Três em cada dez crianças até 12 anos apresentam distúrbios do sono. A frequência é ainda maior em bebês: quatro em cada dez deles não dormem bem. Em casos severos, o mal-estar com o travesseiro compromete o desenvolvimento dos pimpolhos. Afinal, durante a noite, eles assimilam o conhecimento aprendido ao longo do dia e secretam hormônios responsáveis pelo crescimento. Mas, para isso, não basta fechar os olhos. O cérebro precisa entrar em um estado tal que o torne capaz de atingir diversas fases do sono, do cochilinho às mais profundas. Quem apresenta problemas noturnos, como ronco, falta de ar, pernas inquietas, entre outros, pode até não acordar durante a noite, mas tem esse equilíbrio comprometido. “Há casos em que a criança não cresce, não ganha peso e ninguém pergunta como ela dorme”, afirma a neuropediatra Márcia Pradella-Hallinam, coordenadora do setor de pediatria do Instituto do Sono.
Os sinais mais comuns do problema podem ser sutis, como irritação e choro excessivos, agressividade, desconcentração, isolamento e, se a criança já está na escola, dificuldade de acompanhar o ritmo da classe. Há, porém, indícios mais óbvios, como o surgimento de olheiras. “Muitas vezes, a criança é rotulada como hiperativa, quando, na verdade, a agitação ocorre porque ela está dormindo mal”, diz Márcia. A boa notícia é que parte desses males passa com a idade. Antes disso, a adoção de uma rotina na hora de dormir pode ser a solução. “É necessário ensinar os filhos a gostar de dormir”, afirma o neuropediatra do Hospital Albert Einstein, Saul Cypel, coordenador do Programa de Desenvolvimento Infantil da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal. O médico orienta os pais a criar hábitos encadeados, numa espécie de ritual que antecede o sono. Pode-se dar banho, amamentar, colocar na cama e contar histórias. Nada de televisão. Ela até pode provocar certa sonolência, mas prejudica a qualidade do descanso.
Movimentos periódicos de membros
São pequenas contrações dos músculos que fazem com que as pernas e os braços das crianças se contraiam. Com isso, ela se debate durante a noite. Ao contrário do distúrbio das pernas inquietas, as contrações não acontecem durante o dia. O distúrbio, em geral, está ligado à baixa quantidade de ferro no organismo, o que pode ser checado com um exame de sangue e corrigido com a ingestão, por cerca de três meses, de suplemento vitamínico. Se as crises persistirem, também costumam ser indicados remédios semelhantes aos usados para tratar o mal das pernas inquietas, que agem no cérebro para regular a ação muscular.
Ronco
Uma vez ou outra, quando seu filho está muito cansado ou durante uma gripe, o barulho pode ser normal, mas, se ele ronca de três a quatro vezes por semana, é melhor procurar um otorrinolaringologista especializado em crianças. Em geral, o problema acontece quando há hipertrofia adenoide e amígdala, o que prejudica a passagem do ar. “ Para compensar essa falha, a musculatura das vias aéreas, como o nariz e a garganta, se relaxa”, afirma a neuropediatra Márcia Pradella-Hallinam. Esse processo pode não acordar a criança, mas certamente causa um tremendo mal-estar, aumenta o gasto de energia durante a noite e impede que os pequenos atinjam todos os estágios do sono. Há ainda roncos causados por doenças secundárias (rinite, asma, entre outras). Nesses casos, a orientação é procurar um especialista no mal que deu a origem a ele, como um alergista.
Sonambulismo
A criança senta-se, sai da cama, anda, fala, abre portas e não reage ao ser chamada. O sonambulismo é um distúrbio comum na fase pré-escolar e escolar e assusta os pais, principalmente porque a criança não se lembra de nada no dia seguinte. O melhor é cuidar da proteção do pequeno para que ele não se machuque durante o evento e conduzi-lo de volta à cama. Como outros problemas ligados ao amadurecimento do cérebro, a tendência é que ele suma logo sem provocar nenhum dano ao sonâmbulo. Mas, se o distúrbio alterar o bem-estar da casa ou comprometer a segurança da criança, deve-se procurar um médico. Nesses casos, costumam-se prescrever remédios da classe dos benzodiazepínicos, que agem nos neurônios, para estabilizar o sono.
