Carniceria e Volt. Por último, abriu na Avenida Brigadeiro Luís Antônio, também no centro, o Lions, clube igualmente concorrido. Juntas, essas casas reúnem por mês um público de cerca de 25.000 pessoas, entre elas algumas celebridades como a modelo Mariana Weickert e a atriz Alessandra Negrini. É muita gente. Corresponde a quase metade das cerca de 60.000 pessoas que frequentam as outras seis principais boates da capital: Clash, D-Edge, Estúdio Emme, The Week, Disco e Kiss & Fly.
    + A evolução da noite paulistana
    O criador desse circuito se mantém avesso às madrugadas, não bebe nada que seja alcoólico e só se permite, de vez em quando, dar umas baforadas em cigarros convencionais. “Até hoje me sinto um estranho na noite”, afirma Facundo, que ganha com seus negócios, calcula-se, em torno de 40.000 reais por mês (ele não desmente nem confirma). Aos 37 anos, mora numa casa no bairro do Pacaembu com o avô materno, vendedor de balas de coco no centro. Aboletado em uma de suas motos antigas (tem uma Honda Dominator 1952, uma Norton Commando 1971 e uma Triumph Bonneville 1969), ele chega por volta das 9 horas ao escritório, localizado em um andar acima do Lions. Trabalha com uma equipe de dezesseis pessoas e de sua mesa, que fica num dos cantos do ambiente todo envidraçado, é possível avistar a Catedral da Sé.
    Até as 21 horas, entra e sai de reuniões, cuida de problemas nas obras, fala com promoters e negocia contratos com DJs. Ultimamente, boa parte da rotina é consumida com os preparativos para três novos negócios, com inauguração prevista para novembro. Somados, os investimentos devem ultrapassar 1,4 milhão de reais. Dois deles serão na capital: a boate Yatch, no Bixiga, decorada com motivos náuticos e voltada para o público gay, e uma casa de shows de 1.000 metros quadrados na Liberdade, ainda sem nome definido. O terceiro projeto, batizado de Pan Am e inspirado na falida companhia aérea americana fundada na década de 20, representará a primeira empreitada dele na noite do Rio de Janeiro. “O Facundo é bastante audacioso”, afirma o concorrente André Almada, nome por trás das baladas The Week e The Society.
    + Baladeiros de plantão: 15 lugares para comer de madrugada+ Augusta 24 horas: a rua que nunca dorme+ O universo das baladas AAA
    A abertura do Vegas contribuiu para uma certa revitalização da região do Baixo Augusta, quadrilátero delimitado pela Avenida Paulista, Rua Augusta, Praça Roosevelt e Rua da Consolação. Essa área sempre teve uma vida boêmia, mas hoje se tornou um polo de entretenimento noturno da cidade, com mais de cinquenta baladas, restaurantes e bares. “Seu mérito é ter atraído jovens que não estavam acostumados a frequentar aquela região”, diz Andrea Matarazzo, secretário estadual da Cultura. No momento, está em construção um condomínio residencial com 200 apartamentos no cruzamento da Augusta com a Dona Antônia de Queirós. “É o primeiro lançamento por lá em mais de 25 anos”, afirma Luiz Paulo Pompéia, diretor da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio. O metro quadrado das unidades está cotado a 10.000 reais, valor compatível com o de bairros como Moema e Pinheiros.
    Curiosamente, essa valorização teve também um impacto negativo no bolso do responsável pelo fenômeno. “De 2005 para cá, o aluguel do espaço do Vegas mais que triplicou”, diz Facundo, que desembolsa atualmente 10.000 reais por mês pela locação. Com a expansão de seu pequeno império de negócios no pedaço, sua vida pessoal acabou ficando também concentrada lá. Duas vezes por semana, faz aulas numa academia de boxe na Augusta, quase sempre almoça num boteco próximo ao Lions e comprou com os lucros de suas casas noturnas um apartamento de 120 metros quadrados na Rua Bela Cintra (no trecho do centro, não dos Jardins).

    Marcos Suguio/Fotosíntese

    Cada coleção: Relógios de pulso com iluminação de LED fabricados entre 1969 e 1978, de marcas como Omega e Bulova, e animais empalhados fazem parte dos acervos que mantém em sua casa, no Pacaembu

    Com uma obsessão por quinquilharias de todos os tipos, que o leva a colecionar desde selos até relógios antigos com iluminação de LED, Facundo foi o autor das decorações exóticas que ajudaram a transformar seus negócios num sucesso. Partiu dele, por exemplo, a ideia de comprar os neons fincados nas portas dos inferninhos da Augusta, que faliram ou tiveram de se adaptar à Lei Cidade Limpa. Hoje, as peças decoram as paredes e o teto do Volt. No Lions, cujo ambiente faz referências a clubes masculinos ingleses, em meio a lustres dourados e cortinas de veludo, há vários animais empalhados, outra de suas paixões pouco convencionais (na casa do Pacaembu, ele possui um acervo com trinta espécies, entre aves, mamíferos e peixes). “Gosto de dar chance a objetos que ficaram obsoletos rapidamente”, afirma.

