No dia 19, os paulistanos assistirão a uma cena inédita na paisagem da cidade. A raia da USP, uma faixa d’água de 2 quilômetros paralela ao Rio Pinheiros, será tomada por uma frota de setenta iates e embarcações de última geração. Pela primeira vez, o principal evento náutico da cidade, o São Paulo Boat Show, terá como palco esse cobiçado espaço da universidade, que tradicionalmente costumava rejeitar esses aluguéis mais comerciais.
As vinte fabricantes que pagam pela festa, assim, terão o privilégio — o inigualável charme — de exibir seus barcos dentro da água. Até o ano passado, o evento acontecia no Pavilhão Imigrantes. É um apelo importante, uma vez que a alma do Boat Show são as vendas (não é uma vitrine de inovações, como o Salão do Automóvel, por exemplo). O encontro responde por aproximadamente 35% desse comércio no país. Em 2019, movimentou 220 milhões de reais. Na edição atual, a organização calcula que esse valor chegará a 260 milhões.
A alta seria explicada porque, apesar da recessão e do desemprego, o setor de barcos e iates vai muito bem, obrigado. Ele sofreu um baque no período entre 2013 e 2018, quando alternou tombos com recuperações tímidas. Apenas em 2019 as vendas no país (545 milhões de reais) ultrapassaram a marca de 2012 (485 milhões de reais).
“Pelo ritmo atual, vamos crescer entre 15% e 20% em 2020. A fila de espera por modelos maiores tem variado entre sessenta e noventa dias”, diz Eduardo Colunna, presidente da Acobar, que representa as marcas. “A pandemia impulsionou os negócios. Pessoas com dinheiro não encontravam mais opções de lazer ou viagem e se voltaram para barcos. Descobriram que eles são uma forma de isolamento”, ele afirma.
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Por causa da Covid-19, a raia da USP vai receber, no máximo, 2 000 pessoas simultaneamente. Até o ano passado, no Pavilhão da Imigrantes, eram 6 000 visitantes por dia. Além de menos muvucado, o encontro de 2020 custará mais caro para os organizadores, que deixaram de ter uma estrutura pronta.
“Tivemos de construir tudo. Trouxemos trinta píeres de Angra dos Reis”, diz Ernani Paciornik, idealizador do Boat Show. “Vamos fazer para não deixar de fazer, porque do ponto de vista financeiro será infinitamente pior”, explica.
Para o público, a brincadeira sai por 70 reais (no preço cheio). A USP informa que cobrou 90 000 reais pelo aluguel do espaço público. “As negociações incluem o aluguel, melhorias na estrutura da raia, a doação de um barco de 18 pés avaliado em 70 000 reais e 50% da renda do estacionamento. Tudo somado, o legado pode chegar a 400 000 reais para a universidade”, diz o Grupo Náutica, de Paciornik.
O Boat Show também vai promover iniciativas que pedem a despoluição do Pinheiros — uma postura que não é novidade para o evento. Há mais de uma década Paciornik faz provocações como corridas promocionais entre barcos (no rio) e carros (na Marginal) ou passeios de grupos em ônibus anfíbios no vergonhoso “cartão-postal” paulistano.
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A gestão Doria promete uma recuperação visível do Pinheiros até o fim de 2022. O projeto se baseia na ligação de 533 000 pontos de esgoto à rede de tratamento, para que deixem de despejar seu volume no rio. Até o momento, 8,8% desse total foi atingido — o que está de acordo com o cronograma.
“Em dois anos, haverá vida no Pinheiros: ou serão peixes, ou será o secretário nadando”, brinca Marcos Penido, secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente. Por ter uma longa amizade com o reitor da USP, Vahan Agopyan, Penido ajudou no lobby pelo evento — que quase saiu de São Paulo. “Se não tivéssemos conseguido a raia, o Boat Show teria ido para a Marina da Glória, no Rio de Janeiro”, conta Paciornik.
Pelo menos uma espécie de vida selvagem já está garantida na exposição. A organização promete não incomodar as famílias de capivaras que moram por ali. “Elas são simpáticas, não fazem mal a ninguém. Vamos deixá-las circular normalmente”, diz Paciornik. Definitivamente, serão cenas nunca antes vistas nas margens do rio paulistano. O Boat Show vai até o dia 24.
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Publicado em VEJA São Paulo de 18 de novembro de 2020, edição nº 2713
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