Apneia
Doença que causa pequenas interrupções da respiração durante a noite, a apneia é mais frequente em crianças que têm o ronco agravado. Isso ocorre porque o problema piora a tal ponto que não há mais espaço nas vias aéreas para o ar passar. Outro fator de risco para o mal é a obesidade. A falha pode não levar ao despertar, mas interrompe o ciclo do sono. Quem sofre de apneia costuma ter olheiras, respirar pela boca, durante o dia, mostrar-se cansado aparentemente sem motivo, ficar desconcentrado e ter alterações de humor. O diagnóstico deve ser feito em um centro especializado em ciência do sono. O tratamento varia de caso para caso, de acordo com a origem da doença.
Pernas inquietas
Sabe aquela criança que não para de balançar as perninhas nem quando está concentrada lendo um livro? Então, ela faz isso porque sente incômodo nos membros, o que também acontece durante a noite e pode fazer com que demore para pegar no sono — mesmo depois de pequenos despertares antes do amanhecer. O difícil para os pais, no entanto, é descobrir o motivo que faz com que seu filho durma mal. Isso porque ele é quase imperceptível. Exceto se o garoto ou a garota relata uma sensação parecida com a de formigamento. “Tenho bichinhos andando nas pernas, mamãe”, dizem. Quando o transtorno é muito grande e persistente, os neuropediatras costumam indicar os remédios que agem no cérebro regulando os movimentos musculares.
Despertar confuso
Mais comum em recém-nascidos, esse mal não tem solução e passa logo, à medida que a criança cresce. No berço, o bebê inicia um choro intenso e inconsolável. Os pais pensam, primeiro, que o filhote acordou com problemas, daí o nome da doença. Quando veem que ele ainda está dormindo, acham que se trata de um pesadelo. O que fazer? Nada. O ideal é esperar e observar. Se, por um lado, a crise dura cerca de 15 minutos sob o olhar angustiado dos pais, por outro, pode chegar a mais de duas horas se eles resolvem colocá-lo no colo. “Como o cérebro não aprendeu ainda a passar de uma fase do sono para outra, é como se ficasse encalhado”, explica a neuropediatra Márcia Pradella-Hallinam. “Interferir, porém, costuma prolongar esse estágio”. Com o amadurecimento do sistema nervoso central, os episódios devem desaparecer.
Bruxismo
Dentes gastos, dores na face, no pescoço e na cabeça podem ser sintomas de bruxismo. As vítimas desse mal rangem os dentes ou apertam os maxilares um contra o outro enquanto dormem. Em crianças, costuma acontecer em uma fase da vida e desaparece logo, situações em que é considerado normal e não requer preocupação. O problema pode ser desencadeado, por exemplo, durante uma troca de dentes. Se for persistente, porém, o distúrbio pode prejudicar o ciclo do sono e a saúde bucal. Nessas situações, o aconselhável é procurar um ortodontista. Ele avaliará se é necessário adotar o uso de placas de acrílico ou aparelhos que protegem a arcada e relaxam a boca.
Insônia
Sim, criança tem insônia, mas, na maioria dos casos, ela está associada a hábitos inadequados e à falta de disciplina antes de dormir. Ocorre principalmente entre os bebês que se acostumam a depender de um adulto para dormir. São aquelas crianças, por exemplo, que só pegam no sono se forem embaladas no colo ou durante a amamentação. Também é comum em pimpolhos mais velhos que não têm hora para ir para a cama ou ficam até tarde em frente ao computador, ao videogame e à televisão. Reverter o problema não exige grandes esforços da medicina, mas requer rigor dos pais. É necessário adotar religiosamente uma rotina saudável durante a noite. Estabelecer horários fixos para pegar no sono e, antes disso, praticar atividades que acalmam, como tomar banho, ler histórias e tomar um leite.
Terror noturno
Para os pais, é o distúrbio mais assustador de todos. Comum na idade escolar e em adolescentes, ele aterroriza a casa inteira. Durante a noite, a criança fica agitada e, com os olhos arregalados, grita e chega até a pedir socorro. Mas nada de acordar. No dia seguinte, porém, ela não se lembra do que aconteceu. Os especialistas aconselham que, assim como ocorre com o sonambulismo, o melhor é manter a calma e não provocar o despertar. O mal costuma passar à medida que a criança cresce. Um especialista deve ser procurado se, no dia seguinte, seu filho demonstrar muito cansaço ou se as crises comprometerem o bem-estar familiar. Nessas situações, o médico pode prescrever remédios, como os benzodiazepínicos, que atuam nos neurônios regularizando o sono.