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    Marcos Suguio/Fotosíntese

    Capa 2225 - Facundo Guerra - Vanessa Rozan
    Capa 2225 – Facundo Guerra – Vanessa Rozan ()

    Ele tem dona: o Don Juan da noite desperta olhares de mulheres (e homens), mas namora desde janeiro a maquiadora Vanessa Rozan

    Engenheiro formado pelo Instituto Mauá de Tecnologia, faz no momento um doutorado em ciência política na PUC. Outro assunto que leva a sério é moda. Gosta de ternos sob medida, camisas com abotoaduras (algumas com formato de inseto) e anéis de cobre comprados no site eBay. “Sou hétero, mas tenho uma estética gay”, define-se. Namora desde janeiro a maquiadora Vanessa Rozan, que se desmancha em elogios ao parceiro: “Ele é inteligente e tem a cabeça voltada para o futuro”.
    Ele conta que, antes de virar o nerd que deu certo na noite paulistana, foi vítima de bullying por ser sempre o diferente da turma, sobretudo na adolescência. Nas escolas onde estudou, Mackenzie e Bandeirantes, era alvo de piadas por causa do sotaque argentino. “Certa vez me jogaram numa lata de lixo”, afirma. Quando começou a investir no circuito de casas noturnas, também parecia um forasteiro numa seara dominada no passado por festeiros como Ricardo Amaral e José Victor Oliva, responsáveis pelo sucesso do Hippopotamus, do Gallery e de outros endereços que tinham uma frequência mais rica, mais velha e mais convencional. “Nos anos 80, tudo era muito mais glamouroso, meus clientes caprichavam na roupa, faziam penteados e usavam joias de verdade”, lembra Oliva. Facundo não se importa com esse tipo de comparação. “Ajudei a noite de São Paulo a atingir o status de melhor do mundo”, exagera.
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    Até agora, sua fórmula de negócios era baseada em parcerias com sócios, entre os quais o empresário José Tibiriçá, seu maior aliado. Os dois se completam: enquanto Facundo cuida da administração e funciona como uma espécie de relações-públicas, Tibiriçá toca os negócios madrugada adentro. Mas a sociedade está prestes a acabar. Os pormenores da separação ainda não estão definidos. “Minha atual relação com ele é de faísca com câmara de combustão”, diz Facundo. “Não falamos mais a mesma língua.” A recíproca é verdadeira. “Casamento não termina? Foi isso que aconteceu”, esbraveja Tibira, como o empresário é mais conhecido. “Vou voltar para o underground, de onde vim. Cansei de balada grande.”
    Não é de hoje que ocorrem atritos entre a dupla. Muitos deles se devem às metas e personalidades opostas de cada um. Tibira, que quase sempre usa tênis, jeans, camisetas folgadas e bonés, foge dos holofotes e quer investir em projetos que tenham mais a ver com a sua turma do rock. Acaba de inaugurar o Caos, aconchegante clubinho também na Rua Augusta com capacidade para apenas 120 pessoas. Enquanto isso, Facundo pensa em criar, até o fim do ano, a holding Grupo Vegas para unificar debaixo de um só guarda-chuva seus empreendimentos e servir de ponta de lança para as novas apostas. “O Baixo Augusta está saturado, virou simba safári: tem gente que vem de carro aqui só para ver as diferentes tribos andando nas calçadas e as filas das baladas”, afirma ele. “Quero conquistar agora outras regiões.” O reizinho da noite vai longe.
    FICHA DO REI DA NOITENome: Facundo Guerra RiveroIdade: 37 anosNatural de: Córdoba, na Argentina (radicado em São Paulo desde 1976)Altura: 1,85 metroPeso: 85 quilosEstado civil: namora há seis meses a maquiadora Vanessa RozanCasa: mora no Pacaembu com o avô materno, Dom Oscar, que vende balas de coco nas ruas do centro da cidadeFormação: engenharia de alimentos, pelo Instituto Mauá de Tecnologia; pós-graduação em jornalismo cultural; mestrado em ciências sociais; e atualmente cursando doutorado em ciência política na PUCNegócios: sócio das casas noturnas Vegas, Lions, Z Carniceria e Volt. Promete abrir no segundo semestre duas novas baladas, também na região centralFuncionários: 90 diretos e 210 indiretosPúblico mensal dos quatro clubes: 25.000 pessoas Atividade física: aulas de boxe duas vezes por semanaMotos: Honda Dominator 1952, Norton Commando 1971 e Triumph Bonneville 1969
    Tatuagens: cinco (uma reprodução de uma veia, que se desdobra em cefálica e basílica, no braço esquerdo, e quatro pintas pretas que fazem as vezes de mancha de nascença espalhadas pelo corpo)Pista de dança ideal: com bom sistema de som e DJ, excesso de bebida e nenhum tipo de rede social envolvido na divulgação da festa